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Apontamentos sobre São Vicente enquanto formatação do pensamento político de Amílcar Cabral*

Por: Silvino da Luz**

Mais do que “Mocim de São Cente”, Amílcar Cabral é, estruturalmente, formatado por esta ilha que, com a sua evolução político-intelectual e o legado que foi deixando ao longo da vida, alcandorou-se a uma das maiores (senão mesmo, a maior, segundo Nelson Mandela) personalidades da História Contemporânea.

Ao ser convidado, por ocasião da celebração do XXIº Aniversário da Universidade do Mindelo, a fazer considerações sobre Amílcar Cabral, considerando o Centenário do Nascimento, em 2024, optei por fazer um recorte, entre mil facetas, do Fundador da nossa Nacionalidade, versando a influência que nele foi crucial a ilha de São Vicente, e que me suscita, agora, partilhar com os leitores.

A iniciativa dessa Universidade, de entrar de forma ativa nos estudos e pesquisas em torno de Amílcar Cabral, figura que deixou um enorme legado para Cabo Verde, a África e o Mundo, é exemplar, e deve ser devidamente conhecida e apreciada pela sociedade cabo-verdiana, não só ciosa por celebrar Cabral Centenário, mas por descortinar aspetos da sua faceta, desconhecidos alguns do grande público, e que reafirmam a genialidade da sua vida e obra, bem como a sua validade, neste nosso tempo.

Amílcar Cabral, através da gesta da Libertação Nacional, desencadeou rupturas de dimensões múltiplas, que determinaram, entre outras referências, a Independência da Guiné Bissau, em Setembro de 1973, o 25 de Abril de 1974 em Portugal, com a queda do regime fascista e a instauração da Democracia Constitucional nesse país, e as independências de Cabo Verde e das demais colónias portuguesas em África, em 1975, mudanças que ajudaram a redesenhar o mapa político mundial.

Amilcar Cabral em São Vicente em 1949

Figura complexa 

Sendo figura complexa e que exige uma análise/abordagem de vários prismas, optei por esse delineamento, a partir do qual pudesse abordar a sua ligação à ilha de São Vicente e à cidade do Mindelo. 

Colocar o holofote, sobre este Homem e a sua envolvência com este “pedaço do nosso chão”, cujo meio social, político, cultural e académico, nos anos trinta e quarenta, em que viveu e fez os seus estudos secundários, no então Liceu Gil Eanes, antes Infante Dom Henrique, entre os seus 13 a 19 anos, tempo que não deixou de ser importante para o seu amadurecimento, como homem e político-revolucionário, e para o transformar na personagem que se tornou para a História, é o que me suscita a reflexão para os pesquisadores e estudiosos, porquanto iluminaria um passado que, sem dúvida, é importante para a nossa identidade coletiva. 

Devo realçar, para melhor enquadramento, que São Vicente, ilha nascida como História dos homens no dealbar do século XIX, pela sua genealogia antropológica, começa enquadrada na dinâmica mundial como espaço/porto carvoeiro, geoestratégico para a afirmação do capitalismo, porto carvoeiro, geoestratégico para a afirmação do capitalismo nascente, recordando a Revolução Industrial que teve, como berço, a Inglaterra e suas cidades carvoeiras, designadamente Cardiff e Newcastle, olhando para o Mundo que passa, obrigatoriamente, pelo Porto Grande em expansão (porto de escala, abastecimento e transito, saiba-se).

Mindelo e Porto Grande

O porto de São Vicente, torna-se cedo um dos pontos de escala obrigatório à navegação, um dos polos do investimento externo inglês e um caso paradigmático de cosmopolitismo acelerado, o que estrutura o seu posicionamento estratégico de ponto mais importante no Atlântico Médio, eixo nodal da ligação Norte – Sul, no quadro do giro interatlântico. 

Além disso e, em muito devido ao frenesim e ao giro do porto, São Vicente desenvolveu, como em nenhum outro espaço do Arquipélago, o operariado, a consciência sindical e a luta pelo direito laboral, a cidadania local, com elevada capacidade reivindicativa, quer perante as autoridades coloniais e administrativas, quer perante as companhias carvoeiras instaladas, e a dinâmica comercial interna e internacional. 

Remontam, desse período, as primeiras greves da História de Cabo Verde, que posicionam São Vicente como a ilha significante do percurso operário-sindical do Capitalismo em consolidação. 

