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Cultura

São Nicolau: Fuga de população jovem para outras ilhas enfraquece Carnaval na Ribeira Brava

A falta de jovens para integrar as alas dos grupos de Carnaval, na Ribeira Brava, ilha de São Nicolau, devido ao êxodo rural, está a preocupar o presidente do Copacabana, Emanuel Cabral. Aqui não há disputas de prémios e o Entrudo faz-se com o que há de mais genuíno, a criatividade. A tradição vai cumprir-se e os imponentes andores cheios de brilhos vão voltar a irromper pelas ruelas estreitas da Cidade. 
Emanuel Cabral, presidente do grupo Copacabana, um dos dois grupos oficiais do Carnaval da Ribeira Brava, garante que estão empenhados em ultimar os preparativos para que a festa do Entrudo no município volte a fazer jus à fama de ser um dos mais bonitos e originais do país.
O tema deste ano, diz, é “surpresa”, para causar mais “impacto”, mas promete muito brilho e alegria aos foliões. No total estão previstas seis alas, apesar do pouco número de pessoas, tendo em conta que até agora, tinham apenas pouco mais de duzentos figurantes. Isto porque o Carnaval deixa transparecer também o que vem acontecendo um pouco por toda a ilha, ou seja, o êxodo de jovens para outras paragens do país, em especial as mais turísticas, como Sal e Boa Vista, à procura de emprego e de uma vida com mais oportunidades. 
“A fuga de população jovem já está a pôr em causa, não só o Carnaval como o desenvolvimento da ilha”, desabafa este cidadão.
 
Tudo dentro do “normal”
O presidente do Copacabana garante contudo que, mesmo assim, os preparativos estão a decorrer dentro do “normal”, tendo em conta que em termos de materiais o grupo começou a trabalhar com alguma antecedência. 
“A aquisição de materiais foi feita com a devida antecedência junto dos fornecedores habituais. Mas os patrocínios continuam a ser um dos maiores constrangimentos, pois temos poucas empresas na ilha para patrocinar este tipo de eventos”.
Os imigrantes e os amigos do Copacabana são quem mais apoia e contribui para que o Carnaval seja possível, sempre com o brilho e a expectativa que se espera. Mas, quer o Copacabana, quer o Estrela Azul, com o qual o A NAÇÃO não conseguiu chegar à fala, receberam 800 contos, cada, do Ministério da Cultura e Indústrias Criativas e 450 contos, cada, da Câmara Municipal da Ribeira Brava. “As duas verbas juntas servem para cumprir cerca de metade do investimento feito”, avança. 
A rainha vinda dos Estados Unidos da América (EUA), já chegou à ilha e já se juntou ao grupo para os ensaios. O Copacabana promete muito brilho a irromper pelas ruas e ruelas estreitas da Ribeira Brava e espera que este ano se consiga superar o habitual atraso do primeiro dia de desfile, sábado,22. 
Isto para que todos possam desfrutar da beleza do Carnaval, que é para ser vista por todos, especialmente os mais idosos que têm dificuldades em ficar acordados noite adentro até de manhã mais tarde. 
Brilho da Zona de volta às ruas
Além do Copacabana e do Estrela Azul, entre os grupos oficiais da Ribeira Brava, figura o Brilho da Zona, do Caleijão.  “Renovação Industrial” é, segundo Maria Ramalho, presidente do grupo, o tema que dá mote ao enredo deste ano. Um tema que, diz,  inspirou e ajudou o grupo a trabalhar nos trajes, nos andores e na música. A nossa entrevistada promete que é um tema que vai trazer “muita cor e alegria”. 
No total estão previstas duas alas, ainda sem um número final de pessoas envolvidas. “Ainda estamos a trabalhar nas alas, começamos a trabalhar tarde”, disse.  
Este ano o grupo está de volta às ruas, depois de não ter saído o ano passado, por motivos de vária ordem. “Talvez houve falta de organização o ano passado porque trocou-se de associação”. Este ano o grupo prevê uma reentrada “em grande”. 
Tal como os outros dois grupos oficiais da Ribeira Brava também este recebe 800 contos da autarquia local e 800 contos do MCIC. “É um valor que já ajuda”. 
Na Ribeira Brava os desfiles oficiais acontece a 22,23 e 25 deste mês. E ao contrário também de outras paragens a festa é sobretudo à noite. 
 
