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Poder local: Análise e ponto de vista sobre as eleições de 25 de outubro

Por: Alexandre Gomes

A Constituição de 1992 de matriz jus-filosófica, incorpora valores da democracia ocidental, e numa axiologia transpositiva liberal, postula um catálogo de direitos, liberdades e garantias funda- mentais como invioláveis e inalienáveis assente na dignidade humana, garante a unidade do Estado, a forma republicana do governo, como também veio consagrar o poder local, legitimando a representação política junto da comunidade.

De facto, percorrendo a história desde 15 de dezembro de 1991 – data em que ocorreram as primeiras eleições municipais em Cabo Verde, pode-se afirmar, veementemente, que valeu a pena a criação de autarquias locais, dando poderes de decisão aos órgãos locais próprios, de gerir recursos e administrar o território, inobstante as assimetrias regionais evidentes e enormes desafios, por vencer, em prol de um poder local mais plural, mais representativo e que traga oportunidades para todos.

É de repudiar a denegação e sublinhar a nova forma de relacionamento entre o poder central e local a vigorar antes e depois de 2016, com as eleições legislativas de 20 de março, que ditou a alternância política.

Ganhos notáveis

Efetivamente, mudou-se o status quo ante e, hoje, as relações entre esses dois centros de poder, funda-se na solidariedade, na complementaridade e na subsidiariedade, com notáveis ganhos a nível do aumento do Fundo de Financiamento Municipal, canalização de verbas relacionadas com o Fundo do Turismo e da Taxa Ecológica, aumento de contratos programas, implementação do programa PRRA, ações que tem melhorado a tesouraria municipal, permitindo a requalificação de cidades e aldeias por todo Cabo Verde, desencravamento de localidades, reabilitação de casas, incremento do turismo, aumento da qualidade de vida e a autoestima das pessoas.

Regista-se a diferenciação positiva, com rúbricas financeiras constantes do Orçamento do Estado para o ano económico de 2020, no montante de 100.000.000 (cem milhões de escudos) a distribuir em partes iguais, para os municípios do Paul, Tarrafal e Ribeira Brava de São Nicolau, Maio, São Miguel, São Salvador do Mundo, São Lourenço dos Órgãos, Santa Catarina do Fogo, Brava, Mosteiros, Ribeira Grande de Santiago e São Domingos.

Se tudo isto é verdade, não é menos verdade que o exercício do poder municipal carece de maior abrangência. Deve-se priorizar investimentos nos setores da pesca, da pecuária, da agricultura, da mobilização e racionalização da água, do turismo com enfoque em outros moldes que não seja, apenas, sol e praia de modo a chegar cada município de acordo com sua potencialidade.

Partilhamos a ideia de que deve continuar a haver um forte engajamento do governo central e local, mais parcerias público-privadas, maior investimento direto-estrangeiro, bem como maior proveito dos recursos endógenos como forma de alavancar a economia local e criar postos de trabalho com reflexo na vida e economia das famílias.

Reformular políticas públicas

Porém, defendemos que as atribuições da Administração Central e Autárquica, bem como as políticas públicas devem ser reformuladas se quisermos dar o salto qualitativo que almejamos para Cabo Verde no horizonte 20-30. A maioria dos concelhos do país, para não dizer todos, têm potencialidades sui generis que podem convergir, se bem aproveitadas, e catapultar Cabo Verde como país desenvolvido a curto e médio prazo, fazendo de cada município um polo de desenvolvimento estratégico.

Ciente disso, deve-se repensar o exercício do poder local cabo-verdiano, enquadrando-o numa plataforma em prol do desenvolvimento, que é um espaço que aglomera tudo e todos que entenderem dever estar. A ideia base assenta-se no projeto que visa, in totum, juntar as pessoas mais do que as separar, ao invés de ver pelo partido A ou B ou pelo candidato Y ou Z.

Tal ideia não se materializa de per si, requer medidas e, de entre essas medi- das, deve-se introduzir, comurgência, alterações legislativas no quadro da lei do estatuto dos municípios e das finanças locais passando, indubitavelmente, por uma ampla reforma do Estado e, ainda, numa nova forma de exercício do poder e redesenho da própria organização administrativa do Estado.

Dito isto, o Governo numa sessão extraordinária de Conselho de Ministros, depois de ouvir os partidos políticos, com exceção do PTS, cumprindo assim o preceito constitucional e do Código Eleitoral, marcou por Decreto-regulamentar no 8/2020, de 7 de agosto, as próximas eleições para os titulares dos órgãos municipais para o dia 25 de outubro. Trata- -se do 8o pleito autárquico após sua progénie em 1991.