Os movimentos contestatários, ligados ao mundo do trabalho operário em Mindelo desde o século XIX, devem merecer, aliás, estudo demorado, até por serem efetivamente um património de memória, que deveria hoje ser obrigatoriamente assumido e transmitido às gerações que se sucedem. 

Refiro-me a 1855, ano da primeira greve no Mindelo, iniciativa que coloca o sindicalismo são-vicentino entre os primeiros na História Geral do Capitalismo, se atentarmos que as primeiras greves conhecidas  modernamente, foram levadas a cabo pelos trabalhadores britânicos em 1841 e 1842, em Manchester.  

Amílcar Cabral, através da gesta da Libertação Nacional, desencadeou rupturas de dimensões múltiplas, que determinaram, entre outras referências, a Independência da Guiné Bissau, em Setembro de 1973, o 25 de Abril de 1974 em Portugal, com a queda do regime fascista e a instauração da Democracia Constitucional nesse país, e as independências de Cabo Verde e das demais colónias portuguesas em África, em 1975, mudanças que ajudaram a redesenhar o mapa político mundial.

Trago à lembrança dos leitores, do longínquo ano de 1891, a grande manifestação de cerca de 2.000 assalariados e outros populares, invadindo a Câmara Municipal  e exigindo medidas contra a fome; de 1912, mais de 4.000 trabalhadores e desempregados, voltando a ocupar de novo os Paços do Concelho, devido à seca e falta de trabalho; de 1924 , a greve geral dos trabalhadores do carvão e, de 1926, a criação da Associação Operária Cabo-verdiana,.  Também são, de 1929, as confrontações com as forças da ordem de que resultam feridos graves, período por volta do qual viria a ser dissolvida pelas autoridades aquela Associação, a pretexto da sua pretensa responsabilidade tanto nesses acontecimentos populares, como noutros já  antes identificados pelas forças policiais. Enfim, o ano 1931, com a marcante “Revolta de Nhô Ambroze”, imortalizada pelo poema de Gabriel Mariano.

Assumir esse conhecimento histórico, ajudaria, em certa medida, a fazer contrapeso às referências, nem sempre ingénuas, com que alguns tentam minimizar o papel do povo desta ilha que, ao longo da sua sofredora existência na construção de Cabo Verde, ajudaria e contribuiria, sobremaneira, para a definição e a afirmação da Nação e do País que hoje temos, amiúde resultante da dinâmica sociológica, antropológica e cultural de São Vicente. 

Mindelo e sua gente 

A par disso, Mindelo desenvolve uma elite do funcionalismo, da cultura e da literatura, tendo sido nele a dinâmica da imprensa que projectou a geração dos Nativistas do século XIX e a geração dos Claridosos, em meados dos anos Trinta do século XX. Desenvolve também a centralidade académica em Cabo Verde, através da criação do Liceu, primeiro, Infante Dom Henrique, à sua criação e, depois, Gil Eanes, que formou alguns dos grandes intelectuais e nacionalistas cabo-verdianos, de entre eles o jovem Amílcar Cabral, assim como foi o ponto nodal da comunicação no Atlântico, através do Cabo Submarino, o que atraiu investimento inglês e italiano, e obrigou a que, no campo da geopolítica, fosse perspetivado com atenção interessada e interesseira das principais potências de então. Essas questões, que marcariam definitivamente Cabral, são de todo cruciais para melhor conhecimento da identidade nacional cabo-verdiana.

A questão geopolítica, assim como o papel de Cabo Verde no eixo transatlântico, de que São Vicente deve ser visto como espaço essencial, porquanto ponto fronteiriço da intersecção Norte–Sul do Atlântico, questão central do pensamento de Cabral, formatou, desde sempre, esta ilha tida como Equador Estratégico, no âmbito da construção do ideário do Sul Global,  um dos vectores fundamentais mais tarde no ideário de Cabral para a soberania cabo-verdiana. Este, sempre conferiu grande importância ao posicionamento geoestratégico destas ilhas e fê-lo a partir de um enquadramento africano e de país útil para a promoção da Paz e o Desenvolvimento, também para os países do Sul, hoje arregimentados em torno da ideia do Sul Global. 

