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Economia

A economia em lay-off

Em 2020, a economia cabo-verdiana esteve confinada, juntamente com a população, muito por culpa da covid-19. Este foi o ano de lay-offs, linhas de créditos e moratórias, mas também do aumento da dívida pública e consequente recessão económica. Avanços de vários anos foram levados pela pandemia que pôs o mundo de rastos.

Cabo Verde começou 2020 entre boas notícias para a economia, que perspectivava um crescimento de até 5,8%. No ritmo das boas novas, o país ractificou em Fevereiro um acordo de facilitação de comércio da Organização Mundial do Comércio (OMC) para simplificar e clarificar os procedimentos internacionais de importação e exportação.

No mesmo mês, o país saiu da lista negra de paraísos fiscais da União Europeia, considerado um passo sólido para a transparência internacional.

Contudo, à semelhança de outros países, o ano de 2020 viria a revelar-se particularmente duro. Com a suspensão de voos internacionais, registo do primeiro caso de covid-19 no arquipélago e consequente proclamação do Estado de Emergência, a economia paralisou-se quase que na totalidade. Do sector formal ao informal, ninguém escapou à crise.

Com o fecho das fronteiras cabo-verdianas com o mundo, o turismo, principal motor da economia cabo-verdiana, desapareceu do mapa. Os sectores relacionados com a hotelaria, restauração, transportes, guias e cultura, de entre outras empresas de sectores diferenciados, entraram em sufoco financeiro, sem receitas e com dívidas, nomeadamente com trabalhadores.

Em decorrência das dificuldades, o Governo tomou medidas, desde Março, para salvaguardar empresas, trabalhadores e famílias dos impactos da pandemia.

O lay-off foi uma dessas medidas, assim como a isenção temporária de pagamento de contribuições para o INPS por parte das entidades empregadoras, concessão de linhas de créditos e políticas de atribuição de moratórias.

No setor informal, foi atribuído um Rendimento Social de Inclusão, Rendimento Solidário e assistência alimentar às famílias.

Linhas de créditos e moratórias

Neste ano que ora finda, os bancos começaram em Março a lançar linhas de crédito para as empresas afectadas pela covid-19 em até 36 milhões de euros, com a garantia do Estado que poderia chegar aos 100 por cento do financiamento.

No mesmo sentido de proteger empresas, foram concedidas desde Abril, segundo a Pró-empresa, 660 moratórias por parte dos bancos comerciais, que ultrapassaram os 14, 447 milhões de escudos, válido até 31 de Dezembro de 2020 e prorrogado para Setembro de 2021.

Ano dos lay-offs

Por sua vez, para salvaguardar os trabalhadores, foram aprovados três lay-offs, desde Abril de 2020. O primeiro decorreu de 01 de Abril a 30 de Junho, beneficiando um total de 15.991 trabalhadores afectados pela Covid-19, que passaram a receber 70 % do salário bruto.

A segunda fase do lay-off de 01 de Julho a 30 de Setembro, que viria a entrar em vigor a 24 de Julho com efeitos retroativos até o primeiro dia deste mês, beneficiou 7.430 trabalhadores das empresas do sector turístico com perdas de 40% na faturação e proibiu despedimentos. As duas fases custaram, ao INPS, 990 mil contos.

Numa terceira fase, a 30 de Outubro, entra em vigor um lay-off que prevê a possibilidade de trabalho parcial que não ultrapasse os 40% da carga laboral, com efeitos retroativos a 01 de Outubro, data da validação do lay-off de Setembro. Nesta fase, o número de beneficiários contemplados foi menor e prorrogado até o último dia de 2020.

Redução IVA no turismo

Em Junho, o Governo anunciou a redução de 10% no Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) nas taxas aplicadas na prestação de serviço de alojamento em estabelecimentos hoteleiros e similares, restauração, empresas de eventos e titulares do Estatuto de Utilidade Turística. Uma redução enquadrada nas medidas fiscais do orçamento retificativo, representando uma queda de 3,5 milhões de euros na receita fiscal do país.

Ainda, no que toca ao turismo, o Governo anunciava um programa de apoio e promoção do turismo interno para incentivar o turismo nacional, já que os voos internacionais só seriam retomados a 12 de Outubro.

