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Diáspora

Câmara de Comércio Checo-Cabo Verde: O desafio de trazer mais de 90 mil turistas anuais

Mónica Sofia Duarte, empresária, modelo e estilista, natural de Santa Cruz, ilha de Santiago, há quase 10 anos a “lutar” por Cabo Verde na República Checa, quer promover o “turismo inclusivo” entre os dois países, enquanto vice-presidente da Câmara de Comércio Checo-Cabo-verdiana, tendo como meta 90 mil turistas/ano. Na formação de quadros lamenta que as autoridades cabo-verdianas não tenham sabido aproveitar as oportunidades para enviar mais jovens formarem-se nas universidades checas.

Considerando o lugar que o turismo ocupa na economia cabo-verdiana, Mónica Sofia Duarte pretende impulsionar o sector entre o seu país de origem e aquele que a acolhe desde 2013. Como afirma, ao A NAÇÃO, desde a sua chegada à República Checa, enquanto estudante, que tenta promover o país natal entre os checos e não só. É claro que no princípio não foi fácil, mas hoje tem inúmeras portas que se abrem quando se apresenta como originária de Cabo Verde à procura de “oportunidades” para os dois países.

E é assim que, com a criação da Câmara de Comércio Checo-Cabo-verdiana, da qual é vice-presidente, se diz agora focada em promover relações bilaterais através da diplomacia económica, do turismo, da educação e do sector da energia.

 “No dia 5 de Fevereiro do ano passado saiu da República Checa para Cabo Verde o primeiro voo com destino à ilha do Sal e desde então os voos permaneceram todas as semanas até ainda. Iniciamos também voos para a ilha da Boa Vista no verão do mesmo ano. Conseguimos motivar os polacos, que antes não viajavam para Cabo Verde a fazê-lo, fizemos o mesmo com a Hungria”, indica a entrevistada do A NAÇÃO, apontando que a previsão para este e o proximo ano é de trazer mais de 90 mil turistas anuais daqueles países da Europa Central.

“Antes de 2013, os checos não conheciam Cabo Verde. No entanto, em 2019, portanto, antes da pandemia, tivemos mais de 20 mil checos e eslovacos a visitar-nos. Ou seja, passamos de um turismo zero para um turismo de 20 mil, se não fosse a covid-19, teríamos muito mais turistas”.

Cabo Verde “existe” hoje na Checa

Diante dos números, Mónica Sofia não tem dúvidas quando afirma que “hoje Cabo Verde existe na República Checa”, pelo que o projecto “turismo com o rosto de Cabo Verde”, da Câmara de Comércio Checo-Cabo-verdiana, deve continuar para novas conquistas. Nomeadamente para que esse país europeu passe a receber mais cabo-verdianos, e também na possibilidade de se abrir, em Praga, uma embaixada cabo-verdiana, além de trazer mais investidores.

 “Neste momento há mais de 15 empresas checas a investirem em Cabo Verde, nas áreas de imobiliária, água e energia, saúde e outras. Este número deve aumentar ainda mais com o turismo”, prevê a presidente da Câmara de Comércio Checo-Cabo-Verdiano, revelando que em Julho está prevista a realização da primeira feira tecnológica da República Checa em Cabo Verde.

“Tudo isto veio com o turismo, porque sem esta área não existiria a economia, o desenvolvimento, a imigração ou relação entre Estados entre outras, uma vez que o turismo é a base de tudo e a prova disso foi a situação que enfrentamos com a pandemia em que sem o turismo, praticamente tudo parou”, conclui.

“Turismo Rosto de Cabo Verde”, um projecto inclusivo que abarca outras ilhas, além do Sal e Boa Vista

“Turismo Rosto de Cabo Verde”, projecto que a Câmara de Comércio Checo-Cabo-verdiana, visa promover este arquipélago, no seu todo, e não apenas Sal e Boa Vista, duas das nossas mais conhecidas ilhas na República Checa, conforme Mónica Sofia Duarte.

“As pessoas da República Checa só conheciam as ilhas do Sal e da Boa Vista, isto graças a um novo projecto, que envolveu a Katerina (Cestuji Za Kacku), uma promotora do turismo na República Checa, que possui mais de 11 mil seguidores nas redes sociais, que viajou para Cabo Verde, onde esteve em todas as ilhas. A sua visita foi um sucesso porque, apesar de dar a conhecer as outras ilhas, esgotou os lugares nos aviões para o Sal e a Boa Vista”, conta Mónica Sofia, para quem outras operadoras deverão também operar para Cabo Verde aumentando a concorrência no mercado.   

Como adianta também, esforços estão sendo feitos para que haja voos Praga-Praia-Praga, o que, a acontecer, será muito bom para Santiago, tendo em conta o seu objectivo principal, fazer com que as pessoas conheçam outras ilhas. “Temos bares e restaurantes e lugares lindos, em Cabo Verde, que as pessoas não conhecem porque a maioria dos turistas ficam nos hotéis”. 

