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Política

Janira e grupo parlamentar do PAICV em rota de colisão

A líder do PAICV está em choque com o Grupo Parlamentar do partido, por causa do projecto de lei relativo ao estatuto dos titulares de cargos políticos, que já deu entrada na Assembleia Nacional, numa iniciativa conjunta com a bancada do MpD. Janira Hopffer Almada (JHA) considera que o PAICV pode ser penalizado nas próximas eleições legislativas, caso o diploma venha a ser aprovado.
Nas jornadas parlamentares de Fevereiro, JHA reuniu-se com o grupo parlamentar do PAICV, onde, segundo fontes deste jornal, preferiu falar de generalidades a ter que abordar um ou dois temas específicos. Entretanto, quando abordada por dois deputados sobre o seu posicionamento acerca da proposta do novo estatuto dos titulares de cargos políticos, “ela esquivou-se”, afirmando que o assunto seria tratado no fórum próprio, ou seja, na Comissão Política (CP).
Dito e feito. Na reunião da CP da passada sexta-feira, o assunto foi abordado, com a líder do PAICV e os seus apoiantes mais chegados a se posicionarem claramente contra a pertinência e a oportunidade da apresentação do diploma que, no momento de pré-campanha eleitoral, poderia prejudicar as pretensões do partido em renovar a maioria nas legislativas de 2016.
“Alguns membros da CP, que estão em cargos onde auferem 200, 300 e 400, ou até mesmo 600 contos, foram os que se mostraram contra os novos estatutos dos titulares de cargos políticos, por considerarem que o salário de 130 contos é suficiente para um deputado”, salienta uma nossa fonte, referindo-se, por exemplo, a Nuias Silva, João Pereira Silva, Moisés Borges e, agora, a José Maria Veiga que acaba de ser empossado como presidente do INPS. A isso soma-se também o caso do novo secretário-geral do PAICV, João do Carmo.
ALTERNATIVAS POSSÍVEIS
Com este cenário há duas alternativas possíveis, mas com consequências imprevisíveis: a manutenção da proposta de lei ou a sua retirada do Parlamento. A primeira alternativa fragilizaria a presidente do PAICV, cuja autoridade ficaria em xeque, enquanto a segunda poderia pôr em causa todos os consensos estabelecidos com o MpD, tendo em conta que essa é uma proposta conjunta dos dois partidos. Aliás, ao que A NA¬ÇÃO, o dossiê salarial dos políticos e a reforma do regimento da Assembleia Nacional, bem como a designação dos titulares dos órgãos externos ao Parlamento, é algo negociado, antes, por José Maria Neves e Ulisses Correia e Silva, ponto de partida para as duas bancadas “cozinharem” a proposta de lei que JHA quer agora voltar a pôr no congelador.
De acordo com uma fonte, se as razões que subjazem na apresentação deste diploma fossem “circunstânciais” ou de “tacticismo” político, como “esta da Janira que afirma que esta iniciativa nos pode levar a perder as eleições, aí seria prudente não avançar com o diploma”. Mas, esclarece o nosso interlocutor, “este projecto de lei está enquadrado na reforma do Parlamento e terá uma vigência de 20 anos, que ultrapassa várias legislaturas”.
De resto o mesmo informante diz não entender como é que se traz agora argumentos de “táctica política” para tentar “inviabilizar” um diploma que já mereceu o acordo dos grupos parlamentares, quando, em relação à escolha dos titulares dos órgãos externos, a mesma JHA tratou de chamar a si esse mérito, como fruto do seu primeiro gesto político junto da oposição, neste caso o MpD.
QUESTÃO ANTIGA
De recordar que a revisão dos estatutos dos titulares de cargos políticos, sobretudo no que toca aos salários, arrasta¬-se desde de 2003. Cansados, os deputados tanto do PAICV como MpD consideram que já é hora de se resolver, de vez, o assunto, sob pena de continuarem a ver o seu nível de vida a degradar-se.
Isto porque há quase vinte anos que os salários dos políticos não sofrem qualquer actualização por falta de entendimento entre os partidos. Isto porque, tratando-se de um assunto sensível, sempre que o mesmo é ensaiado por quem está no Governo a oposição trata de se posicionar em sentido contrário, na expectativa de capitalizar tal facto junto da sociedade. Foi o que fez o MpD, primeiro quando liderado por Agostinho Lopes e depois por Jorge Santos.
Curiosamente, a nova proposta de revisão dos estatutos dos titulares de cargos políti¬cos não fala na questão remuneratória, mas propõe melhorar o salário dos deputados pela via do subsídio de renda de casa, aliás, um expediente utilizado pelo Governo que atribui esse subsídio a cada governante, no valor de 70 mil escudos.
Um deputado ouvido pelo A NAÇÃO diz que ele e os seus colegas não são defensores desse expediente, por considerá-lo intransparente, mas, que, face à perda de poder de compra ora estimado em 36 por cento, “não há outra alternativa”.
Neste caso, sublinha, “a atribuição de um subsídio de renda de casa aos 72 deputados far-se-ia através de uma simples resolução da Assembleia Nacional, fugindo assim ao crivo da opinião pública”.
Em vez disso, os deputados defendem a revisão do estatuto remuneratório do Presidente da República, via pela qual os demais salários de titulares de cargos públicos estão indexados, permitindo assim que o assunto seja fixado de forma “transparente e sem as alcavalas, que em nada dignificam o bom nome da classe política”.
Para o interlocutor do A NAÇÃO, é inconcebível que o PR tenha apenas 170 contos como salário enquanto a maior parte dos diretores-gerais, presidentes de institutos públicos e administradores de agência e de empresas participadas do Estado estejam a auferir salários entre 200 e 600 contos. Aliás, ciente disso, o primeiro-ministro José Maria Neves chegou a anunciar que na Administração Pública ninguém poderia ganhar mais que o Chefe de Estado e do Governo. Não passou disso.
Aliás, num texto de opinião publicado neste número do A NAÇÃO, o vice-presidente da Assembleia Nacional, Júlio Correia, deixa entender a sua indignação pelo facto de se querer, mais uma vez, inviabilizar a revisão do estatuto dos titulares de cargos políticos. E, referindo-se aos seus pares do PAICV, diz estranhar que sejam aqueles que “mais parasitam a nossa Administração e as empresas públicas, que com os seus computadores e tabletes, e largo o jargão tirado da net, a fazerem o coro da diabolização à classe política”.
Para além da questão remuneratória, o projecto de lei que aprova os estatutos dos titulares de cargos políticos consagra um conjunto de novas regras sobre incompatibilidades, impedimentos, imunidades, controlo de interesses e de riqueza dos titulares de cargos políticos, visando garantir maior transparência ao exercício de funções políticas. O debate está, pois, lançado, uma vez mais.

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