Aliás, quando pensamos na perspectiva geopolítica de Amílcar Cabral, somos levados a repensar criticamente o papel de Cabo Verde. O nosso país, a meu ver, infelizmente, ainda não assumiu a sua responsabilidade geoestratégica, que o elevaria a interlocutor no quadro do diálogo Norte-Sul e Sul-Sul. Ao relativizar a sua soberania africana, Cabo Verde enfraquece a sua vocação como promotor da cooperação intrarregional e inter-regional no Atlântico, materializando o ideário da Zona de Paz e Cooperação, como um verdadeiro Equador Estratégico. Se revisitarmos Cabral, teremos a clara visão da sua perspectiva geopolítica do Atlântico e o potencial de protagonismo internacional que tal reservaria para Cabo Verde.

Amilcar Cabral e Silvino da Luz em Nouakchott, Mauritânia

O jovem Cabral

O jovem Cabral, vindo da ilha de Santiago, para fazer os estudos secundários no Mindelo é, em certa medida, a metonímia do protagonista do romance “Chiquinho”, de Baltazar Lopes da Silva, no referente ao despertar da consciência intelectual, social e, de certa forma política, no contacto com São Vicente, na altura a grande Babel Cabo-verdiana que, nas suas palavras, no romance “Chiquinho”,  realçou que São Vicente“ … era a terra em que a civilização do Mundo passa em desfile” e que “ … Mindelo, era a estação necessária para o conhecimento mais directo do Mundo”. 

É neste quadro que Cabral, chegando em São Vicente no ano 1937, a tempo de acompanhar a evolução dos Claridosos da primeira geração (os de 1936), sendo, entre outras, as suas figuras centrais Baltazar Lopes da Silva (de São Nicolau), Jorge Barbosa (de Santiago), Manuel Lopes (de Santo Antão) e Félix Monteiro (de São Vicente), está atento ao evoluir de novas gerações litero-culturais, como os ligados à Academia Cultivar e à Geração da Revista Certeza, em 1944, ano em que termina os estudos liceais e aguarda bolsa de estudo para formação universitária superior em Portugal. Com estes (sobretudo António Nunes, Arnaldo França, Eduíno Brito, Euclides Menezes, Guilherme Rocheteau, Henrique Teixeira de Sousa, José Spencer, Manuel Ferreira, Nuno Miranda, Orlanda Amarílis e Ovídio Martins, entre outros), envolve-se em tertúlias e trocas, a partir de outros afrontamentos políticos, especialmente em torno das estiagens e das fomes que assolavam Cabo Verde e que impactam o seu pensamento, já arguto e notadamente crítico, ao mesmo tempo que reforça o sentimento da sua caboverdianidade, nascida já do encontro com o Movimento Claridoso.

Abordar o refinamento intelectual e cidadão de Amílcar Cabral, remete-me a outra figura emblemática, Manuel (Manecas) Duarte, seu amigo e contemporâneo, com fina consciência da Africanidade da Cultura Cabo-verdiana e formulador da Razão Crítica na literatura destas ilhas, que terá influenciado, sobremaneira, outro ilustre filho desta ilha, Onésimo Silveira, que, em sintonia intelectual com Manecas Duarte, publicaria mais tarde o texto histórico “Consciencialização na Literatura Cabo-verdiana”, análise estrutural incontornável sobre as Letras de Cabo Verde. 

“Esprit du temps” 

Integrado ao “esprit du temps”, Cabral é dos jovens, ao tempo, despertos para a denúncia social e política e para valorizar a terra-mãe cabo-verdiana, chamando a atenção para a luta contra as adversidades existentes e buscando, nos seus escritos de então, conscientizar o povo a optar por ficar e não partir, construindo outros caminhos, inclusive de mudanças políticas. 

Nas palavras de Mário Pinto de Andrade é “no Mindelo da sua juventude, espaço estreito em que amadurecem as suas primeiras ideias emancipadoras”.

É dessa época, por volta de 1943, que Cabral submete para publicação o conto sem título, em que esboça os traços de um jovem, cuja imagem se projecta com força numa personagem por ele identificado, “Fidemar” (filho de mar), que não chegou a ser considerado pelos seus correligionários da Academia Cultivar, claramente receosos em publicar assaz afrontamento político.