Orçamento retificativo

Para mitigar a crise económica provocada pela covid-19, um orçamento retificativo é apresentado no parlamento. A 30 de Julho o documento foi aprovado com 37 votos favoráveis do MpD e da UCID e 22 abstenções do PAICV. O orçamento rectificativo ascendia os 75.084.978.510 escudos entre despesas e receitas incluindo endividamento, o que representou um aumento de 2,6 % na dotação inscrita no então orçamento em vigor.

Aumento da dívida pública

Até Agosto, a dívida pública aumentou 9,422 milhões de escudos, equivalente a 146 % do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Banco Central. O volume da dívida do Governo central atingiu em Agosto os 264,2 mil milhões de escudos, influenciado pela perda de receitas  fiscais  devido às restrições envolvendo a pandemia da Covid-19.

Ajuda à Cabo Verde Airlines

Em Outubro, o país reabriu-se aos voos internacionais, contudo a Cabo Verde Airlines (CVA) não chegou a realizar operações por dificuldades económicas. O Governo autorizou, neste sentido, a companhia, através da Direção-Geral do Tesouro, a contrair um empréstimo de emergência, junto a Caixa Económica, no valor de 100 milhões de escudos para pagamento de salários em atraso e na criação de condições para a empresa enfrentar as consequências da pandemia.

Recessão económica

Os impactos de um 2020 negativo para Cabo Verde levaram as autoridades a perspetivarem uma recessão económica entre os 6,6% a 8,5% e um consequente aumento da taxa de desemprego de 11% para 20 %, assim como um disparo do défice orçamental para 11,4% do PIB.

A economia iniciou uma retoma gradual, com as empresas a retomarem às atividades de forma tímida, colocando as esperanças na retoma do turismo e com a criação de medidas para atrair os turistas para Cabo Verde, evitando que 2021 seja um ano amargo para a economia do país.                               

Volume de negócios em queda acentuada

Tanto o sector público como o privado tiveram o volume de negócios diminuído se comparado com 2019. No privado, as quedas foram acentuadas, com o empresário e Presidente da Câmara do Comércio de Sotavento, Jorge Spencer Lima, a acusar o Governo de ter dado com uma mão e retirado com a outra os apoios às empresas.

Dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE) revelaram que entre 01 de Abril e 30 de Junho o sector dos serviços teve uma queda de 50,6% no volume de negócios, se comparado com o mesmo período de 2019.

De  modo geral, ainda segundo o INE, cerca de 68% das empresas reduziram o volume de negócio devido à pandemia da Covid-19, com a falta de clientes e das restrições impostas no combate à pandemia.

Ainda em 2020, a pandemia impossibilitou a banca cabo-verdiana de distribuir lucros recorde de 30 milhões de euros conseguidos em 2019 entre os accionistas dos sete bancos que trabalham com clientes residentes em Cabo Verde, devido aos riscos associados à covid-19. 

Comentando as dificuldades deste ano tão difícil, Jorge Spencer Lima, disse que o Governo “deu com uma mão e tirou com a outra” na questão de apoios às empresas na sequência da pandemia da covid-19.

“No início tivemos sempre ao lado do Governo e apoiamos o Governo, mas o Governo, a partir de algum momento, deixou de ouvir. Nós demos vários pareceres que o Governo não levou em conta, fez o que quis em determinado momento. Sobretudo na questão de apoio às empresas, o Governo deu como uma mão e tirou com outra, impôs muitas restrições, muitas dificuldades”, ressaltou.

Segundo Jorge Spencer Lima, em entrevista à Inforpress, as medidas impostas no quadro de ajuda às empresas fizeram com que “um número significativo” de empresas ficasse de fora.

Spencer Lima prevê, por isso, um 2021 igualmente difícil para o sector económico, sendo provável que muitas empresas vão ter que despedir os seus trabalhadores face ao agravamento dos problemas.

 “A questão que se põe é que quando começar a retoma, as empresas vão fazer novos investimentos, sobretudo na área do turismo, para que elas estejam em condições”, finalizou o presidente da Câmara de Comércio do Sotavento.       

(Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 696, de 31 de Dezembro de 2020)

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