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Cultura

Salif Keita: “Cesária era uma boa alma”

Reservado nas palavras, mas muito consciente da mensagem que quer passar, em entrevista exclusiva ao A NAÇÃO, mesmo antes de chegar a Cabo Verde, para o concerto de hoje, sexta-feira, à noite, no Kriol Jazz Festival, o maliano Salif Keita confidenciou alguns dos momentos que privou com Cesária Évora. Da nossa Cize guarda a memória de uma “alma linda, aberta e sociável”. Conhecido por ser um músico de intervenção, sonha com uma África unida, em que todos os países caminhem juntos porque o destino dos povos, defende “estão ligados”.

Como se sente com esta vinda a Cabo Verde (há muito tempo que o aguardávamos…)?

Esta será a minha segunda viagem a Cabo Verde, a primeira foi no âmbito da minha colaboração musical com a minha `irmã´ Cesária (desejo- -lhe paz), e tenho muito boas recordações disso. Desta vez, venho para dois espectáculos. Há muito tempo que ansiava por isto e mal posso esperar para estar em palco no Festival Kriol Jazz. Este país tem um lugar especial no meu coração.

Que recordações guarda da parceria com a nossa diva Cesária Évora?

Foi um encontro de duas personalidades (duas personagens), dois mundos musicais, não tão distantes, como se poderia pensar à primeira vista. Cesária era uma pessoa com uma alma linda, aberta e sociável, que dava muito amor aos que a rodeavam. Cozinhou para mim quando estive em São Vicente… A nossa colaboração correu muito bem e ela deu-nos ‘Yamoré’, que é uma canção muito especial no nosso repertório. Teria gostado muito que ela cantasse comigo no seu país de origem, por isso vamos pensar nela em palco.

Como vê a música africana, hoje em dia, e a direcção que os artistas estão a tomar?

 A música africana sempre vendeu bem e viajou por todo o mundo durante décadas. Desde há alguns anos, a ponta de lança da música africana é o Amapiano e a música da Nigéria, o afro beat ou géneros musicais inspirados nele. Os jovens DJ´s e cantores levaram estes ritmos muito longe, com os meios de que dispõem actualmente.

O que podemos esperar do espectáculo no Kriol Jazz, uma apresentação do seu último álbum ou uma mistura de músicas do seu belo reportório?

 Podemos esperar um pouco de Salif Keita (risos). Bem, vamos tocar músicas de vários álbuns. O palco do Kriol Jazz será o meu primeiro espectáculo em solo cabo-verdiano e quero que o público ouça um pouco de cada período da minha carreira. A minha banda é composta maioritariamente por jovens músicos com enorme talento e estamos prontos para o espectáculo.

A música cabo-verdiana é ouvida no Mali, o seu país de origem?

Que outros artistas cabo-verdianos ouve ou conhece? A música cabo-verdiana, enquanto tal, não é ouvida no Mali. Mas, como cantor e músico, conheço-a um pouco. Acho- -a muito melodiosa e alegre. E a melodia é muito importante para mim na música.

É um defensor do continente, como vê a situação em África com estas novas revoltas juvenis e as relações com a CEDEAO?

 Penso que África e os africanos querem, agora, sair de uma situação que não lhes trouxe o que esperavam. Isso é legítimo. Quando algo não funciona, é preciso mudar. É essa a situação do continente. O meu desejo é que os países olhem na mesma direção, porque os destinos dos povos estão ligados.

Com 55 anos de uma carreira de sucesso, já deve ter tocado em todo o lado. Mas, há algum país no mundo onde ainda não tenha tocado e que gostaria muito de visitar?

Fiz muitas digressões durante os meus 55 anos de carreira e toquei em todos os continentes. Mas o mundo é um sítio vasto e há muitos países onde nunca toquei.

 A minha resposta à sua pergunta de hoje será o Haiti. É um país que significa muito para os negros porque o Haiti foi a primeira nação com uma população predominantemente negra. O Haiti está a passar por momentos difíceis há muito tempo, por isso, para mim, que uso a minha música para defender a paz, a tolerância, o respeito pelos outros e pelas suas diferenças, e a fraternidade entre os povos, poder tocar num Haiti seguro e pacífico seria muito simbólico.

Há algum espectáculo que lhe tenha marcado por alguma razão, em particular, até agora? 

Para mim, cada público é especial. O que recebo do público de cada vez que subo ao palco é diferente. Por vezes, dou um espetáculo na mesma cidade com um ano ou menos de diferença. Mas cada encontro com o público é como uma primeira vez. E, aqui na Praia, será mesmo a primeira vez, e espero que o público esteja presente.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 866, de 04 de Abril de 2024

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