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Economia

João Domingos, PCA da CVT: “O regulador vem facilitando a vida à concorrência”

Com a fusão das empresas da CVTelecom (CVT), este grupo reduziu vários custos operacionais e de estrutura que vinham sendo repassados ao consumidor. João Domingos Correia, Presidente do Conselho de Administração, acredita que esta fusão abriu as portas a uma nova largada que passa pelos negócios digitais e internet. Em entrevista ao A NAÇÃO, Correia fala inclusive no aumento dos lucros para os acionistas e aproveita a oportunidade para mandar alguns recados ao regulador. Sobre a redução de custos de internet, alerta que não depende só da CVT, mas perspectiva que a convergência dos serviços deverá fazer baixar os preços. 

Que estratégia e visão estão por detrás do lançamento da primeira marca comercial da CVTelecom?

A marca comercial Alou/Alô é para todas as empresas que vinham operando no Grupo CVTelecom (CVT). 

O momento é oportuno tendo em conta a extinção das duas subsidiárias (CVMultimédia e ZAP), que se integraram na empresa mãe. Certamente recordarão que o processo de separação no início de 2006 ocorreu por uma imposição legal uma vez que os negócios todos já existiam na CVT, ou seja, o negócio móvel e o negócio da Internet. 

Através de uma medida legislativa que tinha como objectivo abrir o mercado à concorrência, nós fomos obrigados (com um pouco de exagero) a separar os negócios em várias componentes empresariais para poder facilitar a entrada no mercado de outros operadores de telecomunicações que foi o que ocorreu na altura com a entrada da Tmais. 

Entretanto, seguindo um pouco aquilo que se passa lá fora, sobretudo na Europa, nós entendemos que não faz sentido termos os negócios separados sob a forma de empresa, para facilitar a concorrência. 

A concorrência estabelece-se pela lei do mercado através de um provedor de serviço e um comprador desse serviço que procura encontrar o melhor preço no mercado. Portanto, havendo várias ofertas do mercado, o consumidor sente-se livre para adquirir o que melhor entender, olhando sobretudo para a qualidade e para o preço. 

Há cerca de 4/5 anos, entrámos em contato com o Governo no sentido de se proceder à revisão da legislação. Foi o que ocorreu, em parte sob orientações do Banco Mundial e outros parceiros de Cabo Verde, porque foram medidas que, até um certo ponto de vista, eram tidas como antieconómicas.

Como assim, o que quer dizer com isso?

Nós vínhamos assumindo custos excessivos com a gestão de três empresas e esses custos estavam sendo repassados aos consumidores. Depois da revisão da lei, voltámos a encontrar a possibilidade de reunir os negócios numa única empresa, pelo que entendemos que é o momento oportuno para entrarmos com uma marca comercial que represente todas os negócios da empresa. 

Ganhos de eficiência e poupança 

A CVTelecom passa a ter mais eficiência e poupança?

Exacto. Em primeiro lugar, para facilitar o relacionamento da empresa com os clientes, proporcionar-lhes uma certa comodidade e facilidade nesse relacionamento. Em segundo lugar, estão os ganhos de tempo e poupança de recursos, ou seja, estas medidas trazem um conjunto de vantagens para os clientes.

Em termos económicos, o que é que esta fusão já está a trazer?

Antes, para cada empresa, tínhamos vários processos com os clientes e vários processos com os fornecedores. Neste momento, passamos a ter um único processo, isto é, reduzimos a burocracia. 

Por outro lado, tínhamos custos de gestão para cada uma das empresas. Além da Comissão Executiva para a CVTelecom, tínhamos diretores gerais para as outras duas empresas. 

Igualmente, tínhamos cinco direções comerciais, uma para cada empresa, e uma direção de marketing que dava suporte a estas empresas. Também tínhamos um call center que dava suporte a todas as empresas. 

