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Diáspora

Eleições municipais na Holanda: Cabo-verdianos querem fazer a diferença

As eleições municipais na Holanda, que arrancam esta segunda-feira,14 e se estendem até quarta-feira,16,estão a ser marcadas por uma boa participação de cabo-verdianos em várias cidades, não só em Roterdão. Um engajamento que marca uma mudança de atitude no sentido de uma maior integração na sociedade holandesa. Igualdade, justiça, melhor acesso à saúde e educação parecem dados adquiridos para quem mora na Europa, mas não é bem assim. Estão mesmo na origem desta luta por fazer a diferença através da política.

Ao todo são 20 partidos que concorrem às eleições municipais, só em Roterdão. Dos 352 municípios que existem na Holanda, estima-se que, a nível nacional, apenas cerca de 13 partidos têm representação em todo o país.

Em algumas cidades, a comunidade cabo-verdiana está bem representada nas listas, denotando, à partida, a “natural” vontade de participação activa na vida política, como forma de fazer a diferença, como é o caso de Roterdão.

O PvdA e o Denk são os dois partidos com maior presença de cabo-verdianos nas listas. O primeiro é o partido trabalhista e o segundo é conhecido como um partido de “imigrantes para imigrantes”.

Isabel Monteiro (PvdA): bom acesso à saúde e educação
E é precisamente no PvdA que se alistou Isabel Monteiro, nascida na cidade da Praia, terra também dos pais, tendo emigrado aos 12 anos para Roterdão.

“É um partido social que pensa em toda a gente. Toda a gente conta. Temos de dividir as coisas de forma igual, independentemente da tua origem, ou género”, defende.

Esta enfermeira de obstetrícia, formada ainda em gestão de cuidados de saúde, acredita que há “muito” a fazer pela integração da comunidade cabo-verdiana na Holanda.

“É bom estar dentro das matérias, do que estar fora”, começa por dizer, quando questionada sobre o que a motivou a entrar na corrida a estas municipais 2022, na Holanda.

“Temos muitas coisas a fazer e, talvez, precisamos da política para ir para a frente e para ajudar quem tem mais pouco na vida, e arranjar uma forma de abrir portas para toda a gente”.

Isabel é número 4 na lista do PvdA em Roterdão e se for eleita vai lutar especialmente por um “bom acesso à saúde e também para a educação”.

Jessie Silva (PvdA) quer elevação e solidariedade
Também na lista do PvdA, em segundo lugar, aparece Jessie Silva. Filha de pai de São Vicente e mãe de São Nicolau, Jessie nasceu na Holanda, em Schiedam, mas já esteve “várias vezes” em Cabo Verde.

Formada em administração pública e direito, é, actualmente, gestora de projectos na Câmara Municipal de Roterdão.

A entrada na vida política activa, é, como explica, uma forma de “contribuir” para a melhoria da situação dos cabo-verdianos.

“Eu quero realizar igualdade de oportunidade para todos”, garante, admitindo que a política é “importante” para “trazer a mudança necessária”.

Tal como Isa Monteiro, Jessie identifica-se com os valores do PvdA.

“É um partido de trabalhadores. Social-democraia, elevação e solidariedade, que são princípios importantes para mim”, argumenta.

Se for eleita, diz irá “falar com as pessoas da comunidade” para “resolver problemas na área da língua, escola, trabalho, saúde e “outros assuntos”, importantes para a comunidade.

Nelson Rodrigues (Denk) quer incentivar auto emprego
Também Nelson Rodrigues, da ilha do Fogo, radicado na Holanda desde os 15 anos, é outro candidato às municipais da próxima semana. É o décimo segundo da lista do Denk (Pensa), partido dos imigrantes para os imigrantes, em Roterdão.

É licenciado e trabalha na área da comunicação de mídia e marketing, tendo-se filiado no Denk para “contribuir para a sociedade” e “fazer a diferença”.

“Escolhi o Denk porque acredito na sua missão e visão”, diz, enaltecendo valores que representam o partido, como a luta contra o racismo e a discriminação, igualdade de oportunidades e habitação acessível para todos, menos carga regulatória para os empresários e transporte público barato, assim como tarifas de estacionamento reduzidas.

Se for eleito, diz que vai lutar por “todos” os cidadãos de Roterdão e, em específico, pela comunidade cabo-verdiana naquela cidade.

Diz, ainda, que se vai empenhar em criar “projectos” e programas de “mentoria”, para que possam “aprender” mais sobre empreendedorismo.

“Como se tornarem empreendedores. Como usarem os seus talentos, habilidades e os seus produtos, para aumentarem os seus rendimentos”.

Rodrigues realça que o objectivo é criar “oportunidades de crescimento financeiro para a nossa comunidade”. Também deixa um apelo, de que gostaria de ver os cabo-verdianos de Roterdão “unidos” e a se “ajudarem uns aos outros”, para que possam fazer “crescer os seus negócios”.

Jane Ortet (Denk): combater racismo e desigualdades
Jane Ortet, 29 anos, é um outro caso. Abraça os valores do Denk e integra o número oito da lista desse partido em Roterdão, sendo que esta é a segunda vez que se candidata, tendo sido a primeira em 2018, em Schiedam.

Filha de pais cabo-verdianos de Santiago, mãe da Praia e pai de Rui Vaz, Jane nasceu na Capelle aan den Ijssel, no Sul da Holanda, mas cresceu em Schiedam.

Frequentou a escola em Roterdão, onde confessa ter tido um contato muito grande com a comunidade cabo-verdiana.

“Em Roterdão eu podia falar crioulo com as minhas amigas e sentir a cultura de Cabo Verde e da comunidade cabo-verdiana”, recorda.

Actualmente, trabalha na área de gerenciamento de pedidos de empreendedores e ensina História Africana na escola. 

Conforme recorda, desde os 17 anos que tem “muito interesse” pela política devido às situações que constatava na sociedade holandesa.

“Na Holanda temos muitos problemas de racismo institucional, discriminação no mercado de trabalho, no acesso à habitação, à justiça, à escola e assistência médica”, enumera, argumentando que é um problema que vem do colonialismo, um problema “antigo”. E que é preciso fazer políticas para “mudar este sistema”, mas que para isso é preciso “participar na política”.

A razão pela qual abraçou a política, diz, é devido aos problemas que os imigrantes enfrentam na Holanda e também devido ao crescimento da extrema direita/populistas na política.

“Os políticos de extrema direita continuam a apontar pessoas de cor para certos problemas, mas não atacam o racismo que está a causar os problemas que os políticos dizem querer combater”.

Jane Ortet diz-se consciente dos problemas que Roterdão enfrenta, mas do seu ponto de vista, diz que as políticas são criadas por pessoas que operam “a partir de uma bolha branca”.

A mesma defende mais diversidade na admnistração da cidade para que os problemas possam ser enfrentados e combatidos pela raíz, em vez de se combater os sintomas dos problemas.

Se for eleita, Jane pretende trabalhar para combater essas desigualdades inumeradas. “Infelizmente, a nossa comunidade é invisível”, lamenta, avançando que a “primeira tarefa é “unir” esforços e “conversar com as câmaras municipais”, para promover a integração.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 758, de 10 de Março de 2022

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