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Comunidade Cabo-verdiana em Sintra, Portugal: ACAS, um exemplo de integração social e comunitária

Por: Aidê Carvalho

Há duas décadas a Associação Luso Cabo-verdiana de Sintra (ACAS) vem fazendo a diferença na vida de milhares de pessoas. Mesmo nos contextos mais adversos, cumpriu a sua missão, tornando-se num verdadeiro agente de mudança. Carla Lopes e Rosa Moniz são dois exemplos de entrega aos cabo-verdianos num dos concelhos mais emblemáticos da Grande Lisboa.

ACAS acolhe, capacita e integra imigrantes e populações vulneráveis de Sintra, nas freguesias de Rio de Mouro e Algueirão-Mem Martins, através dos seus diversos projetos. Nos últimos cinco anos (até dezembro de 2022), foram atendidos 5500 imigrantes, 3500 inscritos nos Projetos Escolhas, 1500 jovens no Gabinete Especializado, 550 jovens integrados no mercado de trabalho e 950 crianças e jovens acompanhados no Gabinete Educativo – Apoio Escolar.  Só em 2023, a Associação já registou 700 atendimentos.

Vivi no concelho de Sintra e acompanhei a ACAS desde os seus primeiros anos de existência. Essa associação foi motivo de uma das minhas primeiras reportagens, enquanto jornalista estagiária, na então revista “África Hoje”, em 2004, que passou a ser chamada de “África Today”, depois do falecimento do seu mentor, Dr. Albérico Cardoso, em Lisboa. Cardoso, motivado pela causa e pelo amor que sentia pela lusofonia, gostava de mostrar o lado positivo das pessoas nas comunidades, tentando ajudá-las a integrar-se onde estavam inseridas. Hoje, por ocasião do vigésimo aniversário da ACAS, sinto-me feliz e orgulhosa ao ver que como os seus promotores conseguiram “levar a bom porto” este nobre projeto, que nasceu da manifesta vontade de um grupo de jovens cabo-verdianos e descendentes. 

Percurso e projetos desenvolvidos

Criada de forma informal em 2002, a Associação Luso Cabo-verdiana de Sintra – ACAS iniciou as suas ações no bairro da Serra das Minas (Rio de Mouro), apoiando a interação da população recém realojada na construção de uma boa relação de vizinhança, respeitando a diversidade cultural. Africanos, portugueses, ciganos e pessoas de outras origens, conviviam em espírito de comunhão e irmandade, com o apoio da ACAS.

Em 2016, ACAS assumiu o papel de entidade executora do projeto de Integração Municipal do Imigrante, financiada pelo Fundo para o Asilo, a Migrações e a Integração – FAMI, que ainda está em curso, onde continua a apoiar os imigrantes com problemas ligados à justiça.

Mas, tudo isso foi possível graças ao envolvimento de muitos parceiros e de várias instituições, nomeadamente, a Câmara Municipal de Sintra, o Alto Comissariado para Imigração e Melhorias Étnicas – ACIDI, o Instituto de Emprego e Formação Profissional – IEFP e o Fundo Europeu para Integração de Nacionais Países Terceiros – FEINT, Fundação Gulbenkian, Juntas de Freguesia (Rio de Mouro e Algueirão- Mem Martins), entre outros.

Estima-se em 10 mil o número de emigrantes cabo-verdianos em Sintra. São muitas as vidas transformadas nestes 20 anos, desde a mais simples regularização da permanência no país que permite o acesso aos recursos sociais como transformação de jovens comuns em referências notáveis por via de suporte ao sucesso educativo, acesso ao emprego cultura e desporto.

Carla Lopes, feru na petu y pé finkadu na tradison

Em Sintra, Carla Lopes, 23 anos, tenta preservar a tradição e manter a chama cultural bem acesa que herdou dos seus pais. Gosta de cantar, tocar ferrinho e dançar. Filha de Bino Branco (do grupo Ferro Gaita) e de Sandra Mendes (antiga dançarina do grupo Bibinha Cabral), a jovem viajou para Lisboa com apenas seis anos de idade. Tem marcado presença em vários eventos culturais e tenta não deixar morrer as nossas tradições.

Carla considera-se uma guerreira, assim como a sua mãe, sua maior inspiração. Nutre uma profunda admiração pelo Ferro Gaita, grupo ao qual se considera “filha”. 

Além de artista, Carla Lopes é líder comunitária e colaboradora da ACAS. Aqui lidera um projeto de intervenção artística, o CRIARTE, para jovens talentos na área de Algueirão Mem-Martins. A sua paixão pela vida associativa surgiu com a organização de eventos. Ela realiza atividades na comunidade e acabou por integrar uma associação juvenil denominada “Jipangue”, da qual foi eleita como presidente. 

Carla Lopes aceitou trabalhar na ACAS porque queria desempenhar funções de liderança como a Coordenadora Geral, Rosa Moniz e ser, também, um dos “grandes pilares” dessa associação. “A ACAS representa todos aqueles que não desistem de seus sonhos e, graças à equipa que tenho do meu lado, eu estou a aprender a não desistir do meu, que é cantar”, afirma a jovem que tem a cultura nas veias e o associativismo no coração. Através das expressões artísticas da dança, da música e do associativismo, procura transmitir valores da cidadania, cooperação e solidariedade. É esse, também, o espírito da ACAS que é considerada um exemplo de integração social e comunitária dos imigrantes, em Portugal.

Rosa Moniz, um dos rostos da ACAS

Residente em Portugal há mais de 30 anos Rosa Moniz tem sido um dos rostos da ACAS. Natural de São Lourenço dos Órgãos, ilha de Santiago, licenciou-se em Comunicação Social em 1998, pela Universidade de Lisboa, altura em que era funcionária da Embaixada de Cabo Verde. Em 2002, juntamente com um grupo de jovens, criou a primeira Associação de imigrante do concelho de Sintra – Associação Luso Cabo-verdiana de Sintra (ACAS), onde trabalha até então na integração de imigrantes e na promoção de intervenção social.

Lidar com pessoas sempre foi a sua paixão e, em 2012, “esbarrou-se” com o “COACHING”, como ela costuma dizer. Desde então que tem alargado o leque de ajuda a pessoas, equipas, grupos e organizações, desafiando-os a transformar as suas interações em fontes de energia, motivação e sucesso. Tem conciliado as suas tarefas domésticas com o Associativismo e o seu trabalho de “COACHING” na área de Liderança e empoderamento.

Atualmente, Rosa Moniz é Coordenadora Geral da ACAS e tem ajudado jovens comuns a se transformarem em referências, como é o caso da talentosa Carla Lopes. Também tem apoiado centenas de pessoas na elevação do seu potencial, promovendo o desenvolvimento da liderança, do autoconhecimento, da comunicação eficaz, da relação interpessoal, da proatividade entre outros “soft skills”.

Na ACAS, esta cabo-verdiana muito ativa na comunidade, viu crianças, jovens e suas famílias a mudarem de vida e serem mais felizes. Ela testemunhou casos de jovens saíram de cenários de risco profundo para uma integração plena. Hoje, continua a semear a esperança no coração dos imigrantes, sobretudo cabo-verdianos, dando-lhes a certeza de que melhores dias ainda virão.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 819, de 11 de Maio de 2023

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