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Política

Retrospectiva 2018: Dossiês sensíveis foram adiados mais uma vez

Parlamento

Na esfera parlamentar, durante o ano que ora finda, registaram-se vários factos, desde logo a entrada em vigor, em Outubro, do novo regimento da AN, que passou a funcionar com duas sessões plenárias quinzenais e introduziu o debate mensal com o primeiro-ministro. O novo regimento contempla ainda a criação da Comissão de Ética e Transparência e a Conferência dos Presidentes das Comissões Especializadas.

Entretanto, o Parlamento viveu alguns momentos conturbados e que suscitaram alguma confrontação entre as duas bancadas e uma certa crispação que acabou por redundar em cenas de pancadaria.

A questão relacionada com o levantamento de imunidade parlamentar dos deputados do PAICV, José Gomes da Veiga e João do Carmo, para serem ouvidos como testemunhas no âmbito do processo “Novo Banco”, suscitou aceso debate parlamentar, tendo conta o facto de ser ter violado um acordo tácito entre os grupos parlamentares em relação a essa matéria.

Os tambarinas acusaram a bancada da maioria de ter “dois pesos e duas medidas”, porquanto não se levantou a imunidade a deputados acusados da prática de crimes graves como o peculato e a violência baseada no género.

Outro facto marcante, pela negativa, aconteceu quando o deputado do MpD Felipe Santos, da ilha do Fogo, acusou o PAICV de estar a orquestrar uma assalto ao Parlamento, de rapto a deputados, entre outras denúncias. O PAICV solicitou à mesa da AN um inquérito para averiguar a veracidade das acusações, mas não houve qualquer reação nesse sentido.

Uma alegada violação do sentido de voto em relação à proposta do Governo sobre a lei da Regionalização, na generalidade, abriu feridas profundas no seio da bancada do PAICV. Os votos a favor de Filomena Martins e Odailson Bandeira, assim como as ausências “premeditadas” da sala de sessões dos deputados Júlio Correia, José Sanches e José Maria Veiga acabaram por viabilizar o diploma do Governo.

Na sequência da atitude desses deputados, a Comissão Nacional de Jurisdição e Fiscalização (CNJF) do PAICV decidiu avançar com processos disciplinares contra os mesmos.

Júlio Correia, José Sanches, José Maria Veiga, José Gomes da Veiga, Odailson Bandeira, Filomena Martins e Carlos Delgado, todos militantes e deputados nacionais nas fileiras do PAICV, resistem em responder à nota de culpa formulada pela CNJF no âmbito do processo disciplinar que este órgão do partido entendeu instruir por alegadamente terem violado os estatutos do partido, na sequência da discussão e aprovação da lei da regionalização do país.

Outra nota de destaque relaciona-se com o facto de o acórdão do Tribunal Constitucional ter considerado que o presidente da AN, Jorge Santos ter “usurpado” poderes que não eram seus, quando presidiu a plenária de Novembro de 2017, no momento em que exercia as funções de Presidente da República interino.

Entretanto, a briga entre Emanuel Barbosa (MpD) e Moisés Borges (PAICV) foi uma mancha na história do Parlamento cabo-verdiano.

 

Governo

Em termos políticos, o ano de 2018 arrancou com a posse dos novos membros do Governo, na sequência da “ampliação” do elenco governamental. Ulisses Correia e Silva, que tinha prometido um Governo enxuto, com o máximo de 12 membros, acabou, na primeira oportunidade, por aumentá-lo para 20, com a entrada de dois novos ministros e seis secretários de Estado adjuntos. Alguns dos convocados ninguém sabe ao certo para que servem, além de ajudarem a compor a mesa sempre que aparecem em algum acto público.

Olavo Correia que, enquanto ministro das Finanças, vinha tendo um elevado protagonismo em várias esferas da governação, foi promovido a vice-primeiro-ministro e Fernando Elísio Freire a ministro de Estado.

Luís Filipe Tavares, um dos vice-presidentes do MpD, foi quem saiu mais fragilizado nessa remodelação, ao ver os seus pares a ascenderem na hierarquia governativa, enquanto perdia a pasta de integração regional, que passou para o novel ministro Júlio Herbert.

Outro grande derrotado foi José Gonçalves, que perdeu várias competências ao ver sectores importantes da Economia a transitarem para o vice-primeiro-ministro e as áreas do comércio, indústria e energia a serem confiadas ao novo ministro Alexandre Monteiro.

A Educação passou a ter um secretário de Estado, Amadeu Cruz, para auxiliar a ministra Maritza Rozabal, que vem dando mostras de uma certa incapacidade em implementar o programa para esse sector.

