Com 37 anos, é o chefe de Estado mais novo do mundo e governa o Burkina Faso com mãos de ferro, desde o golpe militar de 2022. Tem o apoio dos jovens do seu país, mas para a oposição não passa de um autocrata paranoico. Ibrahim Traoré enfrentou a França e as suas instituições e goza do apoio militar russo para se manter no poder, tendo, para isso, adiado para mais cinco anos o período de transição.
A marcha de apoio ao chefe de Estado do Burkina Faso, o capitão Ibrahim Traoré, que decorreu esta quarta-feira, 30, na capital do país, Ouagadugu, foi uma demonstração de apoio ao homem forte do país, alguns dias depois da detenção de altas patentes militares, acusadas de prepararem um golpe de Estado. Isto num país com grande transição de golpes militares.
O apelo para a demonstração de apoio de ontem foi lançado por um conjunto de organizações nacionais da sociedade civil, anunciou a Agência de Informação do Burkina, citada pela revista Jeune Afrique. Segundo o ministro da Segurança, os cérebros do golpe estariam na Costa do Marfim.
A Costa do Marfim é frequentemente acusada, pelas autoridades burkinabés, de albergar pessoas que “se dedicam a actividades subversivas” contra o Burkina. Reagindo às acusações, Amadou Coulibaly, porta-voz do governo marfinense, desmentiu-as, afirmando, “já perdi a conta dessas acusações contra nós. Ainda estamos à espera das provas da última acusação. É provável que venha a haver mais”.
A marcha de ontem na capital do Burkina serviu também para protestar contra as afirmações do general norte-americano Michael Langley, comandante do US Africom, proferidas no início de Abril, em Washington, e denunciadas pelo ministério burkinabé dos Negócios Estrangeiros. Nelas, esse oficial americano declarou que “os recursos minerais do Burkina Faso, bem como alguns lucros da cooperação com a China, não são distribuídos à população, servindo antes para a protecção do regime no poder”.
O mais jovem dirigente do Sahel
Ibrahim Traoré é a face mais jovem e a mais visível dos três militares que dirigem os países da Aliança dos Estados do Sahel (juntamente com Assimi Goita, do Mali, e Abdourahamane Tiani, do Níger, que acabaram por abandonar a CEDEAO), chegados ao poder através de golpes de Estado.
O homem forte do Burkina Faso tem apenas 37 anos e é actualmente o chefe de Estado mais jovem do mundo. A sua juventude, a experiência como militar e a capacidade de comunicação, são apontadas como o grande trunfo junto da população jovem, que representa cerca de 70% da população do Burkina Faso, e que alegadamente apoia o capitão Traoré e as suas medidas políticas e económicas.
Ao contrário da maioria dos ‘puschistas’ em África, Traoré frequentou a Universidade de Ouagadugou, a Faculdade de Ciências e Tecnologia, onde se licenciou em Geologia, em 2010. Ibrahim Traoré é o primeiro chefe de Estado do Burkina Faso muçulmano e o seu militantismo político tem início ainda quando estudante, como membro da Associação Nacional dos Estudantes do Burkina Faso, de inspiração marxista.
A sombra de Thomas Sankara
No distanciamento da França, antiga potência colonial e no seu discurso pela recuperação da soberania nacional e contra o neo-colonialismo, Traoré serve-se frequentemente das ideias de Thomas Sankara, antigo chefe de Estado do Burkina assassinado durante um golpe de Estado, pelo seu colaborador mais próximo, Blaise Campaore, que se revelou próximo de Paris. A oposição ao Ocidente, à França em particular, vem granjeando ao novo líder burkinabé apoios por parte de líderes e movimentos parafricanistas.
Salvador ou ditador?
Aos olhos dos observadores, Ibrahim Traoré surge ora como salvador ora como ditador. Para os seus seguidores, atinge uma aura quase messiânica, do homem forte que finalmente irá colocar o país no caminho certo. Para os seus detractores, Traoré não é mais do que um autocrata paranoico.
O certo é que depois de assumir o poder, através de um golpe de Estado, em 2022, Traoré procurou a protecção dos aliados russos, nomeadamente através do Grupo Wagner, logo após uma tentativa de golpe, em Setembro de 2023.
Desafia tudo e todos e gere o país com mãos de ferro e convencido de estar investido de uma missão histórica. O olhar frio e focado, na face imberbe, denota uma espécie de força tranquila, de onde sai uma fina arrogância, que fazem a sua imagem e personagem.
O período de transição anunciado para o país, para a realização de eleições, após o golpe, e a entrega do poder aos civis, foi revisto a 25 de Maio de 2024. Nesta reunião não participaram elementos da sociedade civil, nem opositores a Traoré. O período de transição foi estipulado em cinco anos, a partir de 2 de Julho de 2025, através de uma carta que atribui a Ibrahim Traoré o título de presidente do Burkina Faso e lhe permite candidatar-se às próximas eleições.
Joaquim Arena
