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Política

Ano do chumbo da Regionalização

SOFA
O caso relacionado com o acordo SOFA ((“Status Of Forces Agreement”), assinado pelos governos de Cabo Verde e dos Estados Unidos da América (EUA) transitou para 2019, com um novo pedido de fiscalização abstracta e sucessiva desse diploma, junto do Tribunal Constitucional. 
Foi uma iniciativa de um grupo de 88 cidadãos, no país e na diáspora, do qual fazem parte o professor universitário Wladimir Brito e a historiadora Ângela Coutinho.
Os signatários da petição colocaram um conjunto de questões relacionadas com a garantia do exercício de direitos assegurados aos cidadãos nacionais, a associações cívicas e entidades diversas. 
Entendem que da forma como o SOFA se encontra redigido, os interesses de Cabo Verde, particularmente no domínio da justiça, não se encontram devidamente salvaguardados. E mais, aludem ao facto de personalidades nacionais consideradas das “mais sérias e competentes” na matéria terem denunciado publicamente “ilegalidades e até inconstitucionalidades” no referido acordo.
O SOFA foi assinado em Setembro de 2017, entre os Governos de Cabo Verde e dos EUA, e ratificado um ano depois pelo Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, depois da sua aprovação no Parlamento, em Junho do ano passado. 
Na sequência disso, e por discordar de alguns pontos do acordo, o Grupo Parlamentar do PAICV suscitou já ao Tribunal Constitucional em Outubro passado. 
Contudo, ainda se aguarda um posicionamento do Tribunal Constitucional sobre esses dois pedidos.  
 
Tarrafal (de Santiago) 
O ano começou com uma manifestação realizada por jovens do Tarrafal, contra a situação de “marasmo” em que se encontra esse município a norte da ilha de Santiago.
Depois dessa manifestação, a Câmara Municipal e o Governo central desdobraram-se em acções, com novas promessas, fóruns, lançamento de primeiras pedras para anular a ideia de que o Tarrafal é um município parado no tempo, como acusam os descontentes. 
Neste despertar, em mais de um momento, José Pedro Soares prometeu investimentos para o sector do turismo e a construção de várias infra-estruturas sociais. 
A reforçar a mensagem, o vice-primeiro ministro e também ministro das Finanças, Olavo Correia, não ficou atrás, na linha de resto do que havia feito também o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, que esteve de visita na semana passada a Santiago Norte. 
A situação de “marasmo” manteve-se e, agora, no final deste ano, o deputado José Manuel Soares lançou duras críticas à gestão do edil José Pedro Soares. 
Num encontro do partido, onde esteve presente o líder do MpD e primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, o deputado José Soares chegou a pedir o reforço da fiscalização dos fundos transferidos para a Câmara Municipal local, mostrando-se claramente desacreditado quanto à capacidade e honestidade do autarca José Pedro Soares, em gerir os fundos que o Governo anda a transferir para todos os municípios do país.
 
