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Cultura

Zé Perdigão lamenta o “pouco reconhecimento” de Cabo Verde

Zé Perdigão vive em Cabo Verde há seis anos, onde tem abraçado de corpo e alma a música tradicional, numa viagem por mornas e coladeiras. No entanto, sem pretensão de críticas, lamenta o “pouco reconhecimento” que tem tido em Cabo Verde e estranha o facto de estar a representar o país com a nomeação no International Portuguese Music Awards (IPMA) 2021, e não no concurso de mesma natureza realizado em Cabo Verde  – os CVMA.

Zé Perdigão é uma voz conhecida e apreciada da música tradicional portuguesa e da “world music”, que escolheu, há seis anos, as ilhas de Cabo Verde, quando queria fazer um ano sabático e repensar a sua carreira artística.

Em entrevista ao A NAÇÃO online, o fadista, que diz ter percorrido meio mundo ao longo da sua carreira, explica  o “porquê” de “Cabo Verde”.

“Cabo Verde foi, na altura, uma opção muito ponderada pois era um país onde tinha amigos e para onde vinha de férias. Quando decidi que queria fazer o ano sabático na minha carreira não foi difícil escolher”, diz o artista que se instalou na cidade da Praia.

Da sua paixão pelas ilhas, Perdigão resolveu mergulhar nos ritmos tradicionais, fazendo também da morna e da coladeira, o seu caminho.

Assim, em 2019, lançou o seu quinto álbum “100 porcento (%) cabo-verdiano” – o “Encanto”.

O trabalho, que contou com a produção do Kaku Alves, trouxe 10 temas em homenagem às dez ilhas da terra que lhe acolheu.

“Este disco foi totalmente cabo-verdiano, com autores e compositores de Cabo Verde, músicas em crioulo e produzido no país”, relembra o artista, que diz se sentir praticamente “cabo-verdiano”.

Nomeação nos IMPA por Cabo Verde

Ainda por Cabo Verde, o mais novo tema de Perdigão – “Amália (voz magoada da saudade) ”, lançado em 2020, foi nomeado para os International Portuguese Music Awards (IPMA) 2021, na categoria de Best World Music.

A música, um tema inédito integrado nos “Murais de Amália Rodrigues em todo o mundo” para celebrar o Centenário de Amália Rodrigues, 2020-2021, está ainda em votação pública para a categoria de “People’s Choice”, até 20 de Agosto, de seis em seis horas.

Esta nomeação para os IPMA 2021, nos Estados Unidos, deixou Perdigão satisfeito, pois considera este um reconhecimento pelo trabalho que juntou Portugal, Cabo Verde e Canadá.

“A expectativa é sempre boa. Mas é com muita normalidade que aceitamos a nomeação deste tema a ser dividido entre Cabo Verde, Portugal e Canadá. A música é do Khaly Angel, cabo-verdiano, letras do José D`Almansor, cantada por mim -portugueses e produzida por Herman Alves – Hermedia, que é canadense”, diz o artista para quem “ser nomeado para a melhor música do mundo em um concurso internacional é o sinal de que fizemos um bom trabalho e que estamos num bom caminho”.

Mais reconhecimento em Cabo Verde precisa-se

Este reconhecimento a nível internacional faz Perdigão “estranhar” de uma certa forma, a sua ausência nos concursos nacionais da mesma natureza, nomeadamente, os Cabo Verde Music Awards –  CVMA. 

“Acredito que em Cabo Verde estão um pouco desatentos aos trabalhos do Zé Perdigão. É uma discrepância terem o meu tema nas mãos e não nomearem- me num concurso de mesma natureza, no país, e estar agora a ser nomeado num concurso internacional que seleciona sete países da música portuguesa, no mundo. Isto mostra que alguma coisa não vai bem por aqui” diz o artista acreditando que “Cabo Verde precisa seguir o exemplo de Portugal que nomeia cabo-verdianos, angolanos, moçambicanos nos seus concursos olhando diretamente pelos trabalhos destes”.

Por outro lado, o artista diz que tanto Portugal como Cabo Verde precisam melhorar a indústria musical, prestando mais atenção nas editoras que têm todos os anos, os seus artistas nomeados, senão estão a ter influência sobre a classe dos júris nos concursos, por exemplo.

“Eu nunca quis ser júri na minha vida e acredito ser um papel um bocado ingrato. Mas entendo também que alguém tem que estar nesta posição e julgar os trabalhos dos outros. Isto é natural e tudo o que espero é que estes sejam honestos sem serem tendenciosos. Algumas vezes já aconteceu, mas espera-se que não se torne hábito”, salienta.

“Por mérito próprio tem melhor sabor”

Perdigão diz que estas coisas não são de hoje e que ele, particularmente, prefere o mérito próprio.  “Acho com mais sabor e prefiro as coisas que conquistamos com mérito próprio”.

Aliás, ao longo da sua carreira, que iniciou aos seis anos de idade, em Guimarães, de onde é natural, Perdigão diz ter recebido muitos reconhecimentos pelos palcos do mundo. Para ele, o maior de todos os tempos e o mais marcante foi a condecoração como Cidadão Honorário de Buenos Aires, Argentina com o álbum “Sonidos ibéricos”.

Novo trabalho a caminho apesar da pandemia

Tendo em conta o contexto da pandemia, o fadista diz que não tem realizado shows fora de Cabo Verde há 1 ano e meio.

“Há um ano e meio que não consigo sair de Cabo Verde para nenhuma actividade artística, devido à pandemia, e o meu maior mercado está na América do Sul e do Norte. São países que estão constantemente a abrir e a fechar, o que não é bom para os artistas. Com muitas incógnitas, preferi não andar pelo mundo, como costumava fazer, para não gastar mais do que ganho”, diz o artista que, apesar de tudo, tem aproveitado o tempo para novas produções.

“Neste momento estou a trabalhar em um novo disco, com previsão para o seu lançamento ainda este ano”, revela o artista prometendo um trabalho de qualidade, em semelhança aos cinco já lançados.

“Os álbuns que faço são muito caros, não como aqueles que se fazem com dez tostões. Por exemplo, o meu último álbum, aquele dedicado a Cabo Verde, custou-me cerca de 40 mil Euros. Valor este que me daria um apartamento, ou um carro, mas que optei por pagar um álbum”, diz, realçando que tem feito um trabalho que vai para além de “caçar prémios” –

“Não estou na arte para fazer um trabalho qualquer mas sim para realizar trabalhos bem-feitos, pela arte, a condição ou profissão que escolhi”, diz o artista acrescentando que apesar da situação difícil que a classe vive, ele consegue ainda viver com os seus recursos e “sem chatear o governo”.

 Ao longo dos anos em que viveu em Cabo Verde, Perdigão diz que já deu para notar que existe uma diferença no tratamento entre os artistas de origem e os “adotados”.

“Cabo Verde tem muita mania de ver os seus e não ver os que cá vivem, sobretudo aqueles que estão cá, e que gastam tudo o que têm aqui. Precisam ver a comunidade internacional que vive aqui, e não estou a falar em um círculo fechado para artistas, mas sim em todas as áreas”, finaliza.

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