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Diáspora

Nova lei dos Estrangeiros em Portugal: “Vai ser um enorme retrocesso”

Para Felismina Mendes, presidente da Associação Cabo-verdiana de Setúbal, o impacto da nova lei da emigração em Portugal vai ser enorme, incluindo na comunidade cabo-verdiana. “Vai ser um enorme retrocesso naquilo que se conseguiu em muitos anos de luta, em que avançámos muito; um retrocesso por influência da extrema-direita, que vive numa campanha permanente contra os imigrantes. O PSD acabou por ir beber também no partido de André Ventura, o Chega, toda a questão securitária.”

Felismina Mendes

No entanto, a dirigente cabo-verdiana vai dizendo que “estamos e vamos continuar aqui a esclarecer os imigrantes sobre esta nova lei e ver até onde se pode ir; penso que daqui a algum tempo esta lei poderá vir a ser revista”. Aponta que o que terá levado a esta situação foram os milhares de casos pendentes desde a extinção do antigo SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) e que veio “culminar no caos. Mas o certo é que Portugal precisa de imigrantes”.

Questionada sobre a afirmação do ex-embaixador Eurico Monteiro, actual ministro da Promoção de Investimento e Fomento, de que Cabo Verde poderá receber os emigrantes expulsos de Portugal, Felismina acha que o ministro se referia àqueles que acabados de chegar ainda têm vínculos com Cabo Verde.

“Com os outros, acho muito mais difícil”, afirma. “Os que vão ser convidados a sair são os que vieram de férias ou para ‘estudar’, entre eles estão muitos angolanos também, mas sabemos que na verdade não vêm para estudar e nós avisamos que não há possibilidade de reverterem esse visto, o melhor é irem embora e não ficar por aqui de forma irregular, aconselhamos a sair e tentar depois, quando tudo isto estabilizar”.

 Novas regras 

A nova Lei dos Estrangeiros, promulgada o mês passado pelo presidente Marcelo Rebelo de Sousa, impõe regras mais rígidas à entrada e permanência de imigrantes. Começa por limitar o reagrupamento familiar e endurece a concessão de vistos, o que significa uma mudança profunda na política migratória portuguesa. Na altura, o porta-voz do governo, António Leitão Amado, falou em “imigração regulamentada, com mais controle, mais segurança, mas também com mais dignidade para quem chega”.

Adiantou ainda que o novo texto legal representa apenas o início de uma série de reformas, num processo que já havia começado com o fim do sistema conhecido como “manifestação de interesse”, que permitia a regularização de estrangeiros após um ano de contribuição para a Previdência Social. Apoiada pelo partido Chega, a nova legislação foi aprovada no parlamento português no final de setembro e defende um controlo rigoroso das fronteiras.

E para além da limitação ao reagrupamento familiar, os estrangeiros que pretendam vir para Portugal devem obter o visto de residência ainda no país de origem. Na altura, o porta-voz do governo disse que “não basta vir a Portugal para fazer turismo e depois ver o que acontece, vir com isenção de visto e depois ver o que acontece.” Adiantou ainda que “Para viajar para Portugal para residir é preciso vir para trabalhar ou estudar”.

Outra das reformas introduzidas foi a extinção do “visto de procura de trabalho indiscriminada”, um mecanismo que permitia a entrada de estrangeiros sem uma oferta de emprego prévia. Agora, o visto de trabalho passa a ser reservado apenas para profissões, funções, com elevada qualificação, onde haja uma oferta de trabalho evidente e necessária para a economia nacional.  

Estudo encomendado pela Federação aguarda socialização

Trata-se de um importante instrumento que a FOCV – Federação das Organizações Cabo-verdianas em Portugal tem para orientar a rede de associações, de forma a melhorarem o seu desempenho e não só. Com a apoio da Câmara Municipal de Lisboa, fundos europeus e a impressão paga pela embaixada de Cabo Verde e Ministério das Comunidades, o estudo faz uma radiografia da vida associativa cabo-verdiana neste país, deixando recomendações de actuação.

A ideia resultou das mudanças políticas que se começaram a fazer sentir em Portugal, nos últimos anos, e que afectou as associações cabo-verdianas no terreno. “Muitas não conseguiram fazer as suas candidaturas, apresentar projectos, a fundos de financiamento europeus, não estavam preparadas para enfrentar as mudanças e o estudo vem para ensinar onde e como actuar, saber do estado das coisas, saber onde a Federação pode ajudar,” explica Felismina Mendes, a presidente da FOCV.

Atraso na socialização

Mas, desde 2022, data da conclusão, o trabalho, pode dizer-se, ainda não produziu ‘frutos’. “Tínhamos previsto um encontro de dois dias para debater as recomendações, mas entretanto surgiu a criação de uma outra plataforma, por outro dirigente associativo e as atenções dispersaram-se, para além do facto de alguns dirigentes terem, entretanto, falecido, como o Rui Machado e a Antónia Pimentel”. Questionada sobre o que separa a FOCV desta nova plataforma, Felismina diz que são dois organismos diferentes.

“A plataforma aspira a ser transnacional, a unir a diáspora, mas bebendo de várias experiências no terreno, no fundo a fazer que já existe, que é o Congresso de Quadros, que liga as comunidades espalhadas.” Entende que não faz sentido criar nova estrutura, até porque as comunidades estão em países diferentes, como modelos de apoio às associações diferentes, sendo apenas uma “plataforma digital de informação”. Por outro lado, adianta, a FOCV prepara-se para ter eleições, no próximo ano, e introduzir alterações nos seus estatutos.  

“Tendo presidentes de associações a ocupar os órgãos sociais da FOCV não ajudou nada, na medida em que estes já estão assoberbados de trabalho nas associações. Vamos criar um corpo técnico para a FOCV e levar as demandas das associações, um secretariado associativo, e aí já iremos poder ter uma Federação mais ágil e aproveitar todas as recomendações do estudo”, conclui. 

Joaquim Arena

Publicado na Edição 950 do Jornal A Nação, de 13 de Novembro de 2025

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