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Santiago

Praia: Herdeiros de Silves Ferreira exigem desocupação do pedregal atribuído à britadeira privada

Os herdeiros dos terrenos de Armando de Carvalho Silves Ferreira alegam a existência de uma nova “máfia de terrenos” na Praia, envolvendo desta feita o Pedregal Agostinho Alves, nas proximidades de São Filipe, onde se encontra a britadeira da Construção Barreto. Entre os visados constam nomes de ministros, autarcas e políticos, do MpD e do PAICV. Os denunciantes realizaram na passada quinta-feira, 20, uma manifestação pública contra o que consideram ser a usurpação de um património seu.

Herdeiros de Armando de Carvalho Silves Ferreira, com raízes em São Domingos, procuraram o A NAÇÃO para denunciar o que classificam de “nova máfia de terrenos” na zona norte da Cidade da Praia.

José Filomeno Rodrigues e Luís Frederico, porta-vozes dos referidos herdeiros, alegam que há mais de quatro décadas que estão a tentar resgatar as terras deixadas por aquele seu antepassado, um grande proprietário de terrenos entre São Domingos e a cidade da Praia, falecido em 1969.

O ponto central do problema envolve os 506.444 hectares de terreno na zona de Pedregal Agostinho Alves, nas proximidades da Achada São Filipe, em que parte dela está a ser “ocupada e explorada” pela britadeira Barreto Construções e Qualinertes.

“Neste momento estamos a ver indústrias a apoderarem-se daquilo que é nosso e, ao que parece, o Estado, através da Câmara Municipal e até mesmo do Governo, está a ser conivente com isso. A britadeira da Construção Barreto, que envolve a Qualinertes, está dentro do terreno dos herdeiros Silves Ferreira”, assegura José Filomeno.

Luís Frederico questiona: “Como é que um investimento desta natureza, que conforme informações é financiado pelo Banco Mundial, consegue entrar num terreno privado?” A seu ver, esta questão envolve “jogos de interesse político”.

Luís Filipe Tavares e Zé Black – sócios

Os dois denunciantes acusam o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Filipe Tavares, e o ex-deputado do PAICV José Veiga – “Zé Black”, de estarem ligados às referidas empresas, catalogando-as de serem “meramente ‘laranjas’ para alimentar a máfia de terreno na cidade da Praia, questões manipuladas pelos políticos”.

Para a defesa da sua reivindicação os nossos entrevistados alegam ter registo predial que lhes dá posse dos terrenos. Apresentam ainda um trato de terreno e levantamento topográfico que envolve as áreas do Estádio Nacional, o ITAC, o edifício da lancha voadora, Djéu de São Filipe, e Caboeólica.

Concessão de Óscar Santos e impacto ambiental de Gilberto Silva

No entanto, segundo contaram também, ao contestarem a Barreto Construções, esta nega estar em terreno privado tendo apresentado, em sua defesa, uma concessão dada pelo ex-presidente da Câmara Municipal da Praia (CMP), Óscar Santos.

“O ministro d a A gricultura e Ambiente, Gilberto Silva, foi quem passou uma licença da DNA (Direcção Nacional do Ambiente) e na sua homologação colocou uma ressalva que diz que o ‘terreno está em conflito’. Suponhamos que ele seja também uma das partes envolvidas na empresa Qualinertes junto com Luís Filipe Tavares e Zé Black”, acrescenta José Filomeno.

Sendo assim, consideram aqueles dois cidadãos que “há todo um esquema montado para apoderar de todos os terrenos” sendo que neste momento “já deram a volta à volta do Djeu expandindo a cada dia”.

“Entrada” de Olavo Correia

Para mostrar que esta “guerra está a tomar outras proporções” José Filomeno diz que a situação já chegou ao Vice-Primeiro Ministro, Olavo Correia.

“Numa sexta-feira, ele ligou a pedir que resolvêssemos isto tudo sem envolver os meios de comunicação social. Numa segunda feira voltou a ligar para saber se a situação já estava resolvida e, por algum momento, pareceu-nos que o Barreto queria negociar. Só que até agora, nada”, alega Filomeno.

CMP não é carta fora do baralho

Questionado sobre como tem lidado com toda esta situação envolvendo a actual CMP, liderada por Francisco Carvalho, José Filomeno e Luís Frederico respondem dizendo que existe uma matriz que comprova que a Câmara já registrou os terrenos na sua conservatória.

“Só que neste momento, a autarquia não reconhece que todas as áreas em causa nos pertencem”, diz um dos denunciantes, explicando que, por causa disso, “ a actual equipa camarária não é uma carta fora do baralho».

O certo é que, jogando à cautela, os herdeiros de Silves Ferreira dizem ter ido à entidade competente, o Instituto Nacional de Gestão de Território (INGT), acionando mecanismos para a salvaguarda do seu património.

