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Ambiente

Burros, macacos e galinhas-do-mato: quem são, de onde vêm e onde vivem em Cabo Verde

Em Cabo Verde, entre o sobe e desce das encostas, as estradas de terra e os quintais das povoações, convivem três presenças animais que fazem parte da paisagem — e da história — das ilhas: o burro, o macaco verde e a chamada “galinha-do-mato” (a espécie conhecida como “numida meleagris”, ou galinha d’angola). Cada um desses animais tem uma origem, uma distribuição e um papel social e ecológico diferente — e todos colocam desafios e questões sobre gestão, conservação e a utilidade que têm para a população das ilhas.

Começando pelo burro (animal de referências bíblicas e determinante na evolução do comércio, antes de os camelos serem domesticados), este acompanha a presença humana nas ilhas desde os primeiros dias do povoamento. 

Na época, cavalos, burros e mulas foram trazidos por navegadores e colonos portugueses e tornaram-se essenciais para o transporte de carga, trabalho agrícola e a deslocação pelo terreno montanhoso e caminhos estreitos, como Santo Antão, São Nicolau e partes de Santiago. 

Registos históricos e relatos etnográficos sobre a introdução de equídeos nas ilhas e na região macaronésica associam-nos ao fluxo de navios e gentes entre a África Ocidental, a Península Ibérica e as ilhas atlânticas desde o século XV. 

Hoje, nalgumas regiões rurais do país o burro continua imprescendível — é ainda usado por pequenos agricultores e pastores (para transporte de água, sobretudo) em locais de difícil acesso, como a localidade de Covoada, em São Nicolau, por exemplo — embora a mecanização e a mudança de modos de transporte (motos, carrinhas e camionetas) tenham reduzido o seu papel. Em algumas ilhas turísticas, este animal também passou a fazer parte de imagens e roteiros turísticos, num misto de utilidade e exotismo fotogénico. 

O burro: companheiro antigo das áreas rurais

No entanto, a sua não utilização, como anteriormente, levou a que muitos voltassem a um estado semi-selvagem, representando, inclusive, algum perigo nas vias de circulação. Em certas ilhas, como o Maio e a Boa Vista e mesmo partes de São Nicolau, como Juncalinho, é notório o aumento do burro selvagem pelos campos, assim como a sua deslocação – impulsionada pelos anos de seca – ao final do dia, para dentro das povoações, em busca de água ou comida. O caso atinge níveis de maior preocupação em ilhas como a Boa Vista, onde iniciativas populares como a designada por “Burrinho” surgiram, recentemente, para ajudar a preservar este animal, retirá-lo das estradas e povoações e fixá-los nos campos. 

De acordo com os seus promotores, as iniciativas incluem a construção de bebedouros nas zonas agrícolas e distribuição de pasto para evitar que os burros invadam localidades como Sal Rei, vasculhando os contentores de lixo, à procura de comida. Muitos destes animais, após o cair da noite, acabam por invadir as estradas, atravessando-as e chegando a causar acidentes. 

Em 2022, uma equipa de 75 voluntários apoiados por 17 viaturas e divididos por 13 zonas da ilha, envolvendo ONGs e a delegação do Ministério da Agricultura, em articulação com a autarquia da Boa Vista, levou a cabo um censo, que registou cerca de 792 burros na ilha. A maioria concentrada na zona norte e nordeste. 

Uma das soluções, adiantadas pelas autoridades, passaria pelo envio destes animais para outras zonas do arquipélago onde os burros ainda são utilizados no dia a dia das populações. Um animal que tem sido determinante na ocupação do território das ilhas e que faz parte da história do povoamento de Cabo Verde.

Joaquim Arena

Leia a matéria na íntegra na Edição 951 do Jornal A Nação, de 20 de Novembro de 2025

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