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Sociedade

São Vicente: formação superior, entre as expectativas e a realidade do mercado

Fazer uma formação superior para melhor singrar na vida continua a ser um objectivo para a maioria das pessoas. Com o mercado saturado de trabalho saturado, as angústias da formação e depois da busca do primeiro emprego são dramas e desafios que os jovens são obrigados a encarar, mormente numa ilha como São Vicente. Tiago Silva e Maryline Lopes são dois casos que falam por si.
Tiago Silva é um exemplo de motivação. Com 22 anos, natural de São Vicente, o nosso jovem fala com entusiasmo da sua escolha e dos seus planos para um futuro próximo. Tiago frequenta o segundo ano do curso de Relações Pública e Secretariado Executivo, na Universidade de Cabo Verde (UNI-CV).
Mudou de área depois de passar por um curso de informática de gestão e perceber que aquilo não era o que queria fazer. Hoje diz-se satisfeito com a mudança e fala com entusiasmo do seu novo curso. “Apesar de ser uma área que eu adoro, a minha escolha revela-se também muito estratégica, pois, a comunicação é o futuro. Independentemente dos cursos que possam vir a surgir no futuro, um relações publicas será sempre imprescindível a qualquer instituição”, explica.
Entretanto, Tiago reconhece, no mercado nacional, ainda uma fraca abertura para a necessidade de um departamento de Relações Públicas nas instituições.
“Em Cabo Verde há ainda a ideia de que o Relações Públicas (RP) é o rapaz ou a rapariga que vende os bilhetes para as festas. Em termos institucionais, os RP estão dentro do departamento de Marketing, ou seja, não se tem a preocupação de criar efectivamente um departamento para essa área.”
Isto, como explica, “está estritamente ligado com o facto de ainda não haver um mercado agressivo no país, como a concorrência necessária e por ainda os próprios meios de comunicação serem muito ‘softs’, no sentido de não fazerem pressão comunicacional às empresas”.
Uma situação que, todavia, não tira as esperanças a Tiago, que considera ser uma evolução que “vai acabar por acontecer”, tendo em conta que o RP é a imagem da empresa, o primeiro a dar a cara, por exemplo, na gestão de crises.
“Neste momento a maior parte dos RP no mercado não trabalham na sua área específica. São alocados em departamentos similares ou em outros departamentos, porque lá está, o RP é extremamente versátil.”
Tiago espera, por isso, encontrar um mercado mais evoluído para a sua profissão. No caso de isso não acontecer, diz, “há imensos caminhos a seguir”. O seu sonho é, enquanto profissional, poder ser competente naquilo que faz.
No extremo oposto ao Tiago, Maryline Lopes terminou o curso de Ciências Sociais e Políticas há três anos.
Escolheu este curso porque queria seguir a área de antropologia e investigação científica. Entretanto, viu o seu caminho desvirtuado pela própria universidade que, segundo ela, decidiu pela área política em detrimento da social. Enfim, o próprio curso em si, garante, não foi aquilo que esperava no início.
“A expectativa era ter feito mais aulas práticas e não estar a maior parte do tempo dentro da sala a estudar teorias. Era, quando terminar o curso, encontrar um emprego na área que eu escolhi”, acentua Maryline.
Para além de ter saído de uma formação que não foi que o que planeou, Maryline se depara com uma situação que repete o cenário antes vivido no curso. Os concursos até recrutam profissionais das Ciências Sociais, mas para trabalharem na área política ou do direito. Não há uma demanda para a área da sociologia.
“O meu sentimento é de revolta. Primeiramente com nós mesmos que, enquanto alunos, não tivemos a capacidade de protestar contra a imposição da universidade. Fico triste por ter investido tanto na minha formação e agora estar nesta situação”, lamenta.
Maryline Lopes lastima que, como ela, a maioria dos seus colegas estão desempregados e garante que, se tivesse que recomeçar, hoje não faria a mesma escolha. “De que nos vale uma formação superior se não temos como aplicar os conhecimentos que fomos adquirindo ao longo dos anos de curso?”, pergunta, com tristeza. 
Natalina Andrade
*Esta reportagem foi publicada no Caderno especial São Vicente na edição 636 do Jornal A NAÇÃO

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