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Política

OE 26/Comunicação social: Privados continuam a fazer contas à sobrevivência

Lourenço Lopes, Secretário de Estado e Fernando Ortet, Presidente da AMPCV

Os subsídios para os media privados no próximo Orçamento de Estado (OE) são quase os mesmos e o que de facto pode mudar o panorama económico destes órgãos – a lei da publicidade institucional – continua “para breve”… e sobre a promessa do Esatuto de Utilidadde Pública já nem se fala. A questão que fica é como sobreviver e garantir a pluralidade neste país democrático? 

O Parlamento aprovou, na semana passada, o OE 2026, que destina à comunicação social – pública e privada, assim como ao regulador, o montante global de 250 mil contos. É a mesma verba atribuída ao sector desde 2024, com a ressalva que o Autoridade Reguladora para a Comunicação Social (ARC) alcança os 90 mil contos.

Para os privados, muito embora os subsídios do Estado sejam bem-vindos, as questões que, de facto, podem garantir uma mudança estrutural na sua situação financeira e, por arrasto, na qualidade do serviço público prestado, continua a ser letra morta e promessas incumpridas. Para já, o OE não traz novidades. 

Da esquerda para a direita: Frei Gilson Frede, diretor do Jornal Terra Nova, Teresa Sofia Fortes, directora do jornal Voz do Archipélago, José Mário Correia, director da Rádio Alfa

“Não tem havido sensibilidade da parte do Governo para as nossas reivindicações, que poderiam não passar por maior dotação financeira, mas passariam por medidas, que devem refletir no orçamento de outras formas e que podiam beneficiar a comunicação social privada a sair do marasmo de dificuldades em que se encontra”, afirma Frei Gilson Frede, diretor do Jornal Terra Nova. 

Teresa Sofia Fortes, directora do recém-criado jornal Voz do Archipélago, mas com uma carreira de mais de 26 anos como jornalista, diz que ainda existem velhos problemas por resolver. 

“O que estamos a reivindicar hoje é o que se reivindicava nos anos 90. Ano após ano, apesar dos apelos, não são resolvidos, os discursos são muito bonitos, fala-se da importância da comunicação social privada, mas não passamos de palavras e não se criam condições para esse sector desempenhar cabalmente o seu trabalho”, lamenta. 

Para o director da Rádio Alfa, José Mário Correia, se é certo que são os órgãos privados que tornam o sector plural, por outro, os governos nunca tiveram interesse numa comunicação social pujante. 

Lei da Publicidade Institucional para breve 

A Lei da Publicidade Institucional é uma das maiores reivindicações da classe. O mercado é pequeno e a publicidade e os anúncios do Estado continuam nos órgãos públicos ou atribuída, de forma cirúrgica, a um ou outro privado. Além disso, a comunicação social pública ainda vai ao mercado disputar a publicidade geral em condições que os privados consideram desleais. 

Os órgãos privados, conforme vem defendendo o presidente da Associação dos Media Privados de Cabo Verde, Fernando Ortet, não têm onde buscar receitas se não for na publicidade. 

“Com todo o dinheiro que é dado aos órgãos públicos, estes ainda disputam a pouca publicidade no mercado, em circunstâncias em que ganham sempre aos privados. Os órgãos públicos vão ao mercado com um preço muito inferior porque têm dinheiro dos contribuintes, do Orçamento do Estado e das taxas audiovisuais, portanto, estamos num quadro de concorrência desleal”, aponta.

O decreto-lei sobre a publicidade institucional vem sendo trabalhado há alguns anos, tendo já passado pelo Conselho de Ministros e pela ARC, que, inclusive, pediu alterações e melhorias a serem introduzidas. O Secretário de Estado Lourenço Lopes voltou a garantir, na última reunião com a Comissão Especializada para Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos, Segurança e Reforma do Estado, que a lei entrará em vigor brevemente. 

Cristina Morais, jornalista e sócia-fundadora do portal Balai e José Augusto Sanches, director do Jornal A Nação

Mudança real

Para Cristina Morais, jornalista e sócia-fundadora do portal Balai, este decreto “poderá trazer uma mudança real para o panorama da comunicação social privada, porque vai dizer exatamente qual é o montante da publicidade do Estado que vai para esses órgãos”. 

Além disso, Morais vê com bons olhos o montante atribuído ao regulador do sector, acreditando que, se o decreto-lei entrar em vigor, a ARC faça valer o seu papel de fiscalizadora e garanta que a publicidade, de facto, seja alocada também aos privados conforme a lei. 

Frei Gilson Frede vai mais longe e defende que, mais do que a questão da publicidade institucional do Estado, não se deve descartar a própria retirada da RTC da publicidade. 

“O que acontece é uma situação esdrúxula. Nós, os contribuintes, pagamos a taxa audiovisual, tem a dotação orçamental, tem duas fontes de financiamento e ainda vai ao mercado publicitário para concorrer com os privados. Esta concorrência torna-se desleal porque, tendo outras fontes de rendimento, apresenta um preçário que nenhum privado pode dar-se ao luxo de fazer porque não tem outra fonte de rendimento”, analisa.

Refira-se que em Portugal, país geralmente seguido como modelo, comunicação social do Estado  tem acesso limitado à publicidade.

Para o diretor do jornal A Nação, José Augusto Sanches, grave também é o facto de, quando a publicidade instutucional é feita nos orgaos privados, ela acontece de forma  intransparente, arbitrária e discriminatória para favorecer determinados órgãos. 

Entende, por outro lado, que, além do orçamento de Estado, há outras formas de empoderar os media privados, entretanto ignoradas. 

Uma delas seria, como já teria sido sugerido ao próprio secretário de Estado, que as instituições do Estado tivessem assinaturas dos jornais, mas, lamentavelmente, muitas delas não têm. 

Incoerência nas condições de acesso aos incentivos 

À luz da lei do incentivo de 2017, para que um órgão de comunicação social possa candidatar-se aos subsídios atribuídos pelo Estado é preciso, entre outros requisitos, ter a situação fiscal regularizada e apresentar uma certidão de não dívida.

Tudo correcto, tendo em vista que se trata de uma empresa, porém também incoerente quando se olha à volta, inclusive para outras empresas do próprio Estado, conforme observa Cristina Morais. 

“Quantas vezes ouvimos de câmaras municipais, de empresas do Estado que estão a dever ao INPS, por exemplo. Exige-se aos privados, que são empresas muitas vezes pequenas, estar em situação de não dívida, quando na realidade até o próprio Estado não cumpre, porque tem dificuldade em cumprir”, refere a jornalista.

Os critérios de distribuição dos fundos e a discrepância entre os montantes atribuídos a cada órgão tem gerado questionamentos.

“Se formos ao edital deste ano, por exemplo, vamos ver órgãos digitais a receber a volta de 50 mil escudos no ano, e outros com montantes a avultados”, exemplifica.

Natalina Andrade

Leia mais na edição nº953 do Jornal A Nação de 04 de Dezembro de 2025.

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