 

“Não é menos verdade que o exercício do poder municipal carece de maior abrangência. Deve-se priorizar investimentos nos setores da pesca, da pecuária, da agricultura, da mobilização e racionalização da água, do turismo com enfoque em outros moldes que não seja, apenas, sol e praia de modo a chegar cada município de acordo com sua potencialidade.”

 

Efetivamente, é uma data que vai ao encontro daquilo que é a expetativa da maioria dos partidos políticos ouvidos pelo governo e da grande franja da sociedade civil. Nessas questões temos tido consenso, Aleluia!

Trata-se de uma eleição a ocorrer num período especial de surto pandémico que afeta o país, dai tal data vai dar tempo também às estruturas da saúde e a Comissão Nacional de Eleições (CNE) de se prepararem para que as eleições venham ocorrer com segurança sanitária e normalidade constitucional.

Face a este panorama eleitoral somos de opinião de que a CNE e a Direção Nacional da Saúde deverão emitir diretivas para que as eleições autárquicas decoram em segurança e vão no sentido de se respeitar o distanciamento e o reforço de medidas de proteção para se evitar qualquer tipo de propagação do vírus no dia do ato eleitoral, bem assim como durante a vigência da campanha eleitoral, mas que não venham impedir a participação dos cabo-verdianos nesse importante ato eleitoral. Esperamos que to- dos participem e de forma efetiva para o exercício pleno da cidadania e reforço da democracia.

Por outro lado, assiste-se nos bastidores uma “briga” para a materialização da paridade na constituição de listas ao pleito eleitoral que se avizinha. Não se vê tal paridade na indicação dos candidatos à presidência das Câmaras municipais que como se sabe, é um órgão singular. Aguarda-se com afinco que a paridade venha se verificar na constituição de listas para os órgãos colegiais, quer para Câmara quer para Assembleia Municipal.

Ao nosso ver, isto não devia ser assim e que ter mulheres nas listas não devia ser uma dádiva e nem reconhecido por imperativo legal, mas sim devia ser uma conquista de cada mulher, com base na meritocracia da escolha. Entretanto, tal opinião vale o que vale por, in casu, as forças políticas e cidadãos autónomos a concorrerem em pleitos eleitorais devem observar a lei, sob pena de se recusar a lista junto ao poder judicial.

É neste quadro que os cabo-verdianos, dentro de poucos meses, irão às urnas para escolherem os próximos governantes locais e, apesar de ainda não ter sido aberto o período de campanha eleitoral, a pré-campanha já deu sinais de muita fervura um pouco por todo o país.

Não vale a pena entrarmos em debates ofensivos e de pouca sabedoria, por que em nada abona os feitos conquista- dos e comprometerá o crescimento e desenvolvimento de Cabo Verde.

Decidir de forma livre e consciente

Face a isto, devemos sim preparar o nosso espírito, para que nos pleitos eleitorais que se avizinham (autárquicas 2020) saibamos decidir de forma livre e consciente em qual projeto e proposta depositaremos a nossa confiança.

Vale por ora analisar o percurso dos candidatos, sem esquecer de avaliar convenientemente a equipa que nos apresentarão.

Outrossim, dizer que o partido e o candidato são elementos essenciais para que se materialize o processo democrático, no contexto dessas eleições, não é bem assim por que a democratização não se limita e nem se restringe a estes. É muito mais…

É muito mais, porque envolve outros atores e interesses, maiores que àqueles, sobretudo os interesses dos munícipes, em particular e, de Cabo Verde, em geral.

Portanto, sejamos firmes e convictos nas nossas análises e decisões, libertos de rancores, mágoas, ofensas e negligência, porque o momento não é de individualidade, mas sim, de coletividade. O que está em jogo é cada um de nós e o futuro do municipalismo cabo-verdiano, assim sendo.

Votemos! Mas, votemos de forma livre e consciente em prol de um municipalismo cada vez mais e melhor. O processo de desenvolvimento não é acabado, muito pelo contrário, é dinâmico e progressivo.

Vivemos em tempos de crise! Se os recursos já eram escassos, agora nos afigura que estão em vias de extinção… Assim sendo, só nos resta um recurso. A pessoa, o Homem, o Capital Humano, com o seu conhecimento, suas habilidades, suas estratégias e capacidades. Este sim deve ser vista como um parceiro e promotor de e para o desenvolvimento. Como já dizia Albert Einstein, a crise é a maior dádiva que pode acontecer às pessoas e aos países… é na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias.

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