Para além de Amadeu Cruz, o elenco governamental passou a contar com mais os seguintes secretários de Estado: Gilberto Barros, Finanças; Edna Oliveira, Modernização Administrativa; Pedro Lopes, Inovação e Formação Profissional; Paulo Veiga, Economia Marítima; Carlos Monteiro, adjunto do ministro de Estado. O que fazem ou deixam de fazer alguns desses senhores, a que se junta o ministro Júlio Herbert, é coisa que não sabemos ao certo.

Com essa remodelação, UCS passou a coordenação económica para Olavo Correia e a coordenação política para Fernando Elísio Freire.

No acto de posse dos novos membros do Governo, o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, fez o papel de costume: pediu mais rigor, determinação e informação sobre “os processos essenciais da política governativa”, considerando que a informação “traz transparência nos negócios públicos” e é “garantia de responsabilidade política”.

 

Leite derramado

A polémica sobre o “Leite Derramado”, relacionada com implementação do diploma que aumentou as taxas de importação para o leite e derivados e sumos de frutas, também marcou a vida política no ano que ora finda.

A entrada em vigor dessa medida que constava do Orçamento do Estado para 2018, coincidiu ocm a entrada no mercado de uma nova marca de leite e sumos produzida pela Tecnicil Indústria, o que, em termos éticos e não só, levantou algumas dúvidas, tendo em conta a ligação do ministro das Finanças, Olavo Correia, com essa empresa, onde, durante largos anos, desempenhou as funções de administrador.

Aprovada por unanimidade no Parlamento, no quadro do OE 2018, a medida foi, posteriormente, encarada pelos partidos da oposição e pelas empresas importadoras como sendo uma medida que beneficiava a Tecnicil-Indústria. A reconhecer que andou mal é o facto de a mesma medida já não constar do OE para 2019. Valha-nos isso como nota positiva da controvérsia, que mereceu a intervenção do Ministério Público. Contudo, sem que ninguém tenha sido ouvido, o MP entendeu que “da factualidade denunciada e analisada, inexiste conduta criminalmente tipificada e punível nos termos do ordenamento jurídico cabo-verdiano”, e adiantou que a existirem” violações éticas, elas devem ser sancionadas “em outra sede”.

 

Transportes

A questão dos transportes, tanto marítimo quanto aéreo, marcou negativamente a vida política cabo-verdiana. Promessas não cumpridas, uma certa intransparência na gestão dos dossiês e nos concursos públicos, assim como várias contradições em torno da TACV, Binter e do concurso público de transportes marítimos, foram tónica neste ano de 2018, que ora finda.

Em relação à TACV (agora Cabo Verde Airlines) registou-se praticamente uma reedição do ano anterior, com avanços e recuos em relação ao hub do Sal. Na verdade, a situação da TACV arrasta-se desde 2016, quando o Governo entrou em funções, aparentemente, decidido a resolver o assunto no espaço de poucos meses. A realidade, como sempre, continou a falar mais alto.

Diante das críticas, a TACV, agora sob a batuta da Icelandair, acabou por dar o dito por não dito, repondo os voos a partir do Aeroporto Internacional Nelson Mandela, facto este que gerou uma onda de indignação junto da população de São Vicente que também exigia a retoma dos voos da TACV a partir do Aeroporto Internacional Cesária Évora.

O movimento Sokols e as forças vivas de São Vicente resolveram sair à rua para manifestarem o seu desagrado em relação às declarações do primeiro-ministro que afirmara que a decisão não era política e nem administrativa e que a retoma do voos de e para São Vicente dependia do mercado. O edil Augusto Neves também entrou na onda exigindo pelo menos quatro voos da TACV para São Vicente, como acontece em relação à Praia.

Com a crise gerada em torna das evacuações de doentes de várias ilhas, UCS foi, mais uma vez, confrontado pela oposição sobre o serviço público que a Binter deveria prestar. UCS, num primeiro momento, disse que não havia qualquer contrato entre o Governo e essa companhia aérea. Mas depois veio dizer que havia “apenas” um memorando de entendimento. Isto sem esquecer, no caso da TACV, as vezes que tanto UCS como Olavo Correia se recusaram a revelar o “contrato” por nele haver cláusulas de “confidencialidade”… Portanto, aqui como noutros sectores, o ziguezague é constante…

Nos transportes marítimos tudo continuou rigorosamente na mesma. Aqui, com os operadores económicos, e não só, a reclamarem a falta de ligações entre as ilhas, com grande repercussão nos seus negócios.

Em Janeiro, o Governo lançou um concurso público internacional para selecionar um parceiro estratégico, com know-how comprovado neste ramo de atividades para, através de uma concessão única, passar a fazer a gestão e a exploração do serviço público de transporte marítimo de passageiro e cargas inter-ilhas. O executivo esperava obter os navios em Outubro último, mas o processo foi ensobrado por várias denúncias de falta de transparência e de tentativa de excluir os armadores nacionais.

