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Fundo Soberano: Instrumento estruturante e inédito para o futuro de Cabo Verde

Por: João Carlos Fidalgo*

Cabo Verde, considerado inviável em 1975, aquando da sua independência, devido à sua insularidade e, principalmente, à falta de recursos naturais, económicos e financeiros e que foi subscrita por Henry Kissinger, um dos reputados teóricos da política externa norte-americana no período compreendido entre 1968-1976, por causa da sua dimensão de Micro Estado, de um PIB per capta inferior a 300 dólares e de cerca de 270 mil habitantes constataram que dificilmente teria as condições criadas para se tornar independente. 

Com o reconhecimento como um país de rendimento médio, PIB per capita de três mil dólares americanos, uma população superior a 500 mil habitantes e com um PIB per capita que apresenta a evolução no período de 2012 a 2020 seguinte:

Hoje um pequeno arquipélago, sem recursos naturais, seco, em processo de desertificação, um dos mais carentes do mundo em água “vencemos a seca, vencemos a fome e já não somos os ‘flagelados do vento leste’ como dizia o poeta e ensaísta Manuel Lopes no seu romance em 1960 e como dizia José Maria Neves no seu livro Gestão de Impossibilidades: “Hoje somos uma nação possível e estamos a construir novas possibilidades”.

Com a graduação a país de rendimento, em 01 de janeiro de 2008, e decidida em 2014 pelas Nações Unidas. Apesar dos desafios da insularidade, fragmentação do território com problemas de conetividade, dificuldades para fornecimento de serviços, incluindo energia, agua, educação e cuidados de saúde, Cabo Verde assistiu um progresso notável, suportado pelo turismo que representa 25% do PIB.

Efetivamente, a valorização da sua localização geoestratégica, do ponto de vista económico e de segurança, a estabilidade politica, social e qualidade dos seus recursos são contributos necessários para no horizonte da economia sustentável 2030, no qual o modelo de financiamento desperta novos desafios num país com elevada dívida pública.

Todavia, Cabo Vede deixou de ter acesso a muitos fundos da cooperação internacional.

1. Fundo Soberano é um instrumento Estruturante e Inédito

O Fundo Soberano é um instrumento estruturante e, seguramente, uma das principais facilidades à disposição das empresas cabo-verdianas apostadas na internacionalização e, nesta perspetiva, é o seu maior instrumento financeiro, como instituição de garantia, com capacidade para apoiar as empresas nacionais nos seus esforços de penetração e desenvolvimento em novos mercados.

Como sabem o Fundo Soberano tem o propósito de criar uma solução inovadora capaz atuar como pedra mestra do sistema financeiro cabo-verdiano. Foi criado pela Lei nº65/IX /2019 de 14 de agosto e que sofreu alterações pela Lei nº 111/IX/2021 de 8 de janeiro. Com  capital social inicial de € 100.000.000 (cem milhões de euros) dos quais 90.000.000 (noventa milhões de euros) realizados de imediato pelo Estado por afetação de recursos do International Support for Cape Verde Trust Fund, criado pela Lei no 69/V98, de 17 de Agosto, publicada no BO-Boletim Oficial I Série – no 31, de 24 de Agosto, aprovado pelo parlamento com votos da maioria dos deputados efetivamente em funções.

Conforme o relatório do Banco de Portugal era visto “como uma operação inédita, uma vez que permitiria a eliminação, em termos macroeconómicos controlados, da dívida pública interna o que, por via da anulação dos encargos com juros, constitui condição indispensável para controlo e redução do défice orçamental”. O Fundo (CV Trust Fund) tinha sido criado em 1998, por iniciativa do governo, foi extinto tendo rendido 6,9 milhões de contos. A gestão foi confiada ao Banco de Portugal a 31 de dezembro de 1998, gerou uma taxa de rendibilidade acumulada de 3.08%.

À luz da experiência internacional, e segundo o International Working Group of Sovereign Wealth Funds  (IWG), a principal fonte financeira para os Fundos Soberanos, é a venda de recursos minerais e os royalties diretamente ligados à atividade de exploração da venda de recursos minerais e petróleo. Existe uma parcela de recursos oriundas de superávits em conta-corrente, designadamente, dos países asiáticos, que experimentaram na década de 1990 um incremento no fluxo financeiro e comercial.

Em termos de Regulação e Supervisão Internacional, em prol da manutenção de práticas financeiras saudáveis em um sistema financeiro liberalizado, os países do G7 demandaram ao FMI e à OCDE uma abordagem coletiva que pudesse chegar a um entendimento comum a respeito de uma regulamentação que minimizasse tais conflitos.

O FMI promoveu a formação do Grupo de Trabalho dos Fundos Soberanos de Investimento, reunindo os maiores FSI do mundo para debater como deveriam ser administrados e estruturados os seus investimentos e o modelo de supervisão. A situação que mereceu atenção no âmbito dos Princípios de Santiago, com a definição de boas práticas de governação e transparência, em outubro de 2008, numa reunião em Santiago, no Chile, selou um acordo em torno de 24 princípios.