Regionalização
Depois de ter sido aprovada, na generalidade, na sessão de Outubro de 2018, a lei sobre a regionalização foi retirada da agenda em Março deste ano, depois do pedido de cancelamento da votação, na especialidade, feito pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Fernando Elísio Freire. 
O pedido de retirada do diploma surgiu na sequência do chumbo dos artigos 6º 7º desse diploma e as alterações que tinham sido propostas pelo MpD em consenso com a UCID. Assim ficou adiada a discussão e a votação da legislação que deveria criar as 10 regiões administrativas de Cabo Verde.
“Cancelamos porque o PAICV posicionou-se claramente contra as ilhas, contra o aprofundamento do poder local e contra criarmos oportunidades de criação de riqueza, inclusão social e emprego nas ilhas”, afirmava o ministro 
A UCID, por seu lado, considerou que o governo errou ao cancelar a proposta. O presidente da UCID, António Monteiro, afirmou, na altura, que o “cancelamento não foi a melhor solução” uma vez que, como acrescentou, “tratando-se de um instrumento importante para o desenvolvimento do país e um certo equilíbrio entre as ilhas, os sujeitos parlamentares deveriam ter um pouco mais de tranquilidade e discutir as questões fracturantes até ao fim e dar ao país uma proposta que pudesse servir”.
O cancelamento da proposta acabou por não surpreender o PAICV “de modo algum”. “Eu creio que foi a opção mais inteligente”, afirmava João Baptista Pereira. 
“Não fazia sentido continuarmos a discutir os artigos até ao final. Nós queríamos ver qual iria ser a criatividade do Governo para continuar esta discussão uma vez que os artigos estavam a ser reprovados”, reforçou.
Contudo, as declarações do Cardeal Dom Arlindo Furtado (edição 597, deste Jornal) em torno da Regionalização, terão sido levadas em conta pelos deputados, sobre esse dossiê que se arrasta há mais de 20 anos. O PAICV congratulou-se com o chefe da Igreja Católica em Cabo Verde, enquanto o MpD remetia-se ao silêncio estratégico.
Em entrevistas à Inforpress e à Televisão de Cabo Verde (TCV), Dom Arlindo Furtado colocava um conjunto de interrogações sobre a forma e a pertinência como a classe política quer levar avante a Regionalização. 
Para o Cardeal, a Regionalização só será “bem-vinda”, desde que venha ajudar um “melhor desenvolvimento, maior justiça social e menor dissimetria” entre as regiões do país, mas pede também “alguma ponderação”. 
Em vez disso, defende que se deve fazer a “promoção da autonomia e também financeira dos municípios”. 
“Se há outras formas melhores, os políticos e os economistas poderão dar ideias mais valiosas do que as minhas”, admitiu o prelado, ressalvando que Cabo Verde não deve acomodar-se numa “única fórmula”, que contribua para o “desenvolvimento do país, equilíbrio social e bem-estar das pessoas”. 
O responsável máximo da Igreja Católica cabo-verdiana considera, entretanto, que caso vá adiante, a Regionalização deve ser feita de “forma progressiva” em determinadas partes do país,  de modo a “corrigir eventuais erros e ganhar novas ideias e novas perspectivas”…
Dom Arlindo pediu, por isso, alguma ponderação no que tange à regionalização, porque, como diz, “fazer de cada ilha uma região pode ser um risco grande”.
“Vejo ilhas muito pequenas com uma grande sobreposição de poderes, autárquicos e regionais”, precisou, perguntando como se pode fazer, numa ilha como a Brava, uma grande distinção “entre o municipal que se preze e o poder regional”. Para o Cardeal, o mesmo se pode dizer em relação ao Maio e a São Nicolau. 
 
Fundo do Ambiente
Em Março deste ano, o Parlamento levantou a imunidade do deputado Moisés Borges, que tinha sido construído arguido no âmbito do processo relacionado com o Fundo do Ambiente. 
Agora, em Novembro, o Tribunal de Contas publicava, no seu site, um acórdão condenando o ex-director-geral do Ambiente, Moisés Borges, e o antigo ministro do Ambiente, Antero Veiga, dando conta de “muitas ilegalidades/irregularidades suscetíveis de responsabilidade financeiras e potenciais outras ilegalidades que não foram esclarecidas e que podem consubstanciar-se em matéria de foro criminal”.
Os relatórios das Contas de Gerência do Fundo do Ambiente relativos aos exercícios de 2012, 2013 e 2014 não foram homologados pelo TdC, alegadamente, por conterem várias ilegalidades e irregularidades susceptíveis de responsabilidade financeiras de foro criminal. 
Com isso, Moisés Borges, antigo director-geral do Ambiente, e Antero Veiga, ex-ministro do Ambiente, terão, supostamente, que repor cerca de 500 mil contos aos Cofres do Estado. Nilton Rocha Dias, antigo diretor-geral do Planeamento, Orçamento e Gestão do MAHOT, e Tatiana Neves, secretária do ministro, estão também implicados neste caso. 
Relativamente a 2012, segundo o TdC, o total a repor é de mais de 27 mil contos, em 2013 ascende a 127 mil contos e em 2014 é de 344 mil contos. 
Uma fonte ligada ao caso Fundo do Ambiente salienta que parte importante dos recursos, alegadamente, em falta, foi transferida para os municípios e que isso ficará provado, a seu tempo, a nível do Ministério Público e, se necessário, dos tribunais que forem julgar o processo. 
“Portanto, a ideia de que os principais responsáveis do Fundo do Ambiente puseram o dinheiro no bolso é falsa, porque eivada de má fé”, sublinha. 
 
