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Diáspora

Lei de imigração portuguesa provoca incómodo na CPLP

As alterações à lei dos estrangeiros aprovadas no Parlamento português estão a provocar grande incómodo entre os membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), levando mesmo a pronunciamentos de alguns chefes de Estado. O primeiro a manifestar-se foi José Maria Neves, seguindo-se Lula da Silva, do Brasil e, esta semana, o angolano João Lourenço. Com as alterações, desaparece o visto de trabalho da CPLP e torna-se mais difícil o reagrupamento familiar.

De passagem por Portugal, no final do mês passado, José Maria Neves foi o primeiro chefe de Estado da CPLP a pronunciar-se sobre as alterações à lei dos estrangeiros que, na ocasião, dominavam o debate público, aproveitando para lançar um aviso ao Governo de Lisboa: mobilidade e emigração existirão sempre!

JMN apela à serenidade

JMN referia-se, concretamente, ao facto de as regras de imigração e nacionalidade passarem a ser mais apertadas, nomeadamente no que respeita aos prazos mínimos de residência para aceder à cidadania portuguesa, mas também ao reagrupamento familiar.

“Temos de ver essas relações de troca, de intercâmbio, de amizade e procurar ser o mais justos e o mais prudentes possível”, disse o chefe de Estado cabo-verdiano.

O PR cabo-verdiano aconselhou prudência e serenidade porque, actualmemente, “a mobilidade humana vai continuar porque os países precisam, as economias precisam, a própria vida cultural dos diferentes países também”. Por isso, concluiu, “temos de ser serenos e prudentes na discussão dessa questão, sem extremismos e sem polarizações”.

Governo Brasileiro vai adoptar reciprocidade

Depois, o chefe de Estado brasileiro, Lula da Silva, disse acompanhar “com apreensão” as alterações legislativas promovidas por Portugal. E, dias depois, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowsky foi mais explícito.

“O Brasil adoptará a reciprocidade em relação a todas as medidas restritivas que Portugal tomar em relação em relação aos brasileiros que vivem no país”, garantiu Lewandowsky.

Presidente angolano mostra-se incomodado

O presidente João Lourenço disse estar incomodado com as alterações à lei dos estrangeiros aprovadas pelo Parlamento português. Em entrevista conjunta à TVI e CNN Portugal, o chefe de Estado angolano recordou que, historicamente, Portugal também é um país de emigrantes, devendo, por tal, tratar “de forma adequada” os estrangeiros que procuram esse país. “Hoje são uns, amanhã são outros”, lembrou João Lourenço.

Ulisses em contra-mão

Posição diferente tem o primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva, ao defender que as mudanças legislativas não significam que haja uma alteração substancial, quanto à CPLP e a Cabo Verde.

“Trata-se de uma matéria de soberania e de decisão legítima do Governo português”, disse UCS à agência Lusa. “Nós estivemos a fazer uma análise. Há algumas restrições, mas não significa que relativamente à CPLP, nomeadamente a Cabo Verde, haja uma alteração substancial de forma a piorar o quadro actual”.

Restringir acesso à cidadania e reduzir número de imigrantes

Restringir a obtenção da cidadania portuguesa e diminuir o número de pessoas que imigram para o país, é o argumento oficial para justificar a aprovação do pacote de alterações das leis da nacionalidade e imigração, aprovadas pela Assembleia da República de Portugal, no passado dia 16, e que se prevê venham a ter grande impacto junto dos imigrantes provenientes dos países da CPLP.

As novas regras para a imigração foram aprovadas pela coligação que suporta o Governo da Aliança Democrática (PSD e CDS, de direita) e pelo Chega, um partido de extrema- -direita. A Iniciativa Liberal (direita) absteve-se, e as esquerdas (PS, Livre, PCP, BE e PAN) votaram contra.

De todo o modo, não é para já que a nova legislação irá entrar em vigor, porquanto a lei ainda está a ser analisada pelo presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que tem sido pressionado pela esquerda e por instituições e personalidades da sociedade civil para exercer o seu direito de veto. Mas, independentemente da decisão de Marcelo, a lei só deverá regressar ao parlamento após as férias, em Setembro.

Na nova lei, alguns artigos se destacam, nomeadamente, a perda de cidadania portuguesa caso o imigrante cometa crimes graves e a dilatação do período de residência para efeitos do pedido de cidadania, cujo tempo se situava em cinco anos e, agora, passa para sete. Isto no que respeita a cidadãos da CPLP, porque, em relação aos outros, este período poderá ser fixado em dez anos.

A naturalização de filhos nascidos em Portugal deixa de ser automática, alargando o período em que o imigrante necessita de viver regularmente no país. Mas, também, termina com a possibilidade de autorização de residência para turistas brasileiros.

O projecto aprovado estabelece, ainda, a criação da Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras, uma nova força policial para fiscalizar a permanência de estrangeiros em solo português e, sendo caso disso, proceder a deportações.

Cimeira da CPLP

A ausência de Lula da Silva e de João Lourenço na XV Conferência dos Chefes de Estado e de Governo, que integra a Cimeira da CPLP, ocorrida na passada semana, em Bissau, acentua o incómodo que a nova lei de imigração suscitou nestes países. Embora Angola ainda se tenha feito representar pelo ministro das Relações Exteriores, o Brasil apenas se fez representar por um quadro do Itamaraty, o Secretário para África e Oriente Médio.

Na conferência, que inaugurou a presidência da Guiné- -Bissau, foi notada também a ausência do chefe de Estado português. Marcelo Rebelo de Sousa quis enfatizar recentes críticas ao regime da Guiné Equatorial, que acusou de violação dos direitos humanos, e marcar a sua oposição à conferência de Malabo, a acontecer daqui por dois anos, onde a presidência da CPLP ficaria nas mãos do referido país.

António Alte Pinho

Texto publicado na edição 934 do Jornal A Nação, de 24 de julho de 2025

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