Grupos do Tarrafal debatem-se com falta de financiamento para pôr Carnaval na rua
Embora as atenções do Carnaval de São Nicolau estejam voltadas para a Ribeira Brava, no Tarrafal os grupos oficiais também lutam para trazer a folia para as ruas. São os casos do Amigos da Natureza e do Bela Vista.
Djamilo Cruz, presidente do grupo Amigos da Natureza, garante que, apesar dos constrangimentos, há determinação para fazer acontecer a festa de Entrudo no município. “Está a ser difícil, mas não desistimos, vamos em frente”, afirma. 
O tema é “Renascer dos sonhos” e espelha o espírito de esperança. “Em termos de carro alegórico estamos um pouco atrasados, sem dúvidas, mas nada que nos impeça de continuar o nosso trabalho e sair no primeiro dia previsto, que é sábado,22. Estamos a lutar para isso”.
Os constrangimentos, diz são muitos, a começar pelos financiamentos. “O nosso principal parceiro é a Câmara Municipal e este ano as coisas estão um bocado difíceis, pois o nosso orçamento ronda os 300 mil escudos e até agora temos uma tranche da Câmara Municipal no valor de 67 mil e 500 escudos. Não temos mais parceiros e estamos a correr contra o tempo”, explica.
Este ano o grupo não vai conseguir trazer para a rua o mesmo número de foliões das  edições anteriores. “Muitas vezes conseguimos trazer 150 a 200 pessoas, mas este ano ainda não tenho previsão. Além disso, houve uma desinformação muito forte de que os Amigos da Natureza não iam sair à rua. Muita gente, que era nossa, foi para o outro lado. Conseguimos recuperar alguns, mas não todos”. 
Para desenvolver o Carnaval no Tarrafal Djamilo Cruz defende que é preciso mais incentivos, financiamentos e o “acreditar das pessoas que têm a rédea do município e de Cabo Verde. “Não é possível que na cidade da Praia um jardim infantil consiga ter um incentivo da Câmara de 100 mil escudos e um grupo oficial aqui, no Tarrafal, tenha 67 mil e 500 escudos, não é justo. E os fazedores de Carnaval estão a desistir, de ano para ano, por causa disto”, lamenta.
Também o financiamento escasso é o maior problema do grupo de animação Bela Vista, que sai à rua com o tema  “Civilizações Antigas”. “Fizemos alguns eventos e iniciativas para arrecadar dinheiro mas não tivemos muito lucro. E,  a nível de patrocinadores, há falta de pessoas para patrocinarem o Carnaval”, explica Dulcineida Soares, presidente do grupo. 
Bela Vista recebeu 67 mil e 500 escudos da Câmara Municipal, uma verba, diz, insuficiente. “Para se desenvolver mais o Carnaval é preciso haver mais visão das pessoas em termos de organização e mobilização de gente e mais patrocinadores”, conclui.  
 
Emigrantes por si só não enchem unidades hoteleiras
Geralmente são muitos os emigrantes que vêm passar o Carnaval à Ribeira Brava, uma altura do ano aguardada com muita expectativa pelos operadores turísticos. Fernando Santos, empresário e proprietário da pousada Bela Sombra, é um dos que está expectantes sobretudo em relação à taxa de ocupação hoteleira. 
“Para dizer a verdade, à semelhança de muitos anos, registamos muitas reservas no período de Carnaval mas o que acontece é que, muitas das vezes, nós acabamos por ficar prejudicados porque as pessoas fazem as reservas e depois não aparecem e nem dizem nada. Nós confiamos na boa fé das pessoas, aceitamos as reservas e como já temos o pré-compromisso assumido, acabamos por ficar com quartos sem ocupação”. 
Este ano, houve uma mudança de estratégia para evitar estes constrangimentos. “Estamos a utilizar um prática diferente. Até esta altura as pessoas que não confirmaram as suas pré-reservas, temos estado a cancelar”. 
Aquilo que era uma agenda cheia, passou para disponibilidade ainda de quartos. “Posso dizer que tínhamos de facto uma agenda de reserva praticamente cumprida, mas com os cancelamentos passamos a ter disponibilidade de aceitar novas reservas. Pelo que estamos praticamente a 50%, com o cancelamento das pré-reservas que não foram confirmadas”. 
Fernando Santos alerta que às vezes as pessoas enganam-se com o volume de movimentação de pessoas nas estruturas hoteleiras da ilha devido ao Carnaval. É que, como explica, a maioria são imigrantes que se hospedam em casa de familiares. “Porque no que tange ao turista, ainda pouco se pode falar disto para a ilha São Nicolau”. 
Da hotelaria para as viagens, Iolanda Soares, da Zebra Travel, fala de constrangimentos nos voos internos, sobretudo de pessoas de outras ilhas, que não conseguiram voo para passar o Carnaval em São Nicolau, pese embora a Binter ter feito um reforço de dois voos suplementares. 
Em termos de viagens, Iolanda Santos realça o facto de se ter registado a ligação de dois barcos esta semana, mais um de São Vicente que irá chegar.
GC
(Publicado no A NAÇÃO impresso, nº 651, de 20 de Fevereiro de 2020)

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