Dornier/CASAS
O anúncio relativo à troca do avião Dornier da Guarda Costeira para dois aviocares “CASA”, foi um dos maiores bluffs, no decurso deste ano, que ora termina. 
Mas o facto é que os dois aviões CASA continuam “hangarados”, desde 2011, na base da Força Aérea Portuguesa (FAP), em Montijo, Portugal. Estão inoperacionais e em avançado estado de degradação, ao contrário do que disse o Governo num comunicado de 20 de Junho, para desmentir uma notícia do A NAÇÃO (nº616, de 20 de Junho). 
Aliás, na altura, as imagens publicadas pelo jornal mais do que falavam por si. Mas, mesmo assim, no seu comunicado o Governo mostrava-se decidido em levar avante o negócio, dizendo que a 18 de Junho, Luís Filipe Tavares e o embaixador Eurico Monteiro visitaram a base aérea militar do Montijo “onde verificou in loco os bons trabalhos em curso nas duas aeronaves C212”.
Contudo, na altura, esta informação foi prontamente desmentida pelas fontes do A NAÇÃO, de 28 de Junho. Pois, “nenhuma entidade oficiosa ou oficial, muito menos um ministro da Defesa de um país estrangeiro e seu embaixador, visita uma instalação militar, sem a devida autorização e respeito pelo protocolo que tais entidades merecem e carecem. Assim, é fácil de desmascarar esta mentira”.  
 
BASTA da Boa Vista 
José Luís Santos não perdeu o mandato como presidente da Câmara Municipal da Boa Vista, porquanto, o Ministério Público revelou-se condescendente com esse autarca, que meteu os pés pelas mãos, ao afirmar que era militante do MpD e que pagava religiosamente as suas quotas nesse partido. 
Ao assumir publicamente que é militante do MpD, tendo em conta que foi eleito presidente da Câmara da Boa Vista através de uma candidatura independente suportada pelo BASTA (Boa Vista Avante Sempre Trabalhando Arduamente),  JLS violou a legislação, que não permite duplas inscrições nas forças políticas que dirigem as autarquias. 
E, como professou A NAÇÃO, na sua edição 620, o Ministério Público fez vista grossa e não aplicou o estatuído no decreto regulamentar sobre o processo de perda de mandato de órgãos municipais, referente a este caso. 
Também o BASTA foi condenado a pagar uma coima de 1200 contos, por causa do incumprimento na prestação de contas eleitorais. 
Em de 2018, a CNE aplicou uma coima de mil e 500 contos ao grupo BASTA, por verificada infração no processo de prestação de contas pelos integrantes dessa lista concorrente às eleições autárquicas de 2016. 
Face à gravidade da situação, derivado do incumprimento em matéria de prestação de contas eleitorais, a CNE optou por uma condenação solidária, determinando que a coima deveria ser suportada pelos integrantes dessa candidatura, com destaque para Frabrizio Casale, enquanto administrador eleitoral, José Luís Santos, integrante e cabeça de lista à Câmara Municipal e Péricles Barros, integrante e cabeça de lista para a Assembleia Municipal.
Contudo, o Tribunal Constitucional não deu provimento ao recurso do BASTA, mantendo praticamente a mesma decisão do CNE, mas com uma ligeira redução da coima, que passou de mil e 500, para mil e 200 contos.    
 
(Publicado no A NAÇÃO impresso, nº643, de 26 de Dezembro de 2019)

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