“Fidemar”, é corolário da experiencia mindelense do jovem Cabral que, na verdade, já era um revolucionário em potência, caso para afirmar, sem margens para erro, que a formatação de líder revolucionário em que se fez  Cabral, nasce e caldeia-se em São Vicente, depois ganhando espaços, músculos e ressonâncias, na sua vivência estudantil em Portugal, na Casa dos Estudantes do Império e no Centro de Estudos Africanos, na sua vivência profissional na Guiné e em Angola, derivando ou culminando na criação do PAIGC, em 1956, na cidade de Bissau, e no desencadear da Luta Armada em 1963, com o célebre ataque ao Quartel de Tite, no Sul da Guiné.

“O conto, premonitório de um protogonista que resolve libertar Cabo-Verde e morre antes de atingir os seus objectivos, obcecado estava o jovem Amílcar, com a crise que assolava Cabo Verde nos anos quarenta.”

Remontam, desse período, as primeiras greves da História de Cabo Verde, que posicionam São Vicente como a ilha significante do percurso operário-sindical do Capitalismo em consolidação. 

A Historiadora Iva Cabral, sua primogénita, referindo-se ao pai e aos anos 30/40, dos respectivos estudos liceais escreveu, referindo-se a palavras dele, “Mindelo, cidade emblemática que ele chegou a definir como o coração do país, é um marco inultrapassável no seu percurso” e, referindo-se a uma das cartas que, já casado, endereçara à sua então esposa, falava-lhe dessa sua obsessão de regresso à África, nestes termos: “Mas tu sabes, como eu, quais as forças que me chamam para a África, forças a que não resistirei, porque seria trair-me, trair a própria vida”. O angolano Mário de Andrade, outro intelectual de renome, seu indefectível companheiro de sempre e das longas jornadas desde os anos da Casa dos Estudantes do Império, seu mais profundo biógrafo, ao referir-se àquela obsessão, traz até nós uma outra premunição (?) desse seu camarada de tantas caminhadas, o qual, relembrando “ … a luz benévola e afectuosa que vem da minha mãe”, o amor por ela, e a obsessão do regresso à África diz, citando as razões “Mas não é isso que me chama à África, tanto mais que, dia-a-dia, mais me convenço que não irei para Cabo Verde. O que me chama é, afinal, a própria Humanidade, solicitando, melhor, exigindo que eu cumpra o meu dever de Homem”.

Ela afirmaria que, em 1937/38, Cabral entra para o Liceu de São Vicente; escreve os primeiros cadernos de poesia, “Nos Intervalos da Arte de Minerva”e “Quando Cupido Acerta no Alvo”; em 1941, funda e é Presidente da Associação Desportiva do Liceu de Cabo Verde (A. D. A.); em 1942/43, participa e organiza actividades culturais no Liceu; escreve pequenos cadernos de poesia; em 1943/1944, adere à Academia Cultivar; e, em 1944, é estudante finalista, Presidente da Associação dos Estudantes do Liceu de Cabo Verde 

É de São Vicente, aos 19 anos de idade que, no seu “Carta para Longe”, escreve: “embrulhados na sua desprezada cor, incógnitos, esquecidos nestas lascas de terra que os mapas mal registam, os meus ascendentes passaram pelo mundo, sofreram, desejaram viver … e não viveram”, para rematar que “Ao longo da sua vida, em paragens e situações as mais diversas, a experiência vivida e a sua lembrança de São Vicente foi, frequentemente, objecto da sua atenção e, não raras vezes, apontada como exemplo”.

Assim, o próprio Amílcar Cabral, em conversa com os Combatentes da Liberdade da Pátria, que liderava, recordaria que “a nossa luta é para aquelas mães que carregam sacos no cais de São Vicente, que morrem de fome ao lado dos seus filhos no tempo da crise” e que “Em São Vivente já assisti a uma greve dos trabalhadores do porto, para obter aumento de salários. Já assisti a uma greve de mulheres, que se recusaram a descarregar os sacos.”

Vale, neste espaço, ponderar com os leitores, que o tempo histórico que hoje vivemos, exige novas respostas e outras responsabilidades. Mas, não devemos perder de vista, o legado transcendental de Amílcar Cabral. 

Temos alguns sinais de que, revisitar Cabral e aprofundar o seu pensamento continuam a ser cruciais, para enfrentarmos os desafios do presente e escrutinarmos as vias da transformação de “uma outra terra na nossa Terra”, glosando o poeta Aguinaldo Fonseca, que ele tanto admirava.

