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Opinião

Qualquer música

Por: Filinto Elísio
Veio e aconteceu o Natal. Estimo que tenha sido um Natal de Paz e Concórdia para aqueles que me acompanham nesta coluna do Jornal A Nação. Eu passei um Natal em família e em meditação, na saudade daqueles que não me andam por perto e daqueles que já de mim para sempre partiram. Uns e outros, todos são parte de mim, em tempos natalícios. 

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E o Natal para mim não se resume à liturgia religiosa e ao encontro familiar. Tampouco significa esse desenfreio mercantil  de um consumismo obsceno, como se o mundo cifronista e significante nos fosse salvar a Humanidade, tomada em sua grande medida pelo sofrimento, pela subalternização e pela escravidão de muitos. Na manhã de Natal, acompanhei em direto a Mensagem Urbi et Orbi de Francisco que incidia na preocupação no tocante à intolerância, à brutalidade e ao poder da besta. O jamais Natal daqueles que atravessam fatidicamente o Deserto do Sahara e o Mar Mediterrâneo, galgam o Muro na fronteira norte do México e estão sitiados pelas milícias nas favelas da América Latina, entre outros condenados da terra em tempos de 5G.

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Não me peçam que elenque os melhores e os piores do ano. São circunstancialmente critérios mediáticos e não tenho idade, nem paciência para o prato-feito e o pronto-a-vestir. Se me perguntarem se gostei da capa da Revista Time, digo que sim, a Greta, para além de dizer verdades ao seu estilo, desconcerta a besta de serviço e isso já de sim vale a pena. Se acharem que vou ser arma de arremesso político de uns contra os outros, tirem o cavalinho da chuva, pois ando em tempo de meditação e não destrinço sombras quando tudo é monocromático. Continuarei a ler poesia no ano de 2020, havendo vida e saúde. Rogo-vos que leiam poesia, recomendando eu Manoel de Barros, entre tanta gente boa, alguma a ser editada pela Rosa de Porcelana Editora.

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A fechar esta pequena crónica, alguém conta que foi assaltado na cidade da Praia. É dos livros que a quadra natalícia é dada a assaltos e essas coisas. A desigualdade dói, fere e mata. De todas as formas. Já imaginaram os Reis Magos a deambular pelas ruas da minha cidade, com ouro, incenso e mirra, entre gente assaz raivosa? Era um deus-nos-acuda, minha gente.

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Tentem, até onde der, que 2020 seja um ano mais decente. Em morna, jazz, tango…qualquer música que nos valha o estarmos vivos.

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