Ora Cabo Verde desde 1975, aquando da sua independência, Cabo Verde terá sido considerado um país inviável devido à sua insularidade e, principalmente, à falta de

recursos naturais, de recursos minerais, petróleo, económicos e financeiros, passou a ser considerado um pais confiável e credível.

Como cantava Cesária Évora:

“ Dêss povo franco sem igualLi nó ca tem riqueza

Nô ca tem ôro nô ca tem diamante

Ma nó tem ess paz di Deus”

O capital humano, a criatividade, a liderança, a atitude, o paragramatismo, a resiliência e a vontade de fazer as coisas acontecerem, mudaram o paradigma é a necessidade para encontrar as saídas e as soluções para república. Não podemos querer que as coisas mudem, se sempre fazemos os mesmos (A. Einstein).

2. Regulação e Supervisão do Fundo Soberano

Após eclodir da crise financeira 2008 e crise da dívida soberana, várias discussões a níveis internacionais têm sido desenvolvidos estudos a volta de Modelos de Supervisão: Monista, Dualista (twins peaks), tripartido ou híbrido, ao nível de Comité de Basileia(BIS), de International Association of Insurance Supervisors (IAIS) e a International Organization of Securities Commissions (IOSCO).

Nenhum modelo de supervisão financeira assegura em absoluto a estabilidade do sistema financeiro e impede a eclosão de crises localizadas de determinadas instituições financeiras. Nos últimos anos registaram-se desafios e melhorais contínuas na arquitetura de supervisão e mudança de paradigma para supervisão baseado no risco.

Existem matérias que são transversais, apesar de cada entidade poder agir dentro das suas competências, com autonomia e independência, mas a supervisão sairá reforçada ao nível prudencial (micro e macro), ao nível comportamental e na vertente de partilha de informação e coordenação entre as autoridades bancarias e de mercados de capitais, nos diferentes comités de riscos.

O Fundo Soberano Privado de Garantia não se enquadra no elenco das entidades sujeitas às regulação e supervisão do Banco de Cabo Verde, constante na lista do artigo 12° da lei de bases do sistema financeiro. Neste momento a lei de base do sistema financeiro não atribui a competência de fiscalização desse fundo ao Banco de Cabo Verde (BCV), salientando também que há que se ter em conta a situação internacional, onde a fiscalização dos fundos soberanos internacionais compete à administração pública e por vezes atribuindo aos Bancos Centrais a delegação de competências para gestão operacional de fundo, pagando taxas , a semelhança da proposta em face de implementação em Moçambique.

Portanto, o Presidente da República promulgou bem a alteração da Lei que a supervisão de Fundo Soberano na AGMVM, depois de um veto Política. Quanto a supervisão de seguros, em 1978, após a independência, através do decreto-lei n.º 39/78 de 2 de maio, criou-se o Instituto de Seguros e Previdência Social – ISPS, cuja finalidade era assegurar o exercício das atividades de Seguros e Previdência Social. Assim, o exercício da atividade seguradora e resseguradora passou a ser exclusiva do Estado com apenas uma instituição de capitais exclusivamente públicos.

Na década de noventa foi traçada de momentos decisivos, com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), e  procedeu-se à reforma do quadro institucional da actividade seguradora criando-se assim condições para a emergência de companhias de seguros privadas.

Em 1996, foi o Decreto-Lei nº 52/96, de 26 de dezembro que extinguiu o Instituto de Seguros de Cabo Verde, passando todas as funções e  as atribuições daquele organismo para o Banco de Cabo Verde. Por permissão para um diploma legal revogado de algumas das atribuições e competências que ora cabem ao Banco de Cabo Verde, foram feitas adaptações e reformas das competências da autoridade de supervisão da atividade seguradora, quer face ao novo quadro legal que progressivamente se está a implantar em Cabo Verde, quer para dar resposta as novas realidades que se projetam, em especial os fundos de pensões e as suas entidades gestoras.

Num mundo complexo e exigente, o  que importa ao nível de recursos, sendo recursos, escassos e limitados, a condição necessária é ter recursos humanos adequados e geridos com eficácia e eficiência para atingir resultados. O próprio Banco de Cabo Verde acumulou novos desafios para exercer determinadas funções, com capitais próprios negativos.

Em suma, o importante é construir novos caminhos, uma nova economia à medida do homem e para o homem, socialmente justa, economicamente viável, ambientalmente sustentável. Não podemos querer que as coisas mudem, se sempre fazemos os mesmos (A. Einstein). O inconveniente das pessoas e dos países é a dificuldade para encontrar as saídas e as soluções. Sem obstáculos não há desafios. O importante é cultivar o bem e servir Cabo Verde.

* Economista

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 771, de 09 de Junho de 2022

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