Portanto, reduzimos substancialmente os custos operacionais que existiam antes sob a forma de negócios separados. Neste momento, já temos esses ganhos que podem ser perfeitamente partilhados com os nossos clientes.

Em síntese, que outros ganhos vão ser partilhados com os clientes?

Como referi anteriormente, os clientes vão ter mais comodidade e facilidade e, obviamente, um terceiro ganho de que ainda não falei, é o facto de passarmos a apresentar aos clientes ofertas sob forma de pacotes que antes não era possível porque as empresas não podiam apresentar ofertas conjuntas. 

Essa oferta de serviços em forma de pacotes permite ao cliente fazer a gestão da sua carteira de serviço e direcionar os seus recursos para a componente que mais lhe interessa. Vai ser seguramente mais barato porque o cliente não terá três contratos e mais eficiente porque caberá ao cliente fazer a gestão do seu pacote durante o mês.

Baixa de preços não depende só da CVT

Do ponto de vista financeiro as famílias cabo-verdianas vão pagar menos?

Acredito que sim e nós já estamos a trabalhar nisso. Mas devo dizer que não depende exclusivamente da Cabo Verde Telecom. 

Então, depende de mais quem?

Estamos a trabalhar num mercado que é regulado, portanto, dependemos, em parte, das decisões da regulação. Mas vamos apresentar ao regulador ofertas com preços mais reduzidos e esperar para ver.

Iremos sensibilizar o regulador, justificando, as razões dessas ofertas para que os cabo-verdianos sintam, efetivamente, o efeito da fusão e da convergência das empresas do Grupo CVT.

Isso passa, por exemplo, por uma Internet mais barata?

Seguramente. Do ponto de vista dos clientes, o consumo de dados vai ser o principal serviço que poderá sofrer alguma alteração para melhor. 

Porquê? 

Porque é o que os clientes usam mais. Hoje em dia, as pessoas navegam cada vez mais e, sem internet, sentem que, praticamente lhes falta um bem essencial. É como se faltasse água ou energia em casa.

Então, podemos esperar melhorias nos preços?

Vamos trabalhar nesse sentido, conjuntamente com o regulador e com o Governo também. O regulador não depende do Governo, mas sendo uma entidade que trabalha para a promoção do desenvolvimento da economia nacional, há-de seguir as orientações quanto à intervenção no mercado em alinhamento com aquilo que são as opções políticas do Governo.

Mas isso também depende da concorrência ou não?

Não dependerá da concorrência, mas sobretudo da posição do regulador em relação aos preços a praticar no mercado.

Esta fusão posiciona-vos de uma forma mais competitiva em relação à concorrência?

Não creio que isso terá impacto no negócio da concorrência. Já somos uma empresa com uma posição bem consolidada no mercado. Aliás, este processo, devo dizer, tem na mira sobretudo o mercado internacional, porque precisamos de ter ganhos de eficiência interna para podermos ser competitivos lá fora.

Internacionalização dos negócios da CVTelecom

O que quer dizer com isso?

Quero dizer que temos que internacionalizar os nossos negócios para ganharmos em escala. O mercado nacional é extremamente reduzido e não permite fazer negócios que rentabilizem ou que promovam retorno acelerado sobre os investimentos feitos. 

Somos um mercado com 500 mil pessoas, mas temos um grande mercado, aqui ao lado, que é a CEDEAO. Temos o mercado da América Latina, mais maduro é certo, mas onde podemos ir à luta. Também temos o próprio mercado da Europa. Temos que ganhar alguma coisa com o nosso aprendizado nesses mercados. Neste momento, no que diz respeito ao mercado nacional, o essencial é facilitar a vida aos nossos clientes.

Quando fala da internacionalização, esta a referir-se aos cabos-submarinos?

É bom esclarecer esta questão. Além do mercado nacional, também precisamos vender, lá fora, a capacidade que temos nos cabos submarinos internacionais, que é excedentária.  Se essa capacidade não for vendida lá fora, teremos que repassar os custos para os cabo-verdianos e, assim, os preços dos serviços não baixariam.

