PUB

Cultura

Seminário LER: África – IberoAmérica se lêem – Primeiro encontro literário internacional no Tarrafal de Santiago

Arrancou esta quinta-feira, 13, e vai até domingo, 16, a primeira edição do seminário internacional “LER: África – Ibero-América se lêem”, que decorre no Tarrafal de Santiago. O evento insere-se na IV Conferência Internacional das Línguas Portuguesa e Espanhola (CILPE) promovida pela Organização de Estados IberoAmericanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI). 

O encontro tem como palco principal o Auditório do Museu do Campo de Concentração do Tarrafal e o Mercado da Cultura do Tarrafal, com o lema “Utopia como resistência. Resistência como utopia”. 

As origens desta iniciativa remontam a uma apresentação conjunta da OEI e do Laboratório Emilia, em Madrid, no âmbito do encontro “Leer Iberoamérica Lee”. O objectivo, segundo a organização, é a promoção do diálogo literário e cultural entre África e os países da Ibero-América (europeus e latino-americanos de língua portuguesa ou espanhola), fomentando a leitura, o livro e a criação cultural em contextos multilíngues. 

Para Cabo Verde, e em particular para o Tarrafal, o encontro representa uma aposta simbólica: um local que conjuga memória histórica (o antigo campo de concentração colonial) e futuro cultural, transformando-se num espaço de literacia, diálogo e construção identitária.

Programação e destaque de actividades

O programa oficial arranca esta manhã, às 09h45, com uma breve resenha histórica no Museu do Campo de Concentração do Tarrafal, conduzida por Carlos Santos. De seguida, às 10h00, a abertura contará com as intervenções de Mário Lúcio Sousa (escritor, músico e ex-ministro da Cultura de Cabo Verde, e um dos organizadores do evento), José dos Reis (presidente da Câmara Municipal do Tarrafal), representantes da OEI e da AECID, entre outros.

Ao longo desta quinta-feira haverá painéis de discussão, como “Pontes Transatlânticas” — com participação de Ana Maria Gonçalves (Brasil) e moderado por Vera Duarte (Cabo Verde) — e “Identidade e Resistência”, moderado por Augusta Évora, e ainda a participação de escritores cabo-verdianos e africanos de expressão portuguesa.

Durante os quatro dias, estão ainda previstos momentos como a “Feira Interatlântica do Livro para as Infâncias” (14), mesas sobre “Políticas públicas para o livro e a leitura”, apresentações editoriais de autores locais (15) e formação de mediadores de leitura. A encerramento, previsto para domingo, 15, contempla uma cerimónia oficial e, à noite, uma confraternização na Residencial Santo Amaro. 

Leitura, línguas e utopia

De acordo com os organizadores, o lema “Utopia como resistência. Resistência como utopia” sintetiza a ambição do encontro: ver a literatura e a leitura como instrumentos de transformação social, memória e justiça cultural. 

A escolha do Tarrafal — local de encontro de memórias coloniais — reforça a ideia de que ler não é apenas decifrar palavras, mas assumir uma presença cultural e histórica, sobretudo no contexto cabo-verdiano e africano que ainda enfrenta desafios importantes em termos de alfabetização plena e acesso ao livro. 

Como destacou o site da Casa África, das Canárias, importa também frisar o aspecto do multilinguismo. Para a OEI e os parceiros não bastam o português ou o espanhol, é necessário valorizar as línguas africanas, as línguas crioulas, e inserir a leitura num quadro verdadeiramente intercultural. 

Impactos para Cabo Verde

Para Cabo Verde, um evento desta natureza coloca o arquipélago — e especificamente Santiago e o Tarrafal — como palco de um diálogo cultural internacional, reforçando a visibilidade da literatura cabo-verdiana no espaço lusófono e ibero-africano. 

Por outro lado, o foco na leitura e no livro, bem como a presença de mediadores, ilustradores, editores e autores de diversas origens, contribui para fortalecer redes locais: bibliotecas, escolas, associações de leitura e autores que muitas vezes trabalham em contextos periféricos ou com recursos limitados.

Além disso, o evento resgata e reinventa o Tarrafal, lugar historicamente marcado pela repressão e memórias coloniais, passagem obrigatória para o pensamento da liberdade e da dignidade humana, agora reconfigurado como território de leitura, palavras e literatura. Para os organizadores, esse gesto simbólico traduz-se num valor educativo e cultural importante para as novas gerações de cabo-verdianos.

Na conferência de imprensa de apresentação, um dos coordenadores do evento na área da CoLeitura, Júlio Manti, destacou o envolvimento de várias entidades locais, como a Associação Literária do Tarrafal de Santiago (ALTAS), a Delegação Escolar, a Câmara Municipal e o próprio Grupo CoLeitira, composto por professores no activo e na reforma, além de membros da sociedade civil. 

Joaquim Arena

Publicado na Edição 950 do Jornal A Nação, de 13 de Novembro de 2025

PUB

Adicionar um comentário

Faça o seu comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

PUB

PUB

To Top