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Economia

São Vicente: Peixeiras nas ruas da amargura

As peixeiras de São Vicente estão cansadas de esperar pela devolução do seu mercado, em obras de remodelação há quatro anos, quando a promessa era de que em seis meses o espaço estaria renovado e devolvido aos seus utentes. Uma promessa que remonta à anterior eleição municipal, feita em dia de grande agitação na Rua da Praia.  

Incomodadas com a situação em que se encontram, há quatro anos, peixeiras ouvidas pelo A NAÇÃO dizem já não saber o que fazer para voltar a ter o seu antigo espaço de venda, com todos os problemas que é estar a vender na rua, tendo que se esquivar, volta e meia, dos fiscais da câmara municipal. 

De facto, foi nas vésperas das eleições autárquicas de 2020, na primeira semana de Setembro (precisamente no último dia legalmente permitido para o lançamento de primeiras pedras ou inauguração de obras), que, no meio de grande aparato, com DJ’s e comes e bebes, se procedeu ao lançamento da primeira pedra das obras de requalificação do mercado de peixe. 

Era Paulo Veiga ministro do mar e Augusto Neves, o candidato do MpD à sua sucessão na Câmara de São Vicente. O prazo previsto para a execução das obras era de seis meses, com conclusão prevista para Fevereiro de 2021. 

Com a chegada dos tractores e outras máquinas, a peixeiras viram-se acantonadas no outro lado do mercado, onde passaram a trabalhar sem as mínimas condições. De acordo com algumas dessas mulheres ouvidas por esta reportagem, a primeira desculpa pelo atraso é que os equipamentos tinham de vir do exterior por via marítima e que com a covid 19 tudo estava suspenso.  

O certo é que ainda hoje as peixeiras continuam acantonadas e amontoadas numa metade do mercado, ou ao longo da Rua da Praia, ou nas artérias circundantes. Os tratadores de peixe ocupam uma pequena parte da outra metade do mercado. Os conflitos, nesse ambiente, por tudo e por nada, são frequentes. 

Peixeiras revoltadas 

Sónia Ramos é uma das vendedeiras que antes vendia dentro do mercado e teve de se adaptar aos novos tempos com a promessa de que o prazo seria de três meses. Na verdade, no seu caso, diz que se encontra fora do mercado há quase cinco anos. «Pelo que vejo, este trabalho não vai ser concluído tão cedo», disse, descrente e desconfiada dos políticos. 

Sónia diz que ouviu dizer que a Associação das Peixeiras está empenhada em ajudar a resolver o problema, já que ninguém está satisfeito com as condições em que se encontra. “São condições pouco dignas mas nós temos de ficar aqui porque não existe espaço e nos mandaram aguardar ainda mais tempo”, frisou. 

Como refere também, as condições dentro do mercado são precárias, já não há câmaras de frio e acusa a Câmara Municipal de se estar a “marimbar” para as peixeiras. Caso contrário, alega, “o nosso problema já estaria resolvido”. 

A opinião de Sónia Ramos é partilhada por grande maioria das peixeiras com quem fomos conversando e ouvindo as suas reclamações. Caso de Maria dos Reis que, apesar de um quanto retraída, com receio de possíveis represálias, lá foi dizendo o que pensa do assunto. 

“O que antes era o mercado é hoje um curral de tchuk” (porco), desabafa Maria dos Reis. “Nós vendemos na rua porque não temos um ‘plurim’ e desconhecemos as razões de tanto atraso, porque ninguém nos diz o que se passa”. 

Também reclama a falta de uma câmara de frio, onde as peixeiras possam conservar o pescado. Para finalizar o seu desabafo, acabou por pedir um pouco de “dignidade e consideração” para com as peixeiras. 

Sandra Fortes, mais desinibida, pede urgência na reparação e remodelação do mercado, para quem vive dele possa ter um espaço condigno para “catar o pão para os nossos filhos”. Estar na rua, para esta vendedeira, é coisa incerta, por causa da “perseguição” dos fiscais. “Mesmo sabendo que o mercado não tem condições, querem à força que lá fiquemos, uns em cima dos outros, no pouco espaço que deixaram para vendermos e tratar peixe”.

“O que queremos”, sublinha, “é que a Câmara Municipal reveja a situação em que nos encontramos, porque estamos a trabalhar para dar de comer e pagar os estudos dos nossos filhos”. 

Para esta reportagem, como mandam as regras, A NAÇÃO procurou ouvir a Câmara Municipal de São Vicente, nomeadamente o vereador da área. Infelizmente, os nossos esforços revelaram-se infrutíferos. 

Eloisa Mota

Associação das Peixeiras critica caos criado pela Câmara Municipal

A Associação das Mulheres Peixeiras de São Vicente responsabiliza Câmara Municipal pela situação que as vendedeiras e os tratadores de peixe se encontram desde que o espaço entrou para obras. “O primeiro culpado pela situação em que nos encontramos é a Câmara Municipal”, afirma Eloisa Mota, vice-presidente da Associação.

Eloisa Mota considera por isso um despropósito os fiscais da CMSV andarem a retirar o peixe das mulheres que todos os dias, bem cedo, saem de casa para poderem ganhar a vida. 

“Pediram-nos para sair do mercado em 2019 por um período de três meses, para fazer obras da remodelação do mercado, e já lá vão quase cinco anos”, realçou a vice-presidente da Associação das Peixeiras na mesma linha das demais entrevistadas.

Criada em 2019, a Associação das Mulheres Peixeiras de São Vicente tem, entre os seus objectivos, lutar e zelar pelos direitos dos seus membros, ajudando na resolução dos problemas dessa categoria social.

Desde então, com a parceria da Cooperação Espanhola, através do projecto “Amdjer txeu Luta”, tem ministrado formações ligadas à transformação do pescado, higiene e segurança, bem como à refrigeração e formalização dos seus negócios. “Todo este trabalho tem ido na direcção de contribuir para o aumento da auto-estima das mulheres e jovens que vivem da pesca e da venda de peixe”, diz Eloisa Mota. 

Para concluir, graças ao empenho da Associação, Eloisa Mota diz que se conseguiu uma câmara frigorífica para apoiar as peixeiras, co-financiada pelo Ministério do Mar, Câmara Municipal de São Vicente e pela própria Associação das Mulheres Peixeiras de São Vicente.  

 João A. do Rosário 

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