Para que estes custos baixem, efetivamente, de forma significativa e para que os clientes possam sentir isso, é preciso que haja alguém a comprar o nosso serviço juntamente com os cabo-verdianos e, consequentemente, podermos distribuir o custo per capita, baixando aquilo que seria o nível dos preços a praticar junto dos clientes.

Como é que tem sido a vossa relação com a entidade reguladora?

Tem sido uma relação normal. Somos regulados e temos a ambição de ir rapidamente e de ganhar mercado e clientes. O regulador, quando olha para o mercado, tem a preocupação de proteger a concorrência, introduzindo medidas de correção.

Mas, entendemos que, algumas vezes, essas medidas são excessivas porque não só prejudicam a empresa, mas também os clientes. Portanto, sempre tentamos abrir um canal de diálogo para encontrar a melhor solução e um equilíbrio onde todas as partes se sintam satisfeitas com as medidas introduzidas.

Regulador não protege a CVT 

Porque é que muita gente diz que o regulador protege a CVT? 

Isso é completamente falso. Se perguntar aos nossos colaboradores e clientes, constatará que têm uma opinião contrária. Vou dar-lhe dois exemplos: em 2013, introduzimos um pedido do serviço Voip, o regulador não nos autorizou, mas autorizou a concorrência.

Quando se lançou o concurso da rede móvel 3G, nós vencemos, mas, entretanto, atribuiu-se à concorrência, que não ganhou o concurso.  Esses são os dois exemplos mais caricatos. 

Neste momento, não temos qualquer dívida para com o regulador e, até fazemos adiantamentos, por conta do regulador, mas a concorrência não vem pagando as dívidas que tem para com o regulador pelos serviços prestados. 

O regulador vem facilitando a vida à concorrência talvez para se justificar que existe concorrência no mercado, em prejuízo até dos cabo-verdianos, porque a concorrência não pode ser forçada.

Acha que é uma facilitação para evitar que se volte ao monopólio?

Talvez seja esse o receio…

Futuro promissor

Quais são as perspetivas para esta nova CVT com a fusão e esta primeira marca comercial?

A empresa entrou numa nova era, uma era digital, uma era de conquista do mercado internacional. Tem que ser isso, necessariamente, particularmente aqui na nossa região Africana.

Entendo que os acionistas podem vir a ser melhor remunerados, comparativamente àquilo que tem acontecido nos últimos 6 a 7 anos, pelo menos.

Temos tido uma boa colaboração dos acionistas, distribuindo apenas metade dos recursos porque perdemos parte substancial da receita por causa da entrada no mercado das OTT (Over-The-Top – serviço de media que faz distribuição de conteúdos pela internet) eliminando praticamente a componente voz. Hoje em dia, ninguém pega no telefone para ligar diretamente a um cliente, vai ao WhatsApp ou vai ao Messenger.

Por isso, acredito, seguramente, que o nosso volume de negócios poderá voltar a incrementar substancialmente nos próximos tempos com esta nova largada da marca Alô, conjuntamente com uma outra marca, que é a marca de venda grossista, a Cabo Verde World Connect. 

Disse que os acionistas podem vir a ser melhor remunerados. Isso é sinal de que as finanças da CVT estão de boa saúde? 

Estamos numa situação ascendente. As contas de 2022, depois de 5/6 anos, voltaram a colocar-nos acima dos 5 milhões de contos de receitas, o que é um bom sinal. Os sinais que temos recolhido no mercado apontam no sentido de voltarmos a crescer este ano praticamente na mesma proporção que no ano anterior.

Existe um mercado interno ainda por explorar e vamos trabalhar nesse sentido. Por outro lado, há um mercado externo, também por descobrir e explorar, que pode agregar mais valor aos nossos negócios.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 829, de 20 de Julho de 2022

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