Além disso, “hoje, temos mais checos a residirem em Cabo Verde, principalmente nas ilhas do Sal e da Boa Vista, do que cabo-verdianos na República Checa. Daí o nosso objectivo de, junto com a Câmara de Comércio, promover e fomentar este número de cabo-verdianos tanto imigrantes como estudantes na República Checa”, explica a jovem considerada “o rosto” de Cabo Verde nesse país da Europa Central.

Governo “ignorou” uma “oportunidade de ouro” para estudantes

Dos esforços que tem feito na República Checa para abrir as portas de Cabo Verde, Mónica Sofia Duarte diz que, infelizmente, nem todos são devidamente valorizados por quem devia. Aponta como exemplo a possibilidade de jovens cabo-verdianos poderem formar-se naquele país europeu cujas universidades constam da lista das mais prestigiadas da Europa e do mundo.

“Aqui, estuda-se até os 26 anos sem pagar nada. Tive uma oportunidade de ouro, que me ofereceram na Fundação Nadje Cabo Verde, para trazer com bolsa para estudantes cabo-verdianos. Fui pessoalmente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, até ao Ministério da Educação, na Praia, escrevi e-mails para ministros, mas não tive sucesso e fui muito ignorada”, lamenta.

“Tive que pedir desculpas a universidades, aqui, que estavam dispostas a receber jovens cabo-verdianos e que nunca chegaram. Vieram alunos da Guiné-Bissau e outros países, isto porque o meu país não mostrou interesse e eu sozinha, sem o envolvimento do Estado, não podia fazer nada”, acrescenta.

Tendo em conta o sucedido, Mónica Sofia conta que no dia em que um estudante cabo-verdiano quiser estudar na República Checa será difícil.

“Caso os estudantes cabo-verdianos quiserem estudar na República Checa terão que pedir visto primeiramente para Portugal e, a partir dali, pedir um novo visto para República Checa”. Ou seja, “terão que vir da mesma forma que eu vim. Queria que isso acabasse e que um filho de coitado tivesse a mesma oportunidade, mas infelizmente não foi possível por falta de vontade do nosso Governo”, lamentou a entrevistada do A NAÇÃO, que diz esperar uma mudança de atitude das autoridades do seu país natal, na esperança de que novas oportunidades acabarão por surgir para os estudantes de licenciatura ou mestrado. 

Ousadia de Mónica Sofia na República Checa

Os benefícios que a Mónica Sofia Duarte consegue para Cabo Verde na República Checa foi graças à sua ousadia de criar nos primeiros anos da sua estadia como estudante, modelo e estilista, a Fundação Nadeje a Cabo Verde. “Não foi fácil”, afirma.

“Foi com muitos insucessos, muitas lágrimas, muitos ‘não é possível’, com poucos meios financeiros. Mas, com uma força de vontade de mudar Cabo Verde para melhor, tão forte que ultrapassou e ultrapassa todas as dificuldades que enfrentei e que sei que irei enfrentar. Pois o caminho correcto está cheio de curvas”, acrescenta.

Hoje a Naděje Cabo Verde, com sede em Santa Cruz, ilha de Santiago, emprega quatro pessoas, responde por vários projectos, alguns concluídos com sucesso e outros em andamento. Um desses projectos é o “Casa dos Sonhos”, para a reabilitação de cinco habitações, das famílias mais carenciadas em todos os municípios do país. 

O projecto, com duração de dois anos para a primeira fase, já está em curso no concelho de São Miguel, ilha de Santiago, pelo que a primeira das cinco habitações foi inaugurada e entregue no passado dia 9 de Maio, em Flamengos.

Estar à frente de tantos projectos sociais, para além da sua carreira de empresária, modelo e estilista, criadora da marca de calçados e joias “Mónica Sofia”, é, para esta cabo-verdiana, uma tarefa difícil, mas não impossível.

“Nós, cabo-verdianos, independentemente do lugar onde estamos, temos sempre Cabo Verde no coração, por isso tentamos sempre fazer alguma coisa pelo nosso país. Por isso, estou nesta caminhada de fazer Cabo Verde ser grande na República Checa, tendo em conta que, por aqui, os nossos ‘dez grãozinhos de terra’ eram como se não existissem porque ninguém ouvia falar e, hoje, estamos cada vez mais presente na Europa Oriental, o que me deixa muito feliz, porque, apesar da caminhada difícil que foi, estou cada vez mais perto de conseguir deixar aqui uma marca, e um bom rosto de Cabo Verde”, contou a jovem modelo, empresária, estilista, muito sonhadora e ousada que, aos 10 anos, decidiu viajar de Santa Cruz à Praia, para visitar Pedro Pires, na altura, presidente da República.

Nas suas “multifunções”, entre liderar a fundação, cuidar da carreira, das lojas e manejar mais 63 empresas, entre República Checa e Cabo Verde, Mónica Sofia Duarte diz que, neste momento, o objectivo é focar da Câmara de Comércio e ajudar o seu país-natal, sobretudo jovens, e abrir empresas checas, para mais empregos, fora outros projectos, nomeadamente, a feira de tecnologia prevista para Julho e o “Hospital Nadje”, parte do projecto “Casa dos sonhos”, em vias de concluir. 

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 768, de 19 de Maio de 2022

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