Através de um concurso considerado “draconiano”, pelos armadores nacionais, a portuguesa Transinsular foi declarada vencedora. Segundo o caderno de encargos, a empresa vencedora deveria adquirir cinco navios novos para garantir a ligação inter-ilhas, mas a Transinsular apresentou uma proposta com apenas três navios. E mesmo assim venceu. O concurso ficou também ensombrado com a denuncia de que um dos elementos do júri trabalhava para a Transinsular, empresa vencedora.

 

SOFA

Depois de um certo suspense, o Presidente da República acabou por ratificar o SOFA (Status of Forces Agreement), um acordo militar Cabo Verde os Estados Unidos da América, que fez correr muita tinta.

Ao anunciar a ratificação do SOFA, Jorge Carlos Fonseca afirmou não ter encontrado qualquer indício de inconstitucionalidade no documento, apesar de reconhecer que algumas disposições são susceptíveis de gerar diferentes pontos de vista, numa alusão particular à norma que prevê que os militares americanos que cometam um crime em território nacional fiquem sob alçada da justiça militar do seu país.

Entendimento diferente teve o Grupo Parlamentar do PAICV que suscitou a fiscalização sucessiva do diploma junto do Tribunal Constitucional. O maior partido da oposição posicionou-se publicamente contra o acordo, sugerindo que este viola a Constituição. Apesar da abstenção no Parlamento, o PAICV desafiou JCF a pedir a fiscalização ao Tribunal Constitucional, algo que o Presidente negou fazer.

O SOFA foi assinado há um ano, em Setembro de 2017, pelo ministro dos Negócios Estrangeiros e Cabo Verde aceitou todas as exigências americanas e que a versão final do documento é igual ao rascunho proposto pelos EUA.

Um dos pontos polémicos do SOFA resulta do artigo 12º, através do qual Cabo Verde e Estados Unidos “renunciam a todas e quaisquer demandas entre si por danos, perda ou destruição de propriedade da outra parte, ou por lesão ou morte de pessoal das forças armadas ou pessoal civil de qualquer das partes, decorrentes do desempenho das suas funções oficiais”, ao abrigo do acordo.

O SOFA foi aprovado no Parlamento com votos a favor do MpD e abstenção do PAICV e da UCID. E um dia o Tribunal Constitucional haverá de dizer se alguns dos seus preceitos são ou não inconstitucionais.

E o mais incrível, depois de dizer que, com o SOFA, os EUA são o principal parceiro externo de Cabo Verde no campo da defesa e segurança, sem que nada de materialmente relevante tenha acontecido até agora (nem sequer o terceiro envelope do MCA) o ano de 2018 termina com a China a oferecer-nos uma ajuda de 425 mil contos para ajudar as nossas Forças Armadas a resolverem algumas das suas urgências.

 

CPLP, a “conversa” continua

Na frente externa, ou diplomática, Cabo Verde assumiu a presidência da Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa (CPLP), tendo a livre circulação de pessoas e bens como um dos seus propósitos. A cimeira aconteceu, em Julho, na ilha do Sal, e foi um momento politico e diplomático importante para a cidade da Praia.

Contudo, tirando a solenidade do momento em si é muito pouco provável que a CPLP deixe de ser o que é: um encontro de chefes de Estado e ministros, regados com muita poesia. Cabo Verde, sede do IILP (Instituto Internacional de Língua Portuguesa) sequer tem as suas cotas em dia neste organismo, o que por si dá a ideia do quanto levamos a sério a Comunidade. Não é por isso de estranhar que muitas sejam as vozes, sobretudo de empresários, mas também agentes da cultura, a darem mostras de já não terem pouca paciência para tanta lamechice afro-luso-brasileira-timorense.

 

Fórum de Paris

No cair do pano sobre 2018, Cabo Verde conseguiu mobilizar 850 milhões de euros, no Fórum de Paris, promovido pelo Governo cabo-verdiano e que decorreu entre 11 e 12 de Dezembro, na capital francesa.

Entre os parceiros que confirmaram o seu engajamento com  Cabo Verde estão a União Europeia, o BIDC, o FIDA, o Banco Mundial, o BAD, o BADEA, PNUD e Luxemburgo.

O primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva classificou o Fórum como  “um sucesso” e confirmou que “acordos importantes” foram já assinados com diversos parceiros.

O Luxemburgo e o PNUD, acabam de viabilizar 1,2 milhões de euros para a Plataforma de Desenvolvimento Local, com o Banco Mundial conseguiu-se dez milhões de dólares para o sector da Educação, e a UE avança com dez milhões de euros para a Boa Governação.

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