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São Vicente

São Vicente: Universidade em risco de não iniciar aulas por falta de ligação à rede de esgotos

A Faculdade de Educação e Desporto (FAED), pertencente à Uni-CV, em São Vicente, localizada na zona do Cortiço, permanece há vários anos sem ligação à rede pública de esgotos. A ausência deste equipamento tem provocado a acumulação de águas residuais na cave do edifício, localizada por debaixo da biblioteca, tornando insalubre a vida dos alunos, professores e demais funcionários.

Albertino Martins- vice-presidente da FAED

Inaugurado em 2019, o novo edifício construído no Cortiço, como parte da FAED, funcionou estes anos todos sem rede de esgotos. O volume das águas residuais no local, segundo as fontes ouvidas pelo A NAÇÃO, chega a atingir dois metros de altura, tornando o espaço impróprio para qualquer tipo de utilização e colocando em risco a própria estrutura do edifício.

De acordo com Albertino Martins, responsável pela FAED em São Vicente, a situação afecta directamente cerca de 600 pessoas, entre estudantes, docentes e funcionários. Residências vizinhas e edifícios como o Bispado do Mindelo e a Escola Técnica também são atingidos pela insalubridade provocada pela acumulação de águas de esgoto.

A direcção da FAED relata que, após vários alertas emitidos pela Delegacia de Saúde e tentativas de diálogo com a Câmara Municipal, em desespero, optou por avançar com obras de ligação à rede pública de esgotos por iniciativa própria.
“A intervenção envolveu cortes no passeio e instalação de tubagem, mas foi travada na fase final, já junto à boca de ligação, com a aplicação de uma coima no valor de um milhão de escudos, alegadamente por falta de autorização”, explicou Albertino Martins ao A NAÇÃO.

Calor e chuvas

O ambiente de insalubridade agrava-se com o calor e a aproximação da época das chuvas, criando condições ideais para a proliferação de mosquitos e outras pragas urbanas. A Uni-CV, que até agora escoava os resíduos para uma fossa séptica já sobrecarregada, vê os custos de saneamento aumentarem, recorrendo a uma empresa privada para realizar sucções periódicas, com valores que já ultrapassam os 100 contos.
“A incerteza quanto à resolução da situação levanta preocupações sérias sobre a capacidade da FAED iniciar o próximo ano académico, em Outubro, com condições mínimas de salubridade e segurança”, disse Albertino Martins. “A comunidade universitária aguarda uma resposta eficaz que permita restabelecer as condições básicas para o funcionamento da instituição”.

Wesley Fonseca, licenciando em Educação Física e Desportos, diz que “é difícil estudar num local onde o chão da biblioteca pode colapsar” a qualquer momento. “Tenho medo de adoecer. Os mosquitos estão por todo o lado.”

“Temos aulas com o cheiro de esgoto ao lado. Há dias em que é impossível concentrar-se”, disse-nos um professor.

A funcionária da biblioteca, que fica mesmo ao lado do subterrâneo que se enche de água residual até aos dois metros de altura, afirmou-se saturada da situação e teme pela sua saúde. “Também os alunos sofrem muito com o mau cheiro e a proliferação de mosquitos”, salientou.
Marco Bento, proprietário de um restaurante a uns cerca de 300 metros do local onde se situa o FAED, disse que por vezes sente-se o mau cheiro que prolifera do vazamento da fossa séptica. “Sim, apesar de tomarmos as nossas cautelas não descoramos da possibilidade da do mau cheiro evadir a zona que é de lazer para o público que procura o Miradouro e praça da Laginha que fica junto à entrada do Porto Grande”.

PAICV e Câmara tomam posição

Na segunda-feira, os eleitos municipais do PAICV despoletaram o problema destacando a gravidade da situação da rede de esgotos na FAED. Esse partido apelou à uma intervenção urgente por parte das autoridades competentes, enfatizando a necessidade de soluções estruturais e não apenas medidas paliativas.

Em resposta, a Câmara Municipal, através do vereador José Carlos da Luz, esclareceu, na terça-feira, que nunca se opôs ao ramal de drenagem, tendo enviado técnicos ao local para identificar a melhor solução sem danificar o asfalto urbano.

José Carlos da Luz explicou que o edifício da FAED, erguido no âmbito da cooperação chinesa, foi recepcionado pela própria entidade, Uni-CV, sem a ligação formal à rede de esgotos, contrariando expressamente o caderno de encargos.

“Apesar de não recair sobre a Câmara a responsabilidade directa pela manutenção, o Serviço de Saneamento prestou assistência recorrente com o camião de desobstrução, até confirmar que a causa das falhas era a ausência de ramal ligado”, disse.

Segundo esse responsável, a tentativa de obra sem autorização, ocorrida a 28 de Junho, por parte da FAED, foi travada pela Polícia Municipal e resultou na aplicação de uma coima de um milhão de escudos à essa instituição por tentativa de ligação ilegal.

O vereador acusou, por outro lado, o PAICV de incoerência política; primeiro, por criticar os buracos no asfalto e, dias depois, por apoiar a abertura ilegal de valas, qualificando o comportamento desse partido como motivado por “interesses pessoais”.

“A Câmara reafirma a sua total disponibilidade para concluir a ligação com a empresa legalmente habilitada, repor o pavimento afectado e garantir transparência, rigor institucional e respeito mútuo na defesa dos interesses coletivos da ilha”, concluiu José Carlos da Luz.

Rectificação

No anterior número do A NAÇÃO, na reportagem “São Vicente aos 50 anos de independência…”, infelizmente, na parte relativa à presidente da Assembleia Municipal de São Vicente, Helena Fortes, erradamente escrevemos:
“O desemprego, que entre os jovens gira em torno de 25% na ilha, e a falta de transporte inter-ilhas também preocupam Helena Fortes, lembrando que muitos cabo-verdianos ganham experiência em outras ilhas e regressam com novas competências. ‘Ser protagonista exige sair da zona de conforto, aprender num contexto diferente e voltar para transformar’, frisa.”

Na verdade, na sua entrevista, Helena Fortes não mencionou as estatísticas, que apenas derivaram da nossa investigação e esforço de síntese. A bem da verdade, a questão foi colocada e respondida nos seguintes termos:
– Que medidas estão a ser pensadas para enfrentar os problemas estruturais da ilha, como o desemprego jovem, a mobilidade inter-ilhas e a habitação?

– A juventude cabo-verdiana é, por natureza, inquieta e ambiciosa — sempre quis explorar, conhecer, ir além. O desafio de hoje é que, com famílias mais pequenas e menos redes de apoio, a pressão para “ficar” é maior. Mas é preciso manter viva essa coragem de sair da zona de conforto.
Digo muitas vezes que o trabalho existe — talvez não exatamente onde se espera, mas existe. No setor da hotelaria, por exemplo, jovens de São Vicente e de outras ilhas foram trabalhar para o Sal e para a Boa Vista, ganhando experiência valiosa. Agora, com novos investimentos previstos para São Vicente, há oportunidade de regressar à base com novas competências.
A mobilidade inter-ilhas, sim, continua a ser um entrave — mas não deve ser motivo para a inércia. É preciso estimular uma mentalidade de conquista: não esperar que tudo esteja pronto à porta de casa, mas estar disposto a sair, aprender e depois contribuir para o desenvolvimento da ilha”.

Admitindo que a nossa síntese não terá sido a mais adequada, repomos aqui os factos a bem da verdade, lamentando os transtornos causados à visada, Helena Fortes, e aos nossos leitores.

João A. do Rosário

Texto publicado na edição 932 do Jornal A Nação, de 10 de julho de 2025

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