PUB

Colunistas

A ética médica ante o Racismo!

Por: Francisco Fragoso*

Estava na enfermaria de Cirurgia no Hospital Central da Praia, no fim de mais uma manhã de labor médico, visitando tranquilamente os meus pacientes quando me avisam da Secretaria do Hospital que o Dr. Lisboa Ramos (então Delegado de Saúde da Praia), precisava falar comigo acerca de um telefonema que havia recebido naquele momento oriundo de um enfermeiro a bordo de um barco grego que estava de passagem ao largo do Porto da Praia.

Fui atender o telefonema do Dr. Lisboa Ramos que me relatou que havia recebido um telefonema da parte de um enfermeiro que lhe perguntou se seria possível tratar um marinheiro que estava com um quadro de apendicite aguda e que o Porto da Praia era o Porto mais perto, por isso, caso fosse possível o paciente fosse tratado aí no Hospital da Praia seria muito bom mesmo ao que ele Lisboa Ramos disse que sim, por isso pudesse aportar o Porto da Praia para que o paciente pudesse ser tratado, em tempo útil e oportuno. 

Falei de imediato com todos os elementos da minha equipa para estarem prevenidos do facto.

Dei instruções a Enfermeira Chefe da Unidade, a Irmã Ângela para preparar o doente logo a sua chegada a Unidade e me chamar para o examinar no sentido de confirmar ou infirmar o diagnóstico avançado pelo enfermeiro e proceder em conformidade e, sem perda de tempo.

O paciente assim que chegou foi conduzido a Unidade, deitado numa cama já preparada e a Irmã e as suas colegas preparam-no de acordo com as normas do serviço para situações afins e veio me chamar para o examinar de modo adequado, visando a eventual intervenção cirúrgica indicada. 

Ao entrar na Enfermaria acompanhado da Irmã Ângela: eis que o jovem enfermo (18 anos de idade), disse claramente: “Ser operado

 por um preto” não é questão! Nem pensar! Prefiro morrer!”

 Saí tranquilamente da Enfermaria e falei com a minha equipa, explicando adequadamente a situação e terminei a minha explicação dizendo o mal é que dentro de seis horas o apêndice infetado vai rebentar, com certeza e nesta altura, a dor abdominal (Tipo “punhalada”) vai obrigá-lo a decidir com certeza que quer ser operado por um preto, tendo em conta a dor abdominal e o choque infecioso. Só que isto vai acontecer em plena alta noite! …

Assim foi! Às 3 horas da amadrugada, num insano berreiro acordou a todos da enfermaria, pedindo socorro, pois tal era a dor!

Eis porque em vez de poder tratar uma apendicite aguda, em tempo oportuno fomos confrontados com uma Peritonite! Assim foi: operámo-lo e por isso em vez de uma semana de hospitalização acabou por estar um mês com drenos e terapêutica com antibiótico, etc. Etc. Enfim! Enfim! Malhas que mais uma vez teceu o racismo!

Isto serviu-lhe de lição, pois no convívio com os outros pacientes cabo-verdianos e o pessoal de enfermagem cabo-cabo-verdiano tornou-se um jovem de bom trato e por que não o asseverar: o racismo curou-se e bem! Muito bem mesmo! 

BROCKTON/BOSTON 

Abril 2025

PUB

Adicionar um comentário

Faça o seu comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

PUB

PUB

To Top