O rapper angolano internado em Luanda escreveu uma declaração onde recusa assistência médica no caso de entrar em coma. Luaty Beirão reafirmou que só termina a greve de fome quando for libertado.
Luaty Beirão, o rapper angolano que está em greve de fome há 26 dias em protesto contra a sua prisão preventiva, escreveu uma declaração na quinta-feira onde deixou expresso que prescinde de assistência médica “na eventualidade de atingir o estado de coma ou desorientação cognitiva”.
A declaração, escrita no Hospital Prisão de São Paulo, começou a circular nas redes sociais. O Observador conseguiu confirmar a veracidade do documento junto de Pedro Coquenão, músico e amigo de Luaty Beirão.
Nele, o rapper invoca o “ponto 4 do preâmbulo do Tratado de Malta”, um documento internacionalmente reconhecido que estabelece direitos para quem entre numa greve de fome. O ponto referido por Luaty Beirão é o direito que o indivíduo em greve de fome tem de não ser tratado caso fique inconsciente, ao mesmo tempo que iliba o médico de quaisquer responsabilidades, caso o paciente morra.
Ponto 4 do preâmbulo da Declaração de Malta: “A última decisão de intervenção ou não-intervenção deve partir do próprio indivíduo, sem a intervenção de terceiros simpatizantes cujo interesse principal não é o bem-estar do paciente. Porém, o médico deve dizer claramente ao paciente se ele aceita ou não aquela decisão de recusar tratamento ou, no caso de coma, o alimentação artificial, arriscando-se assim a morrer. Se o médico não aceita a decisão do paciente de recusar tal ajuda, paciente seria autorizado a ser assistido por outro médico.”
Luaty Beirão deixou ainda uma única condição para terminar a sua greve de fome: “Se a liberdade provisória que exijo for atribuída”. Caso tal aconteça, admite que lhe seja dado um soro mais rico do que aquele que tem agora, que consiste numa solução salina que apenas o hidrata e que tem pouco valor nutritivo.
No final do documento, que é escrito em grande parte num tom jurídico e a assertivo, Luaty Beirão deixou uma nota para o caso de vir a morrer: “O meu derradeiro desejo é ser cremado e que as cinzas sejam vertidas no mar”.
A declaração foi escrita no último dia de Luaty Beirão no Hospital Prisão de São Paulo, que na sexta-feira foi transferido para a Clínica Girassol, um estabelecimento de saúde privado em Luanda. Leia o texto inteiro aqui:
Eu, Henrique Luaty da Silva Beirão, 33 anos, em greve de fome desde o dia 21 de setembro de 2015 e em plena posse de todas as minhas faculdades mentais e sensoriais, consciente das consequências da decisão ora tomada, declaro que, na eventualidade de atingir o estado de coma ou desorientação cognitiva, prescindo de assistência médica como previsto no ponto 4 preâmbulo da Declaração de Malta, salvo se a liberdade provisória que exijo for atribuída num instante subsequente, de tal modo que a recuperação seja ainda realizável sem danos que me obriguem a uma existência vegetativa.
O meu derradeiro desejo é ser cremado e que as cinzas sejam vertidas no mar.
Por ser verdade, vai por mim assinada.
Henrique Luaty da Silva Beirão
Luanda, 15 de outubro de 2015
Luaty: “O meu derradeiro desejo é ser cremado e que as cinzas sejam vertidas no mar”
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