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Colunistas

Tempo de meio silêncio 

Por: Filinto Elísio

O racista no voo da Ryanair 

A Ryanair, companhia aérea que tem sido acusada de intimidar os seus trabalhadores e que já obriga passageiros a pagarem a bagagem de mão, pode ser acusada de má prática em lidar com o racismo. O caso parece caricato, mas é grave, mercê de um vídeo que se tornou viral e não deixou margens para dúvidas: os racistas também viajam de avião e podem estar ao nosso lado. No caso, um energúmeno insistia, esbracejando aos gritos, que uma mulher, já idosa e sentada a seu lado, teria de mudar de lugar por ser “negra e feia”. Diante do ridículo impasse,  um membro da tripulação tentou acalmar os ânimos, escolhendo a solução não menos racista de fazer mudar a mulher de lugar, o que revoltou os demais passageiros e colocou a companhia Ryanair como cúmplice do ato. A atitude correta era o tripulante chamar as autoridades e fazer o racista abandonar o avião. Se possível, com um ‘pé na bunda’ e um processo-crime.

O jornalismo e o “esquadrão da morte”

O jornalista saudita Jamal Khashoggi, apontado como uma das vozes mais críticas do regime do seu país, foi torturado, assassinado e depois desmembrado no interior do consulado em Istambul da Arábia Saudita e é uma gritante vergonha que, por causa do petróleo e do dinheiro que dele advém, uma parte do mundo fique calado e conivente com tamanha selvajaria. Os requintes de malvadez descrevem que o cadáver terá sido “cortado em 15 pedaços” por um médico legista que fazia parte do comando de 15 agentes. Há evidência de que, após o assassinato do jornalista, um dos membros desse “esquadrão da morte”, telefonou várias vezes ao chefe de gabinete do príncipe herdeiro saudita, Bader Al-Asaker.

Democracia da lei no lombo

Um projeto político antidemocrático tem vindo a parasitar a democracia brasileira para ganhar eleições no Brasil. O que nos parece uma antítese e um absurdo não é tão inédito assim. Em 1932, o partido nacional-socialista ganhava as eleições na Alemanha e, no ano seguinte, pôs-se a instalar o regime nazi, sabendo todos a tragédia seguinte. Pressente-se, pelo discurso e pela prática, que uma parte significativa do povo brasileiro avaliza o preconceito, a perseguição, a violência e a exclusão, ficando o mundo a assistir, horrorizado, mas incapaz de impedir, o avanço dessa guinada. Não vão ser tempos fáceis para os negros e os índios, para os pobres e os imigrantes, para os gays e as lésbicas, para os artistas e os criadores, para os intelectuais e os progressistas, para os ativistas e os sindicalistas. “Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão pra fora ou vão pra cadeia”, disse o candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro. Este projeto político antidemocrático, ao invés de promover um golpe militar, como o de 1964, desta feita legitimar-se-á nas urnas. É mais trágico…

E agora, José?

Termino com estes versos, de vez em quando atuais, de Carlos Drummond de Andrade:

(…)

É tempo de meio silêncio,

de boca gelada e murmúrio,

palavra indireta, aviso

na esquina. Tempo de cinco sentidos

num só. O espião janta conosco.

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