PUB

Colunistas

Levarei em devida conta a Plataforma Eleitoral que: 9) Altere, para melhor, a estrutura do mercado do trabalho.

Por: António Carlos Gomes

Todos os anos, normalmente no mês de abril, o Instituto Nacional de Estatísticas publica informações relevantes, para o planeamento, sobre o mercado do trabalho.

Infelizmente, os atores políticos e a Imprensa concentram-se nos dados sobre o desemprego deixando de fora a análise do mercado do trabalho no seu conjunto.

Fica, por esta razão, fora do debate e da reflexão a apreciação da estrutura do mercado do trabalho e o seu contributo na cimentação da desigualdade, da exclusão e da pobreza que estes dois males provocam.

Fica também fora da reflexão o facto de 42,6% (172.356 cidadãos) do potencial humano, em idade de trabalhar, não estar disponível para o mercado do trabalho ou, ainda, que 53,7% dos empregos em Cabo Verde são empregos informais, isto é “que não beneficiam de proteção social (inscrição no INPS ou beneficiam de férias anuais pagas e dias de repouso por motivos de doença pagos)” (Relatório do INE 2020).

Dito de outra forma, o trabalho não é garantia de estabilidade e de segurança para as famílias. Este facto está diretamente ligado à situação da pobreza e da precariedade que assolam muitas das famílias cabo-verdianas.

A desagregação da informalidade, ao nível dos concelhos, põe a nu a desigualdade entre os municípios e evidencia, claramente, a inadequação, ontem como hoje, das políticas públicas.

Informalidade no mercado de trabalho

Com efeito, nos dezoito (18) municípios da periferia reina a informalidade no mercado do trabalho. Assim, em dez (10) dos dezoito municípios da periferia, dois terços (2/3) ou mais dos empregos existentes estão no setor informal. Em cinco (5) destes dez municípios, o setor informal contribui com mais de 80% do emprego existente. Em quatro dos oito restantes concelhos, a contribuição do setor informal para o emprego está a 1-3 pontos percentuais dos fatídicos dois terços e, nos outros quatro, o contributo do setor informal para o emprego é superior a 57%. Isto é, fora dos 4 pólos (Boa Vista, Sal, Praia e São Vicente) não há nada, rigorosamente nada.

Este facto evidencia, por si só, a inadequação, ontem como hoje, dos pacotes de incentivos aos investimentos privados e a razão pela qual estamos a patinar no processo de desenvolvimento.

Na verdade, apenas Sal (27,2%) e Boa Vista (20,8%) escapam esta endemia económica da informalidade porquanto, em São Vicente, 44,9% dos empregos existentes foram criados no setor informal e, na Praia, o peso do informal no mercado do trabalho é de 54,0%.

Enquanto este quadro, (esta estrutura do mercado do trabalho) não for mudado, façam os políticos o discurso que quiserem e o Parlamento o debate que lhe agrada, não iremos a lado algum. Deveríamos todos, estar cientes disso.

Na verdade, o município com mais de 2/3 dos empregos existentes criados no setor informal é um espaço económico morto. Não há vitalidade económica e não se vencerá nem a pobreza nem os desafios de desenvolvimento económico nestes territórios municipais.

Porém, não obstante o facto de o setor informal ser o mais dinâmico na criação de aquilo que, sem pudor, se chama de emprego apesar da precariedade que encarna, não se deve cair no erro de atacar os incentivos atribuídos, por exemplo, ao setor do turismo porquanto nenhum país se desenvolveu em virtude do alto grau de informalidade da sua economia, antes pelo contrário, e o turismo tem potencialidades para propulsar outros setores.

Concelhos e ilhas com menos vocação turística

O mal não está, como alguns querem convencer-nos, nos incentivos atribuídos ao setor do turismo, mas sim em concentrar as baterias neste setor negligenciando a exploração das potencialidades dos concelhos e ilhas com menos vocação turística.

Quando assim é, a informalidade reina e o desenvolvimento fica adiado e, com isso, comprometido o bem-estar das pessoas que vivem na periferia

A verdade crua é a indiscutível ausência de vitalidade económica nos 18 municípios da periferia causada pela ausência de investimentos privados, pela elevada taxa de mortalidade das iniciativas empresariais dos privados e pela penúria de oportunidades de investimentos e de acesso a crédito bancário.

Se não for possível, na perspetiva dos investidores privados, aumentar a atratividade da periferia aos investimentos privados, é evidente, porque inteligente, que, num quadro como este, o Estado vai ter que criar empresas na maior parte destes municípios. E não há nenhum mal nisso.

O mal é deixar uma massa enorme da população a viver do desenrascanço e de biscate para poder enganar o estômago.

Mas investir na melhoria da capacidade de captação de investimentos privados da periferia implica necessariamente revisitar a política de incentivos e, obviamente, de infraestruturação do País como um todo.

Estas visitas terão que ser feitas pelo dever que recai sobre todos nós de libertar o País da informalidade pelo que verei com bons olhos a plataforma eleitoral que tenha como propósito alterar a estrutura do mercado do trabalho.

(Fim)

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 698, de 14 de Janeiro de 2021

PUB

PUB

PUB

To Top