PUB

Opinião

“Dimundu” e as suas grandes aventuras

Por: Nataniel Vicente  Barbosa e Silva 

Vamos conhecer quem é Dimundo” e a sua historia. Literalmente podemos traduzir “Dimundo” por “Do Mundo”. Porque do Mundo? Tão simples quanto isso. Gaudêncio de Pina, seu nome de baptismo, efectivamente foi e continua a ser um homem do mundo, ou se preferir: Um homem do povo. Simples, descomplexado, afável, dialogante, pacifico, brincalhão, voz timbrada. Não canta, não toca e nem dança, mas, encanta a todos com a sua simpatia e a sua boa disposição de trabalhar. Auto-intitula-se “doutor” dos utensílios de cozinha afectados com alguns problemas no funcionamento. “Profissionalizou” na reparação de fogão à gás, capim, fogão-prima, que hoje já caiu em desuso, etc. etc.

Gaudêncio de Pina, conhecido popularmente por “Dimundo” ou “Txadinha” por amigos mais próximos. “Txadinha” esse estranho epíteto resultou na sequência de uma desavença com uma ex-companheira, há bom pares de anos, em Ponta Verde, cuja história reservámos para mais à frente neste trabalho.

Nascido no seio de uma humilde família: José Paulo de Pina e de Jesuina Mendes. Último  filho no grupo dos 5, e todos já falecidos. Passou toda a sua infância e adolescência em Ponta Verde da freguesia de São Miguel lugar onde nascera a 25 de Abril de 1937. Não frequentou os banquinhos da escola mas, muito cedo conheceu o mundo do trabalho e tão cedo também se lançou no mundo de aventuras. 

                   

Aventura para Angola
Em 1957, na casa dos 20 anos de idade aventura-se para Angola como contratado à procura de uma vida melhor. Chega a Angola e instala-se em Lobito com os respectivos alojamentos. Trabalha numa fábrica de açúcar até ao seu regresso a Cabo Verde em 1964. 

 

Aventura para a ilha do Príncipe
Em 1966, inconformado com a situação em Cabo Verde, na perspectiva de encontrar um novo horizonte embarca para a ilha do Príncipe como contratado. Ali, permanece por 3 anos conforme o estipulado no contrato. Volta à terra de origem no ano de 1969 e pára uns escassos 2 anos.

 

Nova aventura
Em 1971, ruma-se para o mesmo arquipélago mas, o Destino desta feita, traçara a ilha São Tome e instala-se na Roça São Luís, com um contrato assinado de novo por 3 anos.

                         

De São Tome para Portugal
Ver para crer. Decorria o histórico ano de 1974, o “Ano da Revolução Portuguesa” viaja então de São Tome para Portugal. Viu, acreditou e testemunhou que em Portugal não corre realmente leite e mel como muitos imaginam e, como ele próprio provavelmente imaginava, tanto é certo não demorou por aí mais que uns três meses devido a falta de trabalho e outras situações, nomeadamente: clima, língua, ambiente etc.

 

Regresso à terra-natal.
Chega à Cabo Verde nos meados de 1974/75, quase na altura da independência. Escasseavam os trabalhos, mas, conseguiu sobreviver graças à sua arte que aprendera com um português numa oficina mecânica em Angola.

Para não viver só viu-se por necessidade ter uma companheira. Companheira essa que viria lhe causar muitas  dores de cabeça. Este romance terminou de forma abrupta e anedótica, conta assim: “nu fazi nos kaza djuntadu, kariz pa kubriba  kaza era di si lugar, as tantas nu bira go, ka ta fila dentu kaza, diskutison ta bai diskutison ta ben. Meza rapartidu, kama rapartidu. Di kaza e fla e ka ta sai. E ba kexa di mi na postu pulisia ma N sta kori kol di kaza, pulisia flal: Nha dal “txadinha” e ta dexa nha na kaza, e rispondi: “txadinha” N ka ta dal. Pulisia torna flal: Si nha ka sta dal “txadinha” nha ki ta sai”.

Com esta imposição da polícia optou-se ela por abandonar o lar. Desta sorte, o “Dimundu” ganhou a razão e, ganhou a então popularizada alcunha de “TXADINHA”. Enfim, um romance com um final feliz. Coisas da vida! Afora isto, garante que nunca teve implicações com ninguém mesmo nos momentos mais conturbados da sua vida quando esteve fora da sua terra. Realça: “;Mi Nta rispeta tudu algen i tudu algen ta rispetan.” 

“Txadinha” como era ainda um homem novo e cheio de vigor arranjou uma nova companheira com quem acabou por se casar há poucos anos e que lhe “brindou” uma prole de 6 filhos: 3 rapazes e 3 raparigas. Hoje, é avô de alguns netos.

Nas vésperas de completar os 83 anos, ainda se mantém em plena forma. Sai todos os dias de casa de manha de bolsa às costas de apito à boca saltando ribeiras e cutelos, vila à cidade à “chercher” de “doentes inactivos” (fogões danificados) como ele ironiza, na sua maneira de peculiar de falar. Deste modo o pão para a família nunca lhe tem faltado à mesa.

Para terminar, o “Dimundu” anda inconformado com os jovens de agora. Queixa-se da falta de respeito como estes se relacionam com os mais velhos. Que os filhos já não respeitam os próprios pais. Salienta: Bu ta odja bu fidju ta mora ku bo dentu kaza e ta sai, pur izenplu, e ta ba Praia di sedu e ka ta djobeu ma ki bu manxi. Si da kazu ki bu mori di noti el e ka sabi. Na Praia, e ta fladu ma bu mori, afinal, bo bu mori ku el na kaza e ka da konta pamodi el e labanta e ka djobeu ma ki bu manxi”. Uma realidade nua e crua. Uma chamada de atenção aos que se comportam eventualmente dessa maneira. 

Outra coisa que deixa o “Dimundu” desapontado é a forma como alguns jovens hoje se cumprimentam aos colegas. Realça: “ez ta conprimenta kunpanherus ku mo fitxadu ku soku: txapu txapu. Keli e idukason?” Pergunta. Enfim, c,est la vie! Coisas da modernidade que “Dimundu” não consegue compreender.

Hasta lá próxima.

 Tarrafal, 20 de Março de 2020

PUB

PUB

PUB

To Top