PUB

Política

Cai o pano no Parlamento: “Parcialidade” de Jorge Santos marca IX legislatura

Cai o pano, esta semana, na IX Legislatura da Assembleia Nacional, fortemente marcada pela pandemia da covid-19. A maioria do MpD conseguiu fazer passar toadas as propostas de lei que exigiam uma maioria simples, mas não conseguiu aprovar a Lei da Regionalização e o Estatuto Especial para Praia, que requeriam uma maioria reforçada de dois terços. A legislatura também ficou marcada pela “parcialidade” de Jorge Santos na condução das sessões plenárias.

Esta IX legislatura, que já está no fim e que ontem ficou marcado pelo debate sobre o balanço da governação do MpD e de Ulisses Correia e Silva, já faz parte da história, com os seus altos e baixos.

Ela arrancou praticamente como uma situação controversa e que acabaria por levar o Tribunal Constitucional a produzir um acórdão condenando o Presidente da AN, Jorge Santos, por violação dos princípios da constitucionalidade e da separação e interdependência de poderes previstos na Constituição da República, ao presidir a sessão plenária que aprovou o Orçamento do Estado de 2017 estando, também, na qualidade de Presidente da República interino.

“Parcialidade” de Jorge Santos

Jorge Santos foi, de resto, um PAN controverso e contestado, sobretudo, pela oposição que em vários momentos duvidou da forma, alegadamente, parcial como dirigiu as plenárias da AN.

O PAN também foi acusado de participar na estratégia do MpD, partido no poder e ao qual pertence Santos, para a destruição da imagem da líder do PAICV, Janira Hoppfer Almada, “para comprometer a concorrência política, normal em democracia, e para fragilizar a oposição democrática”.

Na reação, a líder parlamentar do Movimento para a Democracia (MpD), Joana Rosa, acusou o PAICV de querer “afundar o Parlamento e acabar com o presidente da Assembleia Nacional”.

Estatuto especial para Praia

O chumbo do Estatuto Administrativo Especial para a cidade da Praia também foi um dos aspectos marcantes desta IX Legislatura. Essa proposta de lei, que não reunia consensos no interior dos sujeitos parlamentares, não obteve votos suficientes para a sua aprovação, na primeira plenária de Julho de 2020.

O diploma, que carecia de uma maioria qualificada de dois terços para a sua aprovação, contou com 39 votos a favor, seis votos contra e 21 abstenções. Dos votos a favor, 35 foram da bancada do MpD e quatro do PAICV (Felisberto Vieira, Júlio Correia, José Sanches e José Gomes da Veiga).

Os três deputados da UCID, que votaram contra, foram acompanhados pelos deputados do PAICV João do Carmo, Filomena Martins e Carlos Delgado. A deputada do MpD Mirceia Delgado também votou contra, criando quase que uma crise na sua bancada e partido.

Dos 72 deputados em efetividade de funções, apenas 66 participaram na votação do diploma, que, neste caso, precisava de 44 votos favoráveis para a sua aprovação.

Regionalização

Depois de ter sido aprovada, na generalidade, na sessão de Outubro de 2018, a lei sobre a regionalização foi retirada da agenda em Março de 2019, depois do pedido de cancelamento da votação, na especialidade, feito pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Fernando Elísio Freire.

O pedido de retirada do diploma surgiu na sequência do chumbo dos artigos 6º e 7º desse diploma e as alterações que tinham sido propostas pelo MpD em consenso com a UCID. E, como isso, ficou adiada a discussão e a votação da legislação que deveria criar as 10 regiões administrativas de Cabo Verde.

“Cancelamos porque o PAICV posicionou-se claramente contra as ilhas, contra o aprofundamento do poder local e contra criarmos oportunidades de criação de riqueza, inclusão social e emprego nas ilhas”, afirmava o ministro.

A UCID, por seu lado, considerou que o Governo errou ao cancelar a proposta. António Monteiro afirmou, na altura, que o “cancelamento não foi a melhor solução” uma vez que, como acrescentou, “tratando-se de um instrumento importante para o desenvolvimento do país e um certo equilíbrio entre as ilhas, os sujeitos parlamentares deveriam ter um pouco mais de tranquilidade e discutir as questões fracturantes até ao fim e dar ao país uma proposta que pudesse servir”.

O cancelamento da proposta acabou por não surpreender o PAICV “de modo algum”. “Eu creio que foi a opção mais inteligente”, afirmava João Baptista Pereira.

“Não fazia sentido continuarmos a discutir os artigos até ao final. Nós queríamos ver qual iria ser a criatividade do Governo para continuar esta discussão uma vez que os artigos estavam a ser reprovados”, reforçou.

Pandemia da covid-19

Face à pandemia da covid-19, o Parlamento foi obrigado a adoptar um plano de contingência, que obrigou uma boa parte dos deputados a participar nas sessões através das plataformas digitais. Dos 72 deputados, apenas foi permitida a presença de 42 parlamentares na sala de sessões.

No dia 27 de Março de 2020, a comissão permanente da AN aprovava, pela primeira vez, o pedido do Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, para declaração do estado de emergência no país, devido à pandemia de covid-19.

E no dia 15 de Maio do mesmo ano, o Parlamento aprovava, por unanimidade, o pedido do PR para um quarto de período de estado de emergência, de 15 dias, apenas na ilha de Santiago devido à propagação da covid-19 na Praia.

CPI’s não deram em nada

Nesta IX Legislatura, que ora termina, foram constituídas várias Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) para, entre outras, investigar actos de gestão na TACV, no Novo Banco, e em relação à construção das barragens. 

Em relação à TACV, o MpD considerou que o referido inquérito era uma “grande iniciativa”, porquanto havia claros indícios de má gestão de dinheiro público.

Mas o PAICV considerou que essa CPI, aprovada pela maioria do MpD, tinha por propósito desviar as atenções sobre o negócio – “pouco transparente na óptica do partido” – feito pelo executivo “ventoinha” com a Binter, transportadora privada originária das Canárias que agora detém o monopólio das ligações áreas inter-ilhas.

Em relação ao Novo Banco, a CPI concluiu que a criação dessa instituição financeira foi uma decisão política do anterior Governo e desviou-se do objeto social.

Já a CPI sobre as barragens, criada a pedido do MpD, visava, entre outros, averiguar a responsabilidade do Governo durante todo o ciclo do processo da construção dessas infra-estruturas hidráulicas, isto é, desde a montagem da engenharia financeira até ao processo de entrega e aceitação da obra.

Como sempre, feito o barulho do costume, das conclusões das referidas CPI pouco ou nada transpirou, cumprindo-se assim a tradição no Centro do poder político em Cabo Verde.

Facto inédito, esta IX Legislatura também ficou marcada, negativamente, pelas cenas de pugilato entre os deputados Emanuel Barbosa (MpD) e Moisés Borges (PAICV).

(Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 708, de 25 de Março de 2021)

PUB

PUB

PUB

To Top