PUB

Economia

João Carrilho, da Eurocash: “Ainda não sentimos retracção nas compras”

A Eurocash, um dos importadores de produtos alimentícios, com peso no mercado nacional, já está a sentir um aumento “tenebroso” dos preços, devido aos impactos da guerra na Ucrânia. Contudo, segundo o administrador João Carrilho, ainda não sente a retracção nas compras dos clientes, mas o cenário pode vir a mudar. E avisa que “o futuro é muito incerto”.

“Os ucranianos são grandes produtores de frango, o que é normal, porque produzem muitos cereais. E já importámos frango da Ucrânia, não muito, mas agora, não. Importamos mais de Brasil e Portugal”, começa por dizer, ao A NAÇÃO, alertando que as preocupações mais importantes são outras.

“A maior tendência da Ucrânia é o óleo e isso é que é o grande problema. Nós não trabalhamos muito com óleo, enquanto produto primário, mas trabalhamos muito com muitos produtos derivados do óleo”, o que garante já está a impactar nos preços.

A Ucrânia, segundo diz, tem cerca de 40 a 50% da produção mundial do óleo de girassol, que tem muito a ver com “a maioria dos produtos que trabalhamos no dia a dia”, como, por exemplo, “as simples batatas pré-fritas que utilizam o óleo de girassol”.

Hoje, garante, não se consegue praticamente importar o óleo tradicional. “Tenho alguns amigos que trabalham com óleo e não o conseguem e, por isso, o preço disparou, completamente”.

Questionado sobre os impactos da guerra na Europa nas importações da Eurocash, Carrilho é peremptório: o aumento é em “todos os produtos”.

“A indisponibilidade de contentores no mercado internacional, aliado a outros factores, como o aumento da energia, do gás, da electricidade, etc., só veio piorar com a guerra”, afirma.

João Carrilho admite que as pessoas reclamam claramente do aumento dos preços, mas diz que ainda não se sente uma retracção nas compras, em termos de volumes, e que os clientes continuam a comprar igual.

“O tempero, por exemplo, que se consome muito em Cabo Verde, o que não se devia consumir porque aquilo é óleo, praticamente, e como tem base de óleo, agora está praticamente ao custo do azeite”. 

A cada compra que fazem enquanto importadores, os preços, garante, “estão aumentar”.

Futuro incerto

João Carrilho diz estar com algum receio do que vai ser o futuro. “Por exemplo, na Ucrânia, como era um dos principais fornecedores de óleos, o que vai acontecer é que, provavelmente, durante um ou dois anos, não vai ser produtor”.

Isto, a seu ver, pode indicar desde já que, em relação aos óleos, “vamos voltar à palma”, que “era um produto que estávamos a tentar afastar”, mas “acredito que vai a ser inserido, com muito mais força, no mercado. Talvez haja necessidade de trazer produtos de outros países para substituir, mas não é fácil. Todos estão sofrendo neste momento”.

Esse operador alerta ainda para outro problema que tem a ver com os fertilizantes, tanto Ucrânia e Rússia, que são fortes produtores mundiais. “Com o aumento dos fertilizantes, os agricultores vão aumentar o preço dos produtos. É um problema sistemático, que vai ser contínuo, porque tudo está a aumentar, neste caso os fertilizantes, depois passa pelo produto até chegar ao consumidor final”, alerta.

Questionado se ainda consegue manter as mesmas margens de lucro, diz que não. “Se as margens fossem mantidas era um bocado injusto para o nosso próprio cliente até chegar ao cliente final. Imagine que temos 5% de margem sob 100, e, de repente, o produto passa a 250. Se tivermos a mesma margem de 20, é lógico que nós estaríamos a especular, se houver o mesmo consumo. Mas isso não vai acontecer porque o produto vai começar a parar. É impossível”, sublinha.

Quanto à regulação de preços, o nosso interlocutor, diz que há determinadas situações em que “pode, ou deveria, haver algum olhar do governo”.

“Mas acredito que num mercado como o nosso, altamente concorrencial e que há muitos operadores nos mesmos sectores, não há grande necessidade de fazer isso”. Até porque, como conclui, não acredita que a especulação “nos faça ganhar muito mais. A subida dos preços está a acontecer porque na origem estão também caros”.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 760, de 24 de Março de 2022

PUB

PUB

PUB

To Top