PUB

Colunistas

Teletrabalho definitivo, porque não?

Por: Natacha Magalhães

O dia em que tudo mudou

 Uma das consequências mais notórias da pandemia causada pelo covid19 foi a adoção do sistema de teletrabalho. Várias foram as instituições que, assim que foi decretado o primeiro estado de emergência, se organizaram e criaram condições – computador e ligação à internet – para que os seus colaboradores pudessem, a partir de casa, cumprir tarefas previamente atribuídas. 

Muitos foram os trabalhadores que, cumprindo as medidas de confinamento, asseguraram, a partir de suas casas, que os processos continuassem para que outras tantas pudessem ter acesso serviços e bens. 

É justo reconhecer o trabalho abnegado de dezenas deles, particularmente os que trabalharam para assegurar que todas as pessoas inscritas no Cadastro Social e não só,  pudessem beneficiar das medidas delineadas pelo Governo. 

Porém, aproveito para fazer aqui um parênteses para reconhecer os outros que, dada as funções muito específicas que exercem, não puderam permanecer no confinamento e, arriscando a sua  saúde, trabalharam durante todo este tempo para permitir que o país não parasse e nós os outros tivéssemos acesso a bens essenciais ao nosso dia a dia. 

Refiro-me concretamente aos profissionais das empresas de eletricidade, água, gás, telecomunicações, entre outras, não deixando de frisar os agentes da segurança e ordem publicas (as polícias), o Serviço Nacional de Proteção Civil e Bombeiros, o Serviço Nacional de Saúde

Aproveitar a maré

Dizia que as nossas casas foram transformadas em mini escritórios, nossas salas em gabinetes. Trocaram-se ficheiros, realizaram-se reuniões através de plataformas como o Skype ou o Zoom. Trata-se de um contexto que abre oportunidade a uma nova forma de trabalho, alternativa às tradicionais relações laborais, nem sempre traduzidas naquilo que é essencial, nomeadamente ganhos de eficácia e de produtividade. 

Num contexto em que teremos que mudar quase por completo as nossas vidas, o teletrabalho é um recurso que deve ser encarado como uma oportunidade para se criar novos processos firmados em objetivos claros, definidos e pactuados entre as partes, e uma alternativa para alguns setores, que irá permitir, inclusive, reduzir custos do funcionamento da maquina laboral, nomeadamente de eletricidade, água, internet, materiais, de limpeza e consumíveis, entre outros. 

 

“O país deve, sem receios, aproveitar a maré que se criou e avançar definitivamente para o teletrabalho. O discurso propagado de que precisamos de ser mais eficientes e produtivos pode encontrar resposta nesse novo modelo, claro está, com todas as condições propiciadas ao colaborador, e, simultaneamente, com mecanismos de regulação e avaliação.”

 

O mote já está dado. O próprio vice-primeiro-ministro e ministro das Finanças reconheceu, durante o segundo Estado de Emergência, que a máquina pública esteve mais eficiente e mais rápida, tendo registado “resultados extraordinários”, não obstante ter “muito menos gente a laborar”. 

Ouvir isso de um governante, mormente o responsável pela Administração Pública, é sinal animador e deve constituir um incentivo para mais organizações. Trata-se de uma dinâmica que é preciso aproveitar e dar continuidade, à semelhança do que vem acontecendo em outros países. 

Adeus às velhas praticas. 

A hora de prestar contas  

Para além disso, importa que todos aqueles que decidem sobre essas matérias saibam que para além dos ganhos de produtividade, o teletrabalho traz ganhos a nível da qualidade de vida das pessoas, ao eliminar causas propiciadoras de stress como a pressão de ter que cumprir o horário de entrada, o trânsito, os transportes públicos, entre outras. E não é preciso ser-se psicólogo para se saber que trabalhadores emocionalmente equilibrados produzem mais e melhor, e estarão mais aptos a identificarem-se com a missão e os valores das suas intuições.

Todavia, para que isso seja realidade no país, é preciso, antes de mais, que se acabe com determinadas práticas enraizadas. As lideranças devem abandonar práticas de liderança focadas na monitorização e controlo e passar a confiar mais nos seus colaboradores; é essencial que lideranças deleguem, confiem, orientem e peçam contas para que possam avaliar a produtividade de cada colaborador. 

Já não faz sentido manter colaboradores, no posto de trabalho, oito horas por dia, se a estes não forem dadas tarefas claras, com prazos de execução definidos e recursos necessários; não faz sentido manter funcionários em gabinetes, gastando recursos, quando poderia estar, em sua casa, produzindo e apresentando resultados. Sim, talvez seja isso o maior desafio que nesse momento se impõe a esta nova modalidade laboral: a prestação de contas. 

Não sendo a prestação de contas uma prática corrente no país – basta ver que a maior parte das instituições públicas não aplica o Sistema de Avaliação de Desempenho, obrigatória para efeitos de progresso e promoção na carreira –, o teletrabalho só resultaria na plenitude e com saldo positivo se, juntamente com as tarefas e os recursos essenciais, fosse implementado a accountability. 

Mas tudo isso são questões que terão que ser equacionadas no quadro de uma revisão do código laboral com a participação de empregadores e sindicatos, para que instituições não incorram na tentação de querer penalizar, sem coberto legal, colaboradores que incumprirem. Esse será talvez o maior desafio do teletrabalho, mas que é essencial que se equacione. 

A par das condições criadas é fundamental que haja, não um sistema de controlo, mas sim um que force cada colaborador a prestar contas das suas tarefas e, em caso de incumprimento, ser alvo de penalizações, sempre à luz da lei.  

Temos que ousar e inovar em tudo. Mudar não só o estilo de vida, mas igualmente de trabalho. Podemos ir começando à experiência. Já embalámos, agora é ir seguindo. E pelo caminho, as instituições, públicas e privadas, podem sempre ir analisando e avaliando os ganhos quer de produtividade quer de motivação dos seus colaboradores. Doravante, devemos fazer-nos valer da máxima “vislumbrar na crise uma oportunidade”.

PUB

PUB

PUB

To Top