Por: Francisco Fragoso*
A medicina não é apenas uma Ciência e Técnica, é outrossim, assumidamente uma Arte de múltiplas ressonâncias humanas:
Tinha eu aproximadamente seis (6) anos de idade quando no meio da Noite, os meus pais foram acordados pela nossa vizinhança, visto que uma senhora amiga, num ato de desespero, na sequência de uma briga com a sua “konbosa” tentou suicidar-se, golpeando com uma faca doméstica a sua face anterior do punho direito, provocando uma ferida incisa-contusa grave, em que seccionou a pele e, ipso facto, a artéria, a veia e tendões e precisava ser socorrida de urgência com a eficácia adequada. A minha saudosa mãe acompanhada pela minha saudosa avó, amarraram a ferida para tentar estancar o sangramento e com mais alguns vizinhos que acorreram no momento levaram-na para o Banco de Urgência do Hospital da Praia para ser tratada.
A despeito deste apoio na hora, infelizmente o hospital não tinha médicos a altura para tratar, de modo adequado e seguro, esta grave lesão, conseguiram apenas estancar a hemorragia e, a mínima trataram a respetiva ferida e, como corolário lógico, a infeliz viveu um período longo de curativo penoso. Ela ficou com o punho direito completamente inválido para sempre. Com efeito, em Cabo Verde na altura não havia recursos adequados para tratar de modo seguro e com eficácia médico-cirúrgica uma tal lesão!
Este episódio ficou-me atravessado na memória e quando abracei o exercício
de Médico procurei preparar-me, caso um dia pudesse tratar adequadamente situações similares, de modo cirurgicamente consequente, pois fiquei muito
triste com o facto, e, sobretudo quando a via nas suas visitas a nossa casa, facto que acontecia, com frequência.
Eis que passados anos, estando eu de Urgência no Centro Hospitalar de Meaux (França), depara-se-me um caso idêntico, quer no plano da lesão como outrossim a pessoa lesada tinha tentado suicidar-se por um motivo semelhante (…).
Tratei a senhora adequadamente, pois estava preparado cirurgicamente e ela ficou bem e, na sequência desabafou comigo francamente, pediu-me conselhos para seguir a sua vida de casal, pois que o marido acabou por esquecer este incidente e se reconciliaram e reataram uma vida e existência numa normalidade,
sob os meus conselhos, pois, mereciam levar uma vida sob o signo de uma paz conjugal segura e duradoura.
04 Maio 2025
