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Opinião

Breve Análise Técnica e Institucional do “Incidente Grave” com Aeronave King Air 360ER – D4‑CCL

Por: Américo Medina

Esta breve análise é realizada à luz das normas e boas práticas internacionais (ICAO, EASA, FAA), das obrigações do fabricante (Textron Aviation / Pratt & Whitney) e do enquadramento jurídico nacional aplicável (Decreto‑Lei n.º 6/2023).

Divergências e omissões relevantes

O comunicado inicial do Ministério da Defesa (MD) caracterizou o evento como “incidente ligeiro” e referiu a existência de cobertura de seguro e de aluguer de motores pela ASA.
O relatório do IPIAAM( preliminar) porém, classifica o evento como “Incidente Grave” (Serious Incident) e confirma colisão da hélice direita com o solo (“prop strike”), o que exige notificação imediata e formal à autoridade de investigação segundo o Anexo 13 da ICAO.
A comunicação tardia — quatro dias após a ocorrência — constitui falha grave de notificação e de transparência técnica.

Conflito de papéis e responsabilidade institucional

O relatório revela que a aeronave estava sob responsabilidade da CIAM (Comissão de Implementação da Autoridade Militar), estrutura transitória e sem certificação operacional.
Ora estamos perante  um quadro de responsabilidades que  é difuso: ASA (proprietária), MD (utilizador), AAC (supervisora) e IPIAAM (investigadora) e…AAC(?)! Tal configuração contraria o princípio de “clear lines of accountability” do ICAO Doc 9859 e da EASA Basic Regulation (EU) 2018/1139. A referência ao “aluguer de motores” pela ASA levanta conflito de interesse, pois a ASA não é organização de manutenção certificada (Part‑145). O uso de motores ou componentes após impacto é proibido sem inspeção e recertificação pelo fabricante (Textron / Pratt & Whitney).

Falhas de procedimento e de cultura de segurança

O evento ocorreu durante voo de treino e evacuação médica simultâneos, violando o princípio de segregação operacional – Gravíssimo!  A aproximação foi realizada com excesso de velocidade (acima da Vref), levando a toque com velocidade vertical elevada e posterior “prop strike”. A tripulação não declarou emergência e regressou sem inspeção imediata, contrariando as boas práticas ICAO, FAA e EASA, que exigem “engine shutdown” e “grounding” após impacto de hélice.

 A notificação ao IPIAAM apenas após inspeção do fabricante evidencia tentativa de controlo da narrativa técnica antes da abertura formal da investigação – Isso é grave!

Boas práticas internacionais e exigências de fabricantes

Segundo os Boletins de Serviço Textron 61‑04‑09 e Pratt & Whitney SB 14002, um “propeller strike” requer: a)remoção imediata dos motores afetados; b)inspeção boroscópica e de eixo (“run‑out inspection”); c) desmontagem e análise das pás e redutores; d) relatório ao fabricante e à autoridade competente antes de nova operação – Nenhum destes procedimentos foi confirmado pelo MD ou pela ASA!
A alegada intervenção da ASA como locadora de motores é irregular e pode violar o Decreto‑Lei n.º 6/2023 e o Regulamento (EU) 1321/2014 (Part‑145).

 Implicações sistémicas e credibilidade

O relatório do IPIAAM expõe a inexistência de doutrina operacional consolidada para aeronaves estatais e militares. evidencia lacunas na cadeia de reporte, manutenção e supervisão técnica que comprometem:

  1. A  credibilidade do sistema de aviação do Estado;
  2. A segurança operacional;
  3.  o cumprimento das obrigações ICAO (State Safety Programme e Safety Oversight).

Tais falhas podem dentre outros aspectos e implicações relevante afetar a avaliação da ICAO no âmbito do USOAP CMA, nas áreas “AIG” (Investigação de Acidentes) e “OPS/PEL” (Operações e Licenciamento).

6. Em Forma de Síntese

Temos um rosario de factos que não deixam de desassossegar a saber: Notificação tardia, IPIAAM informado 4 dias depois à revelia daquilo que impõe ICAO Anexo 13 §4.1 – falha  grave no sistema de reporte; “Prop strike” confirmado com danos em pás, a FAA AC 43‑12A, (Textron SBs) requer  inspeção e recertificação antes de novo voo; Autoridade indefinida pois que  CIAM sem certificação formal, conforme previsto no ICAO Doc 9859 (SMS); Vácuo de accountability “ Motores alugados”, a Intervenção da ASA, configurando conflito e atropelos  a normativas EU 1321/2014 (Part‑145) conflito e prática irregular na “Comunicação Pública” com o MD a minimizar o incidente (Annex 13 §5.1 /Transparency) impondo uma  gestão política da narrativa, numa ocorrência grave  do ponto de vista técnico-operacional .

 Preocupante sem Dúvida

O incidente com a aeronave Beechcraft King Air 360ER (D4‑CCL) evidencia fragilidades graves na gestão técnica e institucional da aviação cabo‑verdiana. A classificação correta como “incidente grave” impõe responsabilidades de notificação, preservação de evidências e transparência que não foram integralmente cumpridas.
É recomendável que:
1. O Ministério da Defesa publique um relatório técnico complementar detalhando as medidas corretivas adotadas;
2. A AAC e o IPIAAM reforcem os protocolos de notificação e coordenação interinstitucional;
3. A ASA se abstenha de intervir fora do seu âmbito de certificação;
4. Seja reforçada a  autoridade aeronáutica estatal, assegurando uma efectiva separação funcional e accountability por parte da AAC.
Sem estas e outras medidas medidas, o caso King Air 360ER será lembrado como símbolo de desorganização e fragilidade institucional, e não como exemplo de capacidade operacional do Estado.

Sem dúvida que a PGR tem que “notificar-se” Dr Landim! É que essa placidez e modo “Zen” como se deixa levar pela vida, daqui a nada a “a vida leva eu” sem ver uma PGR nesta terra que já nos faz lembrar

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