“Nós temos um mapa topográfico credenciado por esta entidade cujo levantamento foi feito segundo marcos naturais, nomeadamente, ribeiras, que pode ser encontrado no arquivo nacional. E o topógrafo fez levantamento com base nestas informações que mostram a deliberação de terrenos”, acrescenta o nosso entrevistado, referindo que neste momento o levantamento feito encontra-se no INGT para homologação.

“Demos entrada esta segunda-feira,17, no INGT, e esperamos ficar provado para novas abordagens com a CMP. A partir dali, não terão outra saída”, conta Luís Frederico referindo que a própria CMP entra neste conflito de interesse.

“Neste momento os terrenos nas proximidades do ITAC estão todos loteados. Perguntamos porque será, se em outros conflitos de terreno, confrontando o próprio Estado, a autarquia referiu que as terras de São Filipe (a Este) confrontam com os terrenos de Armando Carvalho Silves Ferreira”, explica o mesmo, sublinhando que existe nesta situação toda “muita incoerência, muitos jogos de interesse político”.

Queima de provas?

José Filomeno fala em “esquema de roubo de terrenos, falsificação de documentos e muito mais máfias”. Por exemplo, “o meu avô morreu em 1968, mas na documentação a que a nossa advogada teve acesso aparece lá que ele tem NIF. Isto só comprova que houve falsificação de documentos”, alega, fazendo uma outra denúncia:

“A actual equipa camarária diz que as certidões matriciais que reconhecem os nossos terrenos podem estar entre os que sumiram na câmara (queima de provas) na então equipa liderada por Óscar Santos”.

Segundo contam os herdeiros de Silves Ferreira, “tivemos contacto com a actual equipa da câmara e estávamos muito avançados. Só que de repente tudo deu-se para trás sem entendermos nada”.

“Na altura”, acrescenta esse denunciante, “o próprio director de cadastro passou a um dos meus primos uma declaração a reconhecer todos os hectares do nosso terreno, pois ele queria colocar uma britadeira naquela área. A declaração passada dizia que onde ele colocou um contentor para abrir uma britadeira é dos herdeiros Silves Pereira e que está dentro de um trato maior que é do mesmo herdeiro”.

E tendo em conta que a ideia deste familiar era explorar uma das áreas onde existe a melhor mina de pedras, em que “Barreto estava de olhos”, nasceu ali o conflito maior, testa de ferro com Barreto Construções.

Manifestação para reivindicar direitos

“Cansados de verem a situação a arrastar-se, com consequente perda do património que consideram ser deles, os herdeiros de Armando Silves Ferreira realizaram na manhã da passada quinta-feira, uma manifestação para expressar o seu descontentamento com o assunto.”

“Desta vez estamos unidos para recuperar o que é nosso por direito”, avisa Luís Frederico, para quem “a primeira batalha foi terem se dirigido ao INGT à procura de homologação para levantamento topográfico”.

Tendo u ma r esposta p ositiva desta entidade dizem que vão exigir da CMP uma certidão matricial reconhecendo toda a área que lhes pertencem. “Depois reuniremos entre nós os herdeiros para decidir que posição tomar com os ocupantes”, avança Frederico sem descartar a possibilidade de negociações com a britadeira em causa, tendo em conta que “esta é uma luta pacífica”.

De referir que Armando de Carvalho Silves Pereira tinha mais de 40 filhos e tendo em conta que a família multiplicou só netos apontados pelos herdeiros mais presentes nesta luta são no mínimo, 16.

Luís Filipe nega fazer parte da empresa envolvida no conflito

Após denúncia feita pelos herdeiros Silves Ferreira o A NAÇÃO tentou ouvir o contraditório junto dos envolvidos.

Via telefone, Luís Filipe Tavares começou por recusar “qualquer entrevista sobre o assunto”, avançando que sobre o caso o jornal devia “contactar directamente a empresa Barreto Construção”. Por fim, acabou por responder uma das nossas questões afirmando que não fazia parte da Qualinertes.

Na sede da Barreto Construção, na Achada Santo António, Praia, fomos informados que sobre o presente conflito de terrenos na britadeira, teríamos que falar directamente com José Veiga (Zé Black), um dos responsáveis pela Qualinertes.

Sabendo do nosso interesse, Veiga não respondeu às nossas chamadas e nem retornou até o fecho desta edição. Porém, tendo em conta que a empresa o apontou como um dos visados, é de se concluir que a ligação desse ex-deputado do PAICV à Qualinertes e, por conseguinte, ao conflito de terreno com os Silves
Ferreira.

Também por parte da Câmara Municipal da Praia não tivemos grandes avanços. Aqui foi-nos solicitado um pedido oficial de entrevista via e-mail que até ao fecho desta edição não foi respondido.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 816, de 20 de Abril de 2023

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