Aprender com o passado

É, pois, vital que olhemos e aprendamos com o passado, nunca deixando de valorizar a Soberania autêntica, assim como a Democracia e a Liberdade efetivas, conceitos que outrora Cabral abordou tendo, dessa altura, afirmado a sua abertura pelo pluralismo político, em determinada fase do processo histórico da vida dos povos, admitindo sempre a mutação dos regimes políticos, para melhor ajuste aos tempos históricos. Em termos de projeto maior, Cabral pensava a nossa Soberania, com possibilidades futuras de abertura para melhor interpretação dos cidadãos. Por isso, temo-lo como Pai da Nacionalidade, numa visão crítica e assertiva da nossa evolução histórico-dialéctica, vital para a nossa compreensão das valências da dimensão geoestratégica de Cabo Verde, que ele próprio apreendeu, ao observar a dinâmica da navegação e da comunicação a partir da ilha de São Vicente, e que colocaram Cabo Verde no centro da dinâmica internacional.

O significado do centenário de Cabral 

Não obstante assassinado há 50 anos, em 1973, e de as suas obras terem sido produzidas essencialmente nos anos 60, Cabral guarda actualidade, ocupando lugar entre os ANCETRES DE L’AVENIR. 

Assim, o que deve significar o seu Centenário?

Será continuando a prática que ele já denunciava, falando dos países subdesenvolvidos, que consistia em fazer dos guindados ao panteão dos heróis nacionais, depois da sua morte, ícones inofensivos, rodeando o seu nome com uma certa auréola, esvaziando-o de conteúdo ou esquecendo a sua doutrina?

Será preserverarmo-nos no sentido de manter bem viva nas jovens gerações, o conhecimento do pensamento e a obra daqueles que a memória dos povos retém, como um lúcido político que soube, aliando a política à prática, contribuir para o enriquecimento e dignificação da História do nosso país e seu povo?

Nessa perspetiva, penso que estudar esta personalidade, a partir da influência de São Vicente para a construção do seu pensamento, é mais do que legítimo. Perspectivá-lo, a partir das referências histórico-culturais do Mindelo, é introduzir uma complexidade na compreensão de uns e outros, do “constructo epistemológico” sobre Cabral, de que as universidades não podem, nem devem, ficar alheias. Estudar e perspectivar a actualidade efectiva e estratégica de Cabral, ainda para a história futura de Cabo Verde.

A par dos Cabralistas, que tenhamos Cabralólogos, gente capaz de estudar e de desvendar mais e melhor sobre a vida e a obra desta grande figura, inclusive projetar nele o papel crucial que São Vicente teve, para a sua definição como líder de estatura universal. 

Mais do que “Mocim de São Cente”, Amílcar Cabral é, estruturalmente, formatado por esta ilha que, com a sua evolução político-intelectual e o legado que foi deixando ao longo da vida, guindando-se a uma das maiores (senão mesmo, melhor, segundo Nelson Mandela) personalidades da História Contemporânea.

Como um seu grande admirador escreve, também digo que, “…celebrar o centenário de um líder com a sua dimensão e projecção, só alcança o seu sentido completo, na medida em que o seu pensamento fecunde um reflexão sempre renovada e o seu exemplo inspire compromtimentos, à altura das situações contemporâneas.”

Fica, pois, o repto por uma nova dinâmica de estudos e pesquisas, de publicações e conferências, a partir do Cabral Centenário. O repto de afirmar e instituir uma epistemologia de Cabral, cujo pensamento e escrita, hoje pleiteiam-se a Património do Mundo, através da Candidatura ao Programa Memórias do Mundo da UNESCO, um acervo que deveremos todos acarinhar e projectar, como uma das valências da nossa identidade colectiva.

 

* Súmula de uma apresentação feita durante as comemorações do XXIº Aniversário da Universidade do Mindelo, à conversa com o Embaixador Luís Fonseca.

**Combatente da Liberdade da Pátria e Primeiro Comandante, antigo Deputado à Assembleia Nacional Popular (1975-1995), antigo Ministro da Defesa e Segurança Nacional (1975-1980), antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros (1980-1991) e antigo Embaixador de Cabo Verde em Angola (2001-2007, acreditado em vários países da África Austral)            

 

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 850, de 14 de Dezembro de 2023

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