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Da luta pela propina ao direito à esperança: um país chamado Educação Superior

Por: Fidel Tavares*

“Dá instrução ao sábio e ele se fará mais sábio; ensina ao justo e ele crescerá em entendimento” (Provérbios 9:9). A Bíblia já apontava o caminho: educação é multiplicação, é justiça, é libertação. Francisco Carvalho já entendeu isso. 

Eu, particularmente, sempre preferi viajar – e os turistas também – a bordo de um taxista licenciado do que ao lado de um taxista habilitado apenas com o 10º ano. De igual modo, uma vendedeira licenciada é preferível a uma que apenas concluiu o 12º ano; um guarda municipal licenciado a um guarda municipal analfabeto. O que pretendo dizer é que a ideia de massificar o ensino superior através da gratuitidade de acesso e permanência não é apenas ousada – é revolucionária, é um exercício de cidadania, de igualdade e de democracia. E mais: é inteligente. Tem norte. Tem fé no país. E, conforme dizia Paulo Freire, “não é um favor do Estado mas um direito da sociedade e um dever da civilização”. 

Francisco está a colocar em cima da mesa a evidência científica de que o ensino superior gera externalidades, com ganhos para as famílias e para Cabo Verde: um técnico superior é mais produtivo, contribui mais para o PIB, tem um salário mais elevado e, por isso, paga mais impostos. Ele tende a adoecer menos, adere a estilos de vida mais saudáveis, respeita os serviços públicos e planeia melhor a sua família, oferecendo mais atenção aos filhos e garantindo-lhes uma educação mais sólida. Como nos lembra Provérbios 22:6: “Instrui o menino no caminho em que deve andar, e até quando envelhecer não se desviará dele”. 

Para além disso, técnicos superiores estão mais envolvidos em práticas cívicas, na vida política e na construção de uma sociedade mais crítica, mais informada, mais livre. Uma sociedade onde a mobilidade intergeracional se torna possível – onde o filho do vendedor de peixe pode ser médico e a filha da empregada doméstica, assim como a da vendedeira ambulante, pode ser engenheira. 

Em rigor, está em perspectiva um novo paradigma. Francisco quer abraçar a concretização desse sonho. O sonho da mãe de balaio na cabeça, que todos os dias anda quilómetros, de sol a sol, para conseguir os 10, 12 ou 15 mil escudos da propina mensal. O sonho que tantas vezes morre antes do final do ano letivo. O sonho do jovem que entra no primeiro avião, não para explorar o mundo, mas para fugir do salário indigno que a sua desqualificação lhe impõe.

A gratuitidade de acesso e permanência no Ensino Superior não é nenhuma heresia. De resto, se percorrermos a Europa, verificamos variações importantes que oscilam entre a gratuitidade total, parcial ou com taxas simbólicas. Na Alemanha e na Noruega, por exemplo, é gratuito, inclusive para estudantes internacionais nas universidades públicas; na Islândia as taxas são baixíssimas; em França, varia entre cerca 1.500$00 de 5.000$00 anuais; na República Tcheca é gratuito, se o curso for em tcheco. Mas poderia ainda citar Brasil, Argentina, México e Cuba onde o ensino superior é totalmente gratuito.

A economia precisa de uma força qualificada para prosperar. E um jovem com o ES tem menor probabilidade de enfrentar o desemprego, justamente porque a sua qualificação confere-lhe mais mobilidade, ele poderá procurar emprego e salário digno em qualquer país do mundo. Na OCDE por exemplo, não há muito tempo, a vantagem económica, a longo prazo, em possuir o grau universitário ao invés de um grau de segundo ciclo do ensino secundário era superior a uma média de 185.284 USD para os homens e 129.198 para as mulheres; Portugal era de 195.937 USD para os homens contra 173.893 para as mulheres; no Reino Unido, 248.322 contra 209.506. Claramente um retorno e prémio salarial elevados. Um incentivo para que Francisco avance corajosa e descomplexadamente com esta proposta. Uma proposta que, mais do que uma política pública, é um ato de justiça social. É devolver a esperança a milhares de famílias cabo-verdianas. É um passo firme para um país mais igual, mais moderno, mais humano. Como escreveu o apóstolo Tiago: “A sabedoria que vem do alto é primeiramente pura; depois, pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos” (Tiago 3:17).

Afinal, não se trata apenas de garantir diplomas. Trata-se de gerar dignidade. Trata-se de romper o ciclo de pobreza através de um ciclo de conhecimento. Trata-se de governar para todos. Trata-se, enfim, de dar razão à Bíblia e ao bom senso: instruir é libertar.

*Psicólogo Clínico e Gestor de Empresas nos EUA. 

Licenciado em Psicologia pela Universidade de Coimbra.

Mestre em Aconselhamento em Saúde Mental e

Mestre em Gestão de Empresas pela Cambridge College, Massachusetts, EUA. 

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