Afinal, o desfecho sobre o futuro do complexo Djeu, na cidade da Praia, pode estar longe do fim, com risco de se arrastar por anos e anos nos tribunais. Isto depois de a Macau Legend Development (MDL) ter anunciado que não concorda com a decisão do Governo em reaver todos os bens por alegados “incumprimentos” por parte dessa empresa de David Chow. Resta agora saber se com esta pressão o Governo vai recuar ou não?
Enquanto o Governo de Cabo Verde anunciava há dias a reversão de todos os bens móveis e imóveis (terrenos) do projecto do complexo Djeu, na Gamboa, cidade da Praia, devido à “violação” reiterada as obrigações previstas por parte da MDL, a empresa macaense parece não estar disposta a abrir mão dos investimentos já concretizados no local, especialmente do hotel-casino.
Mal soube que o Executivo cabo-verdiano chamou a si todos os bens pelo incumprimento do contrato, a empresa que tem à frente o magnata David Chow e que há muito se encontra no colapso financeiro, mostrou-se descontente com a decisão e afirmou-se determinada em lutar pelos empreendimentos já construídos.
Neste contexto, conforme foi avançado esta semana pela imprensa macaense, a MDL informou à bolsa de valores de Hong Kong que está à procura de aconselhamento jurídico em Cabo Verde, para ver a melhor forma dentro da lei para lutar e reaver então os seus investimentos.
A MDL justificou no mesmo em comunicado que “pretende contestar vigorosamente estas alegações para salvaguardar o interesse da empresa e dos seus accionistas” estando então à procura “activamente” do tal aconselhamento jurídico, “sobre o curso de acção apropriado”.
Djeu em stand by?
Caso a MDL avançar por via judicial cai por terra a vontade do Governo em agilizar a procura de novos investidores para dar continuidade ao projecto. Uma disputa na justiça, além dos custos e desgaste, pode arrastar-se por anos e anos, deixando ao abandono e em standby todos os investimentos já realizados como o hotel-casino e até a ponte que liga a Gamboa ao Djeu.
Como é sabido, este Executivo não gosta muito deste tipo de contendas judiciais, especialmente com empresas e investidores de grande envergadura. Um exemplo desta postura foi verificada no braço de ferro com a Icelandair que não só sugou do Estado cabo-verdiano o que pôde a partir da TACV, como ainda teve um “prémio” de 1,4 milhões de euros pelo arrestamento do seu boing, por um ano no aeroporto do Sal, aparelho esse que mal levantou voo do Aeroporto do Sul rumou para um ferro velho onde foi desmantelado.
Último recurso
Em entrevista recente à TCV, Olavo Correia, vice-primeiro-ministro e ministro das finanças, disse que a decisão do Governo em chamar a si todos os bens por incumprimento foi mesmo o “último recurso”, a “última solução que tínhamos”, porque “nós não somos um Governo que gosta de utilizar este instrumento de reversão”.
O que interessa ao Governo disse, é que a empresa de David Chow tivesse as condições para executar o projecto num prazo “útil”, para o Governo, praienses e cabo-verdianos.
“Não podemos condicionar o desenvolvimento de uma cidade, que é o espaço mais importante de Cabo Verde em termos populacionais condicionado à agenda privada de um operador (…) não podemos condicionar o desenvolvimento da cidade da Praia aos interesses particulares de um privado, mesmo que respeitamos a posição dele (…) o interesse público aqui é o bem maior a ser protegido”, argumentos.
O governante avançou ainda haver várias propostas avulsas, mas que haverá um processo de selecção tendo em conta garantias financeiras de cumprimento do projecto, renome do operador nos mercados internacionais, etc.
Perigo de atribuir projecto a um único operador
De notar que A NAÇÃO reportou num dos seus números de Julho passado a possibilidade de “reversão”, medida que agora se veio confirmar. O Governo criou até uma equipa composta por um grupo restrito de conhecidos advogados da praça e um residente em Macau para tentar arranjar um novo investidor que possa assumir, na integra, o projecto de David Chow, cuja primeira pedra foi lançada, em 2016, com uma previsão de três anos para a conclusão da primeira fase.
Porém, como este Jornal avançou também, a decisão de voltar a conceder todo o projecto do Djéu a único operador não era bem vista por economistas e empresários do ramo do Turismo. Estes consideram que toda essa área deveria ser objecto de um Master Plan, plano este onde seriam previstos vários lotes de terrenos, que seriam concessionados a promotores diferentes com a vantagem de celeridade na realização de investimentos, promoção da competividade, diversidade da oferta, competitividade e concorrência.
“Só a área enxuta são 35000 metros quadrados poderia albergar vários hotéis”, alegam os nossos interlocutores, que consideram que a cidade da Praia não tem disponível um ‘prime lands’ (terrenos disponíveis para grandes investimentos), susceptiveis de atrair hotéis e marcas top”, realçou uma das nossas fontes.
É que, segundo esses analistas, já está mais do que provado que a concessão de grandes extensões de terreno a um único operador para investimentos turísticos não significa a conclusão do projectos, como a agora aconteceu com Gamboa e Ilhéu de Santa Maria. Este, de um orçamento inicial de 250 milhões de euros, foi reduzido significativamente, mas mesmo assim não foi concluído. Uma outra prática tem sido a especulação de terrenos públicos em benefício de privados.
Percurso do empreendimento “Djeu”
O projecto do complexo “Djeu”, na cidade da Praia, que contempla casino, marina, escritórios, entre outras valências, foi anunciado em 2001. A primeira pedra só viria a ser, contudo, colocada 15 anos mais tarde, em Fevereiro de 2016, tendo o acordo com o Governo sido assinado em 2015.
Na altura, o próprio David Chow tinha dito que em três anos (2019) “os cabo-verdianos” haveriam de ver “os resultados” do seu empreendimento, o que não se efectivou. Entretanto, muitas interrogações e dúvidas à sua efectivação foram levantadas ao longo dos últimos anos, especialmente desde que o Banco de Cabo Verde chumbou o pedido de abertura de um banco na capital do país, por parte do empresário macaense, por não reunir os requisitos de conformidade exigidos pelo regulador. O BCV entendeu que Chow não tinha “idoneidade bancária”.
Eram 250 milhões, o maior projecto de sempre em Cabo Verde, que passou para 90 milhões. O “Djeu” foi apontado como o maior empreendimento turístico de Cabo Verde, com um investimento global de 250 milhões de euros. Chegou-se a falar até na eventualidade de se construir um novo aeroporto internacional para receber os clientes do casino que David Chow contava construir na cidade da Praia.
Contudo, após sucessivos adiamentos, e lançamento de várias primeiras pedras a que o A NAÇÃO assistiu, o investimento inicial passou de 250 milhões de euros para 90 milhões de euros.
Estava previsto a construção de uma estância turística, um hotel -casino de 250 quartos, que já foi construído, mas está fechado, uma piscina, várias instalações para restaurantes e bares, além de uma marina.
Inclusive, a MDL tinha anunciado em Março de 2020 que pretendia inaugurar o hotel-casino no final de 2021, depois de em 2019 ter previsto a conclusão da obra para o final do ano seguinte, sem nunca se ter efectivado.
Publicado na Edição 900 do Jornal A Nação, de 28 de Novembro de 2024
Manuel Miranda
30 de Novembro, 2024 at 17:58
Ainda a porca russa vai torcer o rabo.
Não podem fazer arrestos dos bens móveis ou imóveis sem contudo o processo de arresto passar pelas entidades competentes, neste caso, os tribunais. Caso contrario, a reputação da República Democrática passa a ser ditadura , onde reina o poder do posso e mando.