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Carta aberta ao Bastonário da Ordem dos Advogados

Por: Germano Almeida

Permito-me sugerir a V. Excia a ideia de solicitar a intervenção do Governo no sentido de este garantir uma pensão de aposentação aos advogados que o desmantelamento do IPAJ, sem os cuidados e cautelas necessárias na salvaguarda dos seus direitos, deixou ao desamparo.

Escrevo-lhe esta carta pública em meu nome pessoal, porém estou convencido que muitos colegas em situação idêntica a subescreverão.    

 Mas quero primeiro cumprimenta-lo pela renovação do seu mandato à frente da Ordem dos Advogados e desejar-lhe os maiores sucessos. 

 Como certamente se recorda, com data de 23.08.2023 enviei-lhe uma carta que dizia o seguinte: “Em abril do ano passado dirigi ao antecessor de V. Excia nesse cargo uma exposição na qual referi alguns constrangimentos por que passam os advogados inscritos no IPAJ e já em fim de carreira, sugerindo a necessidade alguma ação junto do Governo no sentido de os mesmos serem protegidos através de uma pensão de aposentação.

  Passado mais de um ano não recebi ainda qualquer resposta, quer da Ordem, quer do Governo, pelo que venho renovar junto de V.Excia a solicitação, juntando a esta a antecedente exposição para os devidos efeitos.”

A carta dirigida ao seu antecessor tem data de 07.04.2022, e tem o seguinte teor: “Venho comunicar a V.Excia que no dia 31 de julho próximo completo 77 anos de idade, e como é igualmente o final do ano judicial, não pretendo continuar a minha inscrição na OACV a partir dessa data.

Para que mais facilmente compreenda a pretensão que lhe vou expor, começo por dizer-lhe que faço parte do IPAJ/OACV desde 1979. Aliás, fui presidente da comissão instaladora do IPAJ aqui em S. Vicente. E tendo continuado inscrito após a transformação do IPAJ em Ordem dos Advogados, posso dizer que tenho cerca de 40 anos ligado às duas instituições que, após a independência, enquadraram a advocacia em Cabo Verde.

Quando instituímos o IPAJ, os advogados a ele adstritos ficaram sujeitos a diversas exigências e limitações, nomeadamente no que concerne ao recebimento de honorários, que eram pagos pelos constituintes diretamente na secretaria da instituição. Mensalmente, era entregue a cada membro uma percentagem dos honorários entrados em seu nome, num mínimo de dez mil escudos, mesmo para aqueles que não tinham alcançado essa quantia, até um máximo que não podia exceder a quantia de 35.000$00. Toda a cobrança sobrante de honorários ficava na conta do IPAJ, adstrito aos fins que a sua lei orgânica estabelecia.

Essa espécie de funcionalismo público dos advogados tinha, no entanto, contrapartidas, traduzidas em direitos diversos. E de facto, os membros do IPAJ encontravam-se protegidos por direitos e garantias. Expressos em diferentes normas, nomeadamente no artº 7º da sua lei orgânica, alínea f), que lhes garantia o direito de beneficiar de assistência social, nos termos das leis gerais.

Entretanto, acontece o desmantelamento do IPAJ e a sua substituição pela Ordem dos Advogados. Porém, e como aliás veio a reconhecer o DL 23/2001, de 29/10, o DL 51/2000 que extinguiu o IPAJ e procedeu à criação da Ordem dos Advogados e aprovou os respetivos estatutos, acabou por se mostrar extremamente lacunoso e até pouco claro em diversas disposições em que os direitos dos advogados inscritos no IPAJ deveriam ter ficado melhor salvaguardados. E se é certo que esse referido DL23/2001 procurou resolver algumas dessas lacunas, muitas outras subsistiram e continuam pendentes de resolução, pois que são de relevante interesse para os inscritos no IPAJ, e que, no entanto, não foram diretamente acautelados. 

  É certo que o artº 257º do estatuto da Ordem garante terem ficado salvaguardados os direitos adquiridos da inscrição e ingresso na OACV. Essa, no entanto, parece ser a única salvaguarda dos inscritos do IPAJ. Com efeito, nesse tempo não existia ainda a abrangência do Instituto da Previdência Social como existe no presente, e foram inúteis e baldados todos os esforços dos então dirigentes do IPAJ para se obter uma forma de proteção na Previdência que de alguma maneira pudesse abranger os membros do extinto IPAJ.

 E é assim que aos profissionais do foro inscritos no IPAJ, e aos quais não foi permitida a entrada no esquema de Previdência Social a não ser há relativamente pouco tempo, não parece estar garantida uma aposentação quando atingido o limite da idade, o que traduz a negação de um direito social por excelência. 

 Assim, e não acreditando estar a OACV preparada para suportar o esforço financeiro que seria a concessão de uma pensão de aposentação aos membros do IPAJ não protegidos por alguma outra forma de apoio, permito-me sugerir a V.Excia a ideia de solicitar a intervenção do Governo no sentido de este garantir uma pensão de aposentação aos advogados que o desmantelamento do IPAJ, sem os cuidados e cautelas necessárias na salvaguarda dos seus direitos, deixou ao desamparo.

  Ciente de que vai agir da forma que achar melhor e mais proveitosa para esses advogados, 

Apresento a V.Excia os meus melhores cumprimentos.”

Porém, desde essa altura, portanto, desde abril de 2022, que inutilmente venho aguardando uma qualquer resposta da parte da Ordem dos Advogados. Nenhum dos bastonários disse até hoje uma única palavra sobre esta questão que afeta-me a mim e a mais diversos colegas. De modo que, aos 80 anos de idade, sou obrigado a continuar inscrito na Ordem dos Advogados e teoricamente exercendo advocacia.

Nunca me dirigi ao Governo porque considero que o dever de resolução dessa questão compete essencialmente à Ordem dos Advogados, substituta mas também herdeira do IPAJ, portanto única entidade a que podemos estar ligados. Com efeito, a exagerada urgência que houve na substituição do Instituto do Patrocínio e Assistência Judiciária pela Ordem dos Advogados, levada a cabo por quem não lhe conhecia a história nem se interessou em saber dela, fez com que não tivessem sido acauteladas as garantias que deveriam ter rodeado os profissionais do foro não abrangidos pelo sistema de aposentação do Estado, já que lhes estava interdita a entrada na Previdência Social.

 Mas infelizmente o IPAJ foi liquidado e enterrado como se fosse uma instituição já pútrida, desprezada que foi uma história de dignidade de que todos os advogados nele inscritos certamente se orgulham e reverenciam.

  Fico, pois, aguardando que neste mandato que se inicia, alguma ação da parte de V.Excia seja levada a cabo no sentido de se resolver a pendente questão dos profissionais do foro ligados ao IPAJ. Com os meus cumprimentos. 

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