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Ambiente

Montes submarinos de Cabo Verde: Estudo revela 14 ‘oásis’ subaquáticos ricos em pesca e biodiversidade

Monte Noroeste, Nova Holanda, Tchadona e Cadamosto são algumas das 14 montanhas marinhas existentes nos mares de Cabo Verde, ricos em biodiversidade. O recente estudo científico sobre estes montes submarinos, publicado na revista “Progress in Oceanography”, realizado por uma equipa de mais de 40 investigadores internacionais (e 10 nacionais) divulgado em Espanha e agora entre nós, veio expor o mundo marinho das profundezas. Uma nova luz sobre um dos ecossistemas menos visíveis, mas mais estratégicos do arquipélago.

Depois de durante séculos beneficiar da sua localização geoestratégica no Atlântico Médio, as ilhas de Cabo Verde e o mar em volta escondem outras potenciais riquezas, de grande importância, determinantes para o futuro da sua economia. De acordo com Jacob González-Solis, professor catedrático da Universidade de Barcelona, são cerca de 14 montanhas submarinas (e outras elevações menores), de origem vulcânica, em volta de Cabo Verde, escondidas sob a superfície do Atlântico, na sua Zona Económica Exclusiva.

Estas elevações do fundo marinho (Monte Noroeste, junto a Santo Antão, Nova Holanda, a leste da Boa Vista, o Tchadona e o Cadamosto, a 25 quilómetros da Brava, talvez o mais conhecido, medindo 1380 de altura) funcionam como verdadeiros oásis de vida, concentrando biodiversidade, atraindo espécies comerciais de elevado valor económico e sustentando, de forma directa e indirecta, milhares de famílias cabo-verdianas que dependem do mar para viver.

Possuidor de uma das maiores zonas económicas exclusivas (ZEE) da África Ocidental, Cabo Verde tem no oceano o seu principal recurso natural. Os montes submarinos — formações geológicas que se erguem centenas ou milhares de metros acima do fundo oceânico — são elementos-chave desse espaço marítimo. O estudo agora divulgado mapeou e analisou vários desses montes, avaliando a sua biodiversidade, dinâmica ecológica e importância para as pescas artesanais e industriais.

Bancos de pesca ricos em espécies marinhas

Os resultados confirmam aquilo que muitos pescadores já sabiam por experiência há gerações: os montes submarinos, também conhecidos por bancos de pesca, são zonas de grande produtividade biológica. As correntes oceânicas, ao encontrarem estas elevações, são forçadas a subir, trazendo nutrientes das profundezas para camadas mais superficiais. Este fenómeno, conhecido como ressurgência, alimenta o fitoplâncton e desencadeia uma cadeia alimentar que sustenta peixes, crustáceos, moluscos e a mega fauna marinha, como tubarões, tartarugas-marinhas, cetáceos.

E acordo com os investigadores, a biodiversidade associada a estes montes é espantosa. O estudo identificou recifes profundos de corais de água fria, esponjas de grande porte e comunidades de invertebrados ainda pouco conhecidas pela ciência. Muitas das espécies registadas são endémicas ou raras, o que reforça o valor ecológico destes habitats. Para além disso, os montes submarinos funcionam como áreas de reprodução, crescimento e alimentação para espécies migratórias como atuns, cavalas, tubarões, fundamentais para as pescas nacionais.

Do ponto de vista socioeconómico, a importância destes bancos de pesca é incontornável. Apesar de ainda ser considerado débil, dada a pequenez da frota nacional, o sector das pescas representa uma fonte crucial de rendimento, emprego e segurança alimentar em Cabo Verde, especialmente nas comunidades costeiras. A pesca artesanal, praticada maioritariamente a partir de pequenas embarcações, depende fortemente da proximidade — muitas vezes, feita a escassas dezenas de metros da costa — e da produtividade dos montes submarinos. Nesses locais, os pescadores encontram maiores capturas com menor esforço, reduzindo custos e riscos associados à actividade no alto-mar. Uma das grandes vantagens da pesca em Cabo Verde.

Riscos e ameaças ao ecossistema dos montes

Segundo o estudo, uma parte significativa do pescado desembarcado no país tem origem directa ou indirecta em ecossistemas associados a montes submarinos. Espécies de elevado valor comercial, destinadas tanto ao mercado interno como à exportação, concentram-se nestas zonas. O impacto estende-se a toda a cadeia de valor: desde a captura e comercialização até ao processamento, transporte e restauração, sectores que geram receitas essenciais para a economia nacional.

No entanto, os investigadores alertam para os riscos crescentes que ameaçam estes ecossistemas. A sobrepesca, a pesca ilegal e não regulamentada, o uso de artes —redes e equipamentos — destrutivos e os efeitos das alterações climáticas colocam pressão sobre os montes submarinos e a biodiversidade que deles depende. A acidificação dos oceanos e o aumento da temperatura da água podem comprometer habitats sensíveis, como os corais profundos, com consequências ainda difíceis de prever.

O estudo defende que a conservação dos montes submarinos não é apenas uma questão ambiental, mas também económica e social. A degradação destes ecossistemas poderia traduzir-se, a médio e longo prazo, na redução dos stocks pesqueiros, na perda de rendimentos para os pescadores e num aumento da vulnerabilidade alimentar do país. Por outro lado, a sua gestão sustentável representa uma oportunidade estratégica para Cabo Verde.

Entre as recomendações apresentadas estão o reforço da investigação científica, a melhoria da monitorização das actividades de pesca, a criação de áreas marinhas protegidas em zonas ecologicamente sensíveis e o envolvimento das comunidades locais na gestão dos recursos. O estudo sublinha ainda o potencial do turismo científico e do ecoturismo marinho, que pode gerar receitas adicionais sem comprometer a integridade dos ecossistemas.

Joaquim Arena

Leia a matéria na íntegra na Edição 955 do Jornal A Nação, de 18